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Extrema direita mundial segue fiel a Bolsonaro? Especialistas debatem

O presidente Jair Bolsonaro ativa sua agenda de contatos na extrema direita internacional para impulsionar sua campanha à reeleição. Mas será que o movimento ultraconservador brasileiro precisa de apoio externo para reeleger Bolsonaro?
Sputnik
Com desempenho eleitoral aquém do esperado, o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro (PL), busca ativar sua agenda internacional para alavancar a sua candidatura.
Recentemente, o presidente concedeu entrevista a um jornalista norte-americano associado à direita, Tucker Carlson, no Palácio da Alvorada. A conversa teve como objetivo promover o discurso bolsonarista à audiência do canal norte-americano Fox News e enfatizar a posição do brasileiro como um dos principais líderes globais associados à extrema direita.
Ainda no final de junho, foi a vez da norte-americana Valerie Huber, ex-conselheira de Trump para assuntos relacionados à família e pautas antiaborto, desembarcar em Brasília para se reunir com o presidente brasileiro.
Bolsonaro também recebeu a presidente da Hungria, Katalin Novák, com quem compartilha pautas como o repúdio ao aborto. Em coletiva de imprensa após o encontro, Bolsonaro enfatizou que os governos da Hungria e Brasil têm "muito em comum", em particular na defesa da "liberdade religiosa e de imprensa".
"E eu disse [para a presidente da Hungria, Katalin Novák] agora há pouco que tenho um rito de todo dia, antes de levantar e antes de vir para a Presidência, dobrar o joelho, rezar um Pai Nosso, e pedir para que o povo brasileiro não experimente as dores do comunismo", declarou Bolsonaro.
Declarações como essa têm o objetivo não só de atingir a base eleitoral do presidente, mas também o público associado à extrema direita internacional.
"Sabemos que existe uma rede que une as extremas direitas radicais do mundo", disse Fabio Gentile, professor de Ciências Sociais da Universidade Federal do Ceará (UFC) e pesquisador associado do Observatório da Extrema Direita, à Sputnik Brasil. "Essa relação não é só ideológica, mas também financeira."
No exterior, grupos ultraconservadores apresentam as eleições no Brasil como batalha fundamental para a sobrevivência do movimento, que sofre revezes reiterados desde a derrota de Donald Trump nas eleições norte-americanas de 2021.

Família Bolsonaro como referência

De acordo com Gentile, o presidente Jair Bolsonaro e sua família têm o objetivo de se consolidar como referências no movimento da extrema direita mundial.
"A família Bolsonaro pretende se tornar uma referência das direitas extremas na América Latina e no mundo", disse Gentile. "Eles têm grande presença nas redes sociais e muitos contatos entre os membros do movimento ultraconservador."
De fato, o deputado federal e filho do presidente, Eduardo Bolsonaro (PL), foi um dos principais articuladores do Foro de Madri, articulação de partidos de direita radical, que reúne agremiações europeias e latino-americanas para se opor ao Foro de São Paulo.
O deputado federal Eduardo Bolsonaro (à esquerda) e o líder do Vox, Santiago Abascal, durante o lançamento da Carta de Madri, em 2020
Além disso, de acordo com a jornalista Daniela Pinheiro, no início de julho o filho 0.2 do presidente concedeu entrevista de capa a uma revista associada à direita na Hungria, na qual associou o Partido dos Trabalhadores (PT) ao crime organizado e atacou o Tribunal Superior Eleitoral.
Já seu irmão, o vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro (Republicanos), voltou nesta quinta-feira (21) de viagem de cerca de 20 dias a Washington, nos EUA, de onde publicou tuítes polêmicos sobre a invasão ao Capitólio em 6 de janeiro de 2022, reportou a revista Fórum.
Durante a sua viagem, Carlos Bolsonaro recebeu apoio logístico do Ministério das Relações Exteriores, que considerou a empreitada uma "viagem de familiar do presidente", conforme reportou o jornalista Ricardo Noblat.
O vereador Carlos Bolsonaro (direita) com o seu irmão Flávio, senador, em cerimônia de confirmação da vitória do seu pai, Jair Bolsonaro, nas eleições de 2018
Gentile acredita que a vantagem da família Bolsonaro para se firmar como bastião da extrema direita internacional em relação a outras figuras proeminentes, como o já falecido Olavo de Carvalho, é a articulação bem-sucedida nas redes sociais. No entanto, o especialista considera que o clã teve "sucesso somente parcial" nessa empreitada.

Quem precisa de apoio externo?

Apesar da cruzada internacional dos Bolsonaro nas últimas semanas, não está claro se a extrema direita brasileira precisa de apoio externo para crescer. Afinal, em termos de organização e financiamento, a extrema direita brasileira é considerada uma das mais bem estruturadas do mundo.
"A extrema direita brasileira está baseada em uma rede sólida de instituições e think tanks", disse um especialista à Sputnik Brasil sob condição de anonimato. "A extrema direita brasileira não é dependente de redes internacionais, mas, pelo contrário, é estruturante."
Segundo especialista, as instituições ultraconservadoras brasileiras realizam eventos periódicos para angariar apoio financeiro de patrocinadores locais, de forma a ganhar independência operacional.
Em Brasília, bolsonaristas oram durante Marcha da Família Cristã pela Liberdade, repetindo famoso protesto da Ditadura Militar, em 11 de abril de 2021
"Estes recursos são mobilizados principalmente para a formação de quadros, marketing em comunicação e desenvolvimento de lideranças", revelou.
Institutos proeminentes da extrema direita brasileira inclusive financiam ações da agenda pró-vida e pró-família no exterior, com destaque para a Europa.
Relatórios produzidos pelo Fórum Parlamentar Europeu pelos Direitos Sexuais e Reprodutivos indicam que, entre 2009 e 2018, organizações brasileiras estiveram entre as cinco principais financiadoras de atividades com este viés no continente europeu.
O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, e a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, no Palácio do Planalto, em Brasília, durante o lançamento do Projeto em Frente Brasil, que tem o objetivo de combater a criminalidade violenta nas cidades com maiores índices de homicídios. O evento aconteceu em 29 de agosto de 2019.
Para o especialista, as organizações brasileiras não devem ser encaradas como "um ator subordinado" na rede internacional de extrema direita, mas sim como "elemento irradiador' de pautas ultraconservadoras.

Foco no Brasil

A cruzada internacional de Bolsonaro pode não surtir efeito significativo entre sua base eleitoral, uma vez que o eleitor bolsonarista tradicional não se mostra afeito a temas de política internacional.
"A diplomacia não está no foco do eleitor bolsonarista, até porque a política exterior de Bolsonaro não foi muito bem sucedida", acredita Gentile. "O presidente teve problemas nas relações com vários países, inclusive com os EUA."
O especialista acredita que o discurso de campanha de Bolsonaro não deve se focar nos resultados de sua política, mas sim no seu papel simbólico como líder de um movimento a favor de valores como "família tradicional, religião e pátria".
"Durante esses quatro anos de governo, houve um conflito entre o Jair Bolsonaro líder do movimento de extrema direita – do bolsonarismo – e o Jair Bolsonaro presidente do Brasil. E o último saiu perdendo", argumentou Gentile.
Apesar dos resultados ambíguos das políticas do governo, o líder Bolsonaro segue palatável para a extrema direita mundial, que segue trabalhando pela sua reeleição. De acordo com Gentile, partidos políticos e movimentos associados à direita na Europa seguem considerando Bolsonaro "uma figura muito expressiva".
"Mesmo com as dificuldades em torno da imagem do presidente Bolsonaro, a extrema direita internacional com certeza tem interesse na vitória de Bolsonaro nas eleições presidenciais de 2022", concluiu Gentile.
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