O papel fundamental da União Soviética na
vitória contra o nazismo na Segunda Guerra Mundial foi motivo de preocupação durante o governo de Getúlio Vargas no Brasil e gerou censura a notícias sobre o conflito. É o que aponta o livro
"O Exército Vermelho na Mira de Vargas", obra que mergulhou em arquivos históricos brasileiros para revelar documentos que mostram os esforços feitos à época para impedir a circulação de notícias sobre a URSS.
A Sputnik Brasil conversou com um dos autores da obra, João Claudio Platenik Pitillo, que explica que o livro apresenta as razões que levaram o governo Vargas a omitir o papel da União Soviética durante a Segunda Guerra Mundial. Segundo a investigação, as motivações do governo Vargas
vão para além do anticomunismo.
O autor explica que essa censura já existia desde 1935, como resposta ao Levante Comunista, mas foi ampliada no Estado Novo, em 1937. Segundo a pesquisa, a imprensa brasileira "praticamente ignorou, ou foi obrigada a ignorar" o esforço da URSS na Segunda Guerra Mundial durante os anos de 1941 e 1942, o que não teria sido atenuado nem sequer após a entrada do Brasil na guerra.
Esse quadro começaria a mudar apenas a partir de 1943, mas ainda assim com limitações para inibir possíveis exaltações à "filosofia comunista". Segundo o historiador, sua pesquisa aponta que a censura do governo Vargas buscava
impedir que um movimento comunista ganhasse força no Brasil.
"A tentativa de impedir que o brasileiro conhecesse o papel preponderante da União Soviética [na Segunda Guerra Mundial] era para impedir que esse movimento comunista se cristalizasse aqui no Brasil e que fosse visto como um exemplo", acrescenta.
Pitillo salienta que com sua pesquisa percebeu que mesmo sem a censura oficial e com mais liberdade após o período, os jornais brasileiros teriam mantido uma espécie de censura em relação ao peso da URSS na guerra.
O pesquisador também argumenta que o anticomunismo no Brasil seria um fenômeno histórico, mas que não atua sozinho. Segundo ele, essa forma política está presente em governos liberais e reverbera até hoje no país, inclusive, em posicionamentos contra a Rússia contemporânea. "Essas velhas estruturas — OTAN [Organização do Tratado do Atlântico Norte], Consenso de Washington — continuam pautando o Brasil", avalia o historiador.
A obra coletou documentos da época, vários deles inéditos, colhidos no Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro, no Arquivo Histórico do Itamaraty e no Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (Cpdoc) da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Pitillo destaca dois documentos inéditos localizados pela pesquisa emitidos pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), órgão criado por Vargas durante o Estado Novo.
Pitillo também cita outro documento do DIP proibindo que a imprensa escrita e falada no Brasil citasse qualquer coisa sobre a União Soviética e o Exército Vermelho sem citar um outro país aliado.
"Ou seja, para publicar uma foto de um soldado soviético tinha que ter um aliado do lado, para citar algum avanço soviético na linha de frente, tinha que ter uma matéria correlata falando dos ocidentais", afirma.
O livro
"O Exército Vermelho na Mira de Vargas" será publicado de forma independente pelos autores João Claudio Platenik Pitillo e Luiz Edmundo Tavares por meio do selo Guerra Patriótica. A primeira tiragem terá
1.000 exemplares e será lançada no dia 15 de outubro de forma on-line. A edição poderá ser comprada por
R$ 70,00. O autor pede que interessados acompanhem as
redes sociais do selo.