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Bloqueios: artigo 142 não se aplica a questionamentos eleitorais, diz especialista

Após a vitória eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), bolsonaristas bloquearam rodovias em diversos estados alegando fraude e pedindo golpe militar. A Sputnik Brasil ouviu um especialista em direito constitucional, que apontou que o uso do artigo 142 para questões eleitorais não faz sentido e contraria o ordenamento jurídico e a Constituição.
Sputnik
Até esta terça-feira (1º), centenas de bloqueios foram realizados em diversos pontos do país por apoiadores inconformados com a derrota do presidente brasileiro, Jair Bolsonaro (PL), nas urnas. Durante a madrugada, o Supremo Tribunal Federal (STF), acionado pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), determinou a liberação das vias. A alegação da CNT é a de que os bloqueios causam risco de desabastecimento.
Entre as reivindicações dos manifestantes responsáveis pelos bloqueios está uma antiga conhecida dos protestos bolsonaristas: o uso do artigo 142 da Constituição. Nesse caso, parte dos apoiadores de Bolsonaro quer acionar o artigo para a realização de um golpe militar contra uma suposta fraude eleitoral.
Apoiador de Jair Bolsonaro segura bandeira brasileira e imagem religiosa enquanto enfrenta a tropa de choque da Polícia Militar, que tenta dispersar manifestantes, durante bloqueio na rodovia BR-116 em Novo Hamburgo (RS), em 1º de novembro de 2022
Essa reivindicação "não faz o menor sentido". É o que diz à Sputnik Brasil o advogado Antonio Carlos de Freitas Júnior, professor de direito constitucional, doutorando em direito pela Universidade de São Paulo (USP) e especialista em direito e processo constitucional.
"Não faz o menor sentido que você possa utilizar o artigo 142 para qualquer tipo de questionamento eleitoral. Isso é um absurdo. Isso não faz sentido. Em qualquer tipo de fraude eleitoral, problema eleitoral, você com certeza poderá utilizar as ações de direito eleitoral [...]. Tem toda a sorte de ações eleitorais para você questionar o resultado X, Y ou Z", explica o professor.
O especialista dá exemplos de possíveis ações na Justiça Eleitoral para eventuais queixas e problemas desse tipo, como ação de impugnação de mandato eletivo, ação de investigação judicial eleitoral ou ação de impugnação de registro de candidatura.

"Usar o artigo 142 é completamente descabido, completamente inconstitucional, é completamente contra, não somente o Estado democrático de direito, não somente a Constituição, mas toda a lógica do nosso ordenamento jurídico", aponta.

Apoiador de Jair Bolsonaro é imobilizado pela Polícia Militar durante bloqueio na Ponte das Bandeiras, em São Paulo (SP), em protesto contra a vitória eleitoral de Lula, em 1º de outubro de 2022

Funções do artigo 142 são 'excepcionalíssimas'

Freitas Júnior detalha a função do artigo e como ele institui e estabelece as funções das Forças Armadas no Brasil. O advogado salienta que o uso do artigo só ocorre em situações "excepcionalíssimas".

"O artigo 142 da Constituição é o artigo que institui as Forças Armadas — o Exército, a Aeronáutica e a Marinha — e coloca essas Forças Armadas para três grandes pilares de atuação: defesa da pátria, ou seja, defender o Brasil contra a invasão estrangeira; defesa dos Poderes constitucionais; e um terceiro caso, que é a defesa da lei e da ordem, por exemplo, uma guerra civil, alguma balbúrdia, alguma situação de criminalidade da qual a polícia militar e o sistema policialesco estadual não deem conta", explica o especialista.

Jair Bolsonaro concede entrevista antes do debate presidencial na Band. São Paulo, 16 de outubro de 2022
Freitas Júnior salienta que no caso da defesa dos Poderes, o artigo aponta que as Forças Armadas podem ser empregadas não contra um Poder, mas para que "os três Poderes exerçam plenamente suas prerrogativas". Já com relação ao uso das forças para a defesa da lei e da ordem, o especialista ressalta que esse é um caso "obviamente excepcional".
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