O embaixador francês em Niamey, Sylvain Itté, bem como toda a equipe da embaixada, retornará à França nas próximas semanas e meses, anunciou Emmanuel Macron no domingo (24). O contingente militar francês deixará o Níger até o final do ano.
Após a tomada do poder no Níger em 26 de julho, o governo de fato do país exigiu que os diplomatas e militares franceses deixassem a República do Níger. No entanto, o Palácio do Eliseu resistiu a essas exigências, dizendo que só retiraria as tropas se o presidente nigerino deposto Mohamed Bazoum exigisse isso. Em 24 de setembro, porém, Macron cedeu.
"Liderados por forças armadas, os eventos que substituíram os governos em muitos países da região do Sahel, embora diferindo em sua lógica interna, compartilham um desejo comum e amplamente apoiado de acabar com o 'mandato' francês de fato", disse o diretor da Fundação CIPI, em Bruxelas, e analista estratégico, Paolo Raffone, à Sputnik.
Como a França manteve o controle do Sahel
Embora as nações do Sahel tenham sido libertadas da colonização no século XX, muitas delas permaneceram sob o controle de seus antigos colonizadores durante e após a Guerra Fria.
"Para impedir a entrada de tropas soviéticas e chinesas, foi criada a 'Françáfrica', com o Níger e o Chade como pedras-chave, e a França recebeu um mandato para manter o território como parte do bloco ocidental em troca de um governo neocolonial contínuo, democratização e desenvolvimento falsos e exploração constante de recursos", explicou Raffone.
Como a França perdeu sua influência no Sahel
"A eleição fraudulenta de Bazoum [2021], apesar da patente oficial de um presidente democrático, foi a última tentativa de manter o status quo. Em 26 de julho de 2023, ele entrou em colapso irreversível sem a intervenção de potências estrangeiras, foi um processo interno apoiado por mais de 70% da população", acrescentou Raffone.
Após o golpe militar, a França tentou manter o controle na região por bem ou por mal. A Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental, pró-ocidental e liderada pela Nigéria, chegou a declarar que recorreria a uma opção militar para devolver Bazoum ao poder. Em resposta, Mali, Burkina Faso e Níger criaram um pacto político-militar, a Aliança dos Estados do Sahel, declarando que protegeriam Niamey de intervenções.
"A França sozinha não tem a capacidade militar para mudar a maré no Níger ou na região do Sahel", explicou Raffone.
"Confrontado essa realidade e considerando o crescente descontentamento no Exército francês, o presidente Macron finalmente decidiu retirar diplomatas e militares do Níger. […] O resultado é que a França está fora do Níger e, provavelmente, a UE [União Europeia] logo sairá da região", afirmou o analista.
É uma ironia histórica que, apesar dos esforços do Ocidente, a Rússia e a China estejam expandindo sua presença na África, enquanto os europeus perdem suas posições lá.
"A perda da 'Françáfrica' é um sério [golpe] ao prestígio da França. Sem as dependências neocoloniais na África, a França não é mais uma 'potência', mas uma das pequenas nações da Europa que precisa lidar com os muitos problemas de sua unidade interna e das relações com seus vizinhos europeus. Esse é o fim do 'excepcionalismo' francês", acredita Raffone.
O caso do Níger poderia causar um efeito dominó?
Se a Nigéria seguir o exemplo do Níger, podemos esperar que toda a África Ocidental mude o curso político para longe do Ocidente, de acordo com o comunicado de Raffone.
Enquanto isso, os países africanos estão considerando o BRICS como uma alternativa em termos de investimentos, apoio político e econômico e novas oportunidades de negócios. O BRICS 11 oferece novos modelos de cooperação, mecanismos financeiros baseados em moedas nacionais e programas especiais de segurança alimentar para a África, sendo essas apenas algumas das vantagens.