Os sistemas de guerra eletrônica russos poderiam silenciar o Starlink ucraniano?

Os militares ucranianos teriam enfrentado problemas com o muito elogiado sistema de comunicação Starlink. O que pode estar por trás do problema?
Sputnik
Surgiram relatos sugerindo que o Starlink parou de operar em algumas partes da zona de conflito da Ucrânia. De acordo com a imprensa ocidental, o proprietário da SpaceX, Elon Musk, restringiu repetidamente seu acesso à Internet Starlink em alguns casos para os militares ucranianos, eventualmente saindo pela culatra a estratégia do campo de batalha de Kiev. No entanto, o bilionário não comentou as reportagens até o momento.
Há ainda outra explicação possível para as dificuldades que assombram os militares ucranianos.

"Com base na análise da conversa [interceptada] por militantes ucranianos na linha de contato, eles tiveram dificuldades em usar a Internet via satélites Starlink [na direção tática de Lugansk]", disse o tenente-coronel reformado das Forças Armadas da República Popular de Lugansk (RPL) Andrei Marochko à Sputnik no dia 31 de julho. "Muitos atribuem isso à Rússia usando equipamentos de guerra eletrônica para bloquear as comunicações fornecidas pela SpaceX."

O Ministério da Defesa da Rússia ainda não fez comentários sobre o assunto.
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O que é o sistema Starlink?

A Starlink é operada pela empresa aeroespacial norte-americana SpaceX, de propriedade de Elon Musk. Enquanto a maioria dos serviços de Internet via satélite é fornecida por satélites únicos que orbitam o planeta a uma altitude de 35.786 quilômetros, o Starlink é na verdade uma constelação de milhares de espaçonaves que orbitam o planeta muito mais perto de sua superfície — a cerca de 550 quilômetros, visando "cobrir o globo inteiro", de acordo com o fabricante.
A SpaceX fornece serviços de Internet via satélite para a Ucrânia desde o início da operação militar especial da Rússia. Em 11 de maio de 2022, Elon Musk afirmou no Twitter que "o Starlink resistiu às tentativas russas de interferência e invasão da guerra cibernética até agora, mas eles estão intensificando seus esforços".
No dia 18 de abril de 2023, o The Washington Post informou que havia obtido um documento de inteligência secreto — parte dos chamados vazamentos do Pentágono — dizendo que Moscou havia tentado por meses seus "sistemas de guerra eletrônica Tobol" para interromper as transmissões do Starlink na Ucrânia. O documento em questão, datado de março, não trazia maiores detalhes sobre os supostos exames.
No início do mês de julho, uma fonte familiarizada com a situação disse à Sputnik que a Rússia havia desenvolvido um novo sistema de guerra eletrônica capaz de interromper as comunicações de espaçonaves em órbita geoestacionária. A fonte especificou que "esta [órbita geoestacionária] está a aproximadamente 36.000 quilômetros acima do nível do mar". Eles não forneceram detalhes sobre o novo sistema de guerra eletrônica russo, apenas dizendo que "o poder de seus emissores a curto alcance permite não apenas suprimir, mas também desativar permanentemente a eletrônica inimiga".
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A Rússia é capaz de interferir no Starlink?

O Exército russo está equipado com uma variedade de sistemas de guerra eletrônica sofisticados, além do Tobol. Entre eles estão Krasukha, Moskva, Infauna, Leer e Triada. Alguns deles são usados na operação militar especial da Rússia na Ucrânia.

"Deve-se ter em mente que qualquer comunicação por satélite só pode ser bloqueada em uma pequena área local", disse o analista militar e fundador do portal russo Military, Dmitry Kornev, à Sputnik. "Um complexo suficientemente poderoso pode cobrir uma área de talvez centenas de quilômetros quadrados."

Ao mesmo tempo, não se pode bloquear completamente as comunicações na área escolhida. Os sistemas só poderiam ser usados para interferir nas comunicações de um adversário, explicou o especialista militar. Existem vários tipos de complexos de guerra eletrônica da Rússia capazes de realizar essas tarefas, mas não há informações oficiais a esse respeito até agora, observou Kornev.
"Ninguém lhe dirá especificamente [sobre o bloqueio do Starlink], porque este equipamento de guerra eletrônica é ultrassecreto", disse o analista do departamento de análise militar e política e tenente-coronel da reserva Pavel Kalmykov, à Sputnik. "Em geral, tudo relacionado a eles é sigiloso. Ninguém conhece as características exatas desses sistemas."
Ainda assim, Kalmykov deu a entender que, a julgar por algumas informações que obteve anteriormente, a suposição de que Starlink foi suprimido em Donbass pode ser real.
O analista militar e coronel reformado do Exército russo, Viktor Litovkin, assumiu que a Rússia poderia "desligar" apenas uma parte do sistema de rede de satélites da Starlink.
"Não acho que tenhamos sistemas de guerra eletrônica tão poderosos que possam desativar todos os 4.000 satélites de Elon Musk", disse Litovkin à Sputnik. "Nós realmente precisamos fazer isso? Portanto, tudo depende da situação específica e a decisão é tomada pelo comando [russo]."
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E se a Rússia desligar o Starlink?

A possível interrupção do trabalho da Starlink levaria a sérios problemas para as Forças Armadas ucranianas, de acordo com Kornev.
"De acordo com analistas ocidentais, as operações militares modernas dependem fortemente de comunicações. Ou seja, se uma pessoa, sentada em algum lugar em um tanque, ou em uma trincheira, tem informações sobre o que está acontecendo ao seu redor [no campo de batalha] [...] já completou 50% de sua missão de combate", explicou o analista.
"Ele não precisa mais olhar se há um tanque atrás desta colina ou se alguém o ameaça e a quem ele pode atacar. Então, todo o conceito ocidental é baseado na presunção de que todos têm terminais de satélite, terminais de informações em todos os veículos de combate, todos os tanques e todas as trincheiras. E a Starlink oferece essa oportunidade", continuou Kornev.
Um foguete SpaceX Falcon 9 com o 26º lote de aproximadamente 60 satélites para a rede de banda larga Starlink da SpaceX decola da plataforma 39A no Kennedy Space Center em Cabo Canaveral, Flórida, 4 de maio de 2021
Além disso, os módulos Starlink dão aos militares ucranianos a oportunidade de transformar os veículos não tripulados mais primitivos em "drones inteligentes", de acordo com o especialista. Assim, foi assegurado o controle de drones marítimos e aéreos que poderiam atacar objetos russos — inclusive civis. No entanto, há um ano, Elon Musk se opôs à decisão de Kiev de usar o Starlink para ataques ao território russo, exigindo que o equipamento fosse usado apenas para fins "defensivos", acrescentou Kornev.
Se a Rússia obtiver uma oportunidade de interferir especificamente no Starlink, isso significaria nada menos que uma "catástrofe de informações" para as Forças Armadas ucranianas, de acordo com o especialista. As unidades do Exército ucraniano não seriam capazes de se comunicar umas com as outras, enquanto a capacidade de ataque de drones também seria substancialmente prejudicada, observou ele. Como resultado, a Ucrânia teria que mudar fundamentalmente de tática e equipamento e perderia tempo e agilidade preciosos, de acordo com Kornev.
Atualmente, o pessoal militar ucraniano depende fortemente do Starlink, e a Rússia deve aproveitar todas as oportunidades para jogar areia nas engrenagens de seu sistema de comunicação, observou o especialista, enfatizando que isso aumentaria significativamente as capacidades da Rússia e reduziria as capacidades das Forças Armadas da Ucrânia.
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