"O que se observa é como as regiões estão empoderadas para enfrentar os desafios [...] o que o mundo está pensando hoje são coisas muito diferentes do livre comércio, quero ser muito franco [...]", disse Fernández ao assumir a palavra durante a cúpula que está acontecendo em Montevidéu.
Cinco dias depois de a Presidência uruguaia ter apresentado o pedido de adesão ao Acordo Transpacífico, o presidente argentino reconheceu sua preocupação e considerou que "o mundo começou a se preocupar com a ideia da globalização, que não funciona mais como antes."
Nesse sentido, "o que o mundo está pensando hoje é ver como cada economia se defende contra os estragos da pandemia [de COVID-19] e da guerra", disse ele diante de seus pares.
O chefe de Estado argentino citou o Tratado de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA), a União Europeia (UE) e a União Africana (UA) como exemplos de blocos regionais que caminham na mesma direção.
Em vez de buscar o livre comércio entre os países, "o Mercosul precisa fortalecer sua unidade para ver como podemos enfrentar esses dilemas que enfrentamos hoje", disse Fernández.
No início de sua explanação, o presidente manifestou a intenção de falar com franqueza, por isso deixou de lado o discurso escrito que tinha e alertou que com a pandemia de COVID-19 "o que ficou exposto foi a fragilidade do sistema econômico mundial".
O presidente argentino, que vai receber do Uruguai a presidência rotativa e pro tempore do Mercosul —que é exercida durante o período de seis meses por um chefe de Estado de um dos países-membros — reconheceu as assimetrias que afetam a organização e expressou sua disposição para resolver essas desigualdades.
"É hora de sentar e conversar sobre essas simetrias, ver como as resolvemos", disse Fernández.
Fernández também propôs começar a trabalhar em um segundo Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul (Focem) para ajudar o bloco a trabalhar essas assimetrias.
O Focem "é um fundo destinado a financiar projetos de promoção da convergência estrutural; desenvolver a competitividade; promover a coesão social, especificamente nas menores economias e nas regiões menos desenvolvidas e apoiar o funcionamento da estrutura institucional e o reforço do processo de integração", explica o Mercosul em sua página na Internet.
O presidente argentino disse a seu colega uruguaio, Luis Lacalle Pou, que gostou de ouvi-lo dizer que sua intenção "não é quebrar nada [com a intenção de flexibilizar o bloco], mas ver como melhoramos a situação".
A Presidência do Uruguai anunciou que apresentou o pedido de adesão ao Acordo Abrangente e Progressivo para Parceria Transpacífica (TPP), assinado em 2018 e integrado por Austrália, Canadá, Japão, Malásia, México, Nova Zelândia, Peru, Cingapura, Vietnã, Brunei e Chile.
Tal decisão preocupou outros membros do Mercosul, como Argentina, Paraguai e Brasil, preocupação que foi exposta durante a cúpula.
Críticas à UE
Nesse contexto, o presidente observou que uma das principais assimetrias que o Mercosul enfrenta são aquelas contidas no acordo de livre comércio negociado com a União Europeia (UE) em 2018.
Dentro da UE existem "países protecionistas que não querem que nossos grãos, nossa carne e nossa comida entrem", enfatizou Fernández.
Seus países decidiram subsidiar "a produção pecuária e agrícola daquela região, e é aí que perdemos", mas, ao mesmo tempo, querem inserir sua indústria automotiva na região, observou o chefe de Estado.
Fernández sugeriu, nesse sentido, que o Mercosul peça à UE que "pare de mentir", porque esse acordo "não levou em conta as assimetrias".
"Ninguém quer mais do que eu um acordo com a UE, mas um acordo decente para o Mercosul", destacou.
Durante seu discurso, o presidente também abriu a possibilidade de que o Mercosul, formado pela Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, "pense em um Banco Central comum".