Eleições argentinas estão na berlinda entre desafio de herdar votos e ascensão de candidato radical
18:33, 23 de outubro 2023
A Argentina se encontra em um momento crucial de sua história política, enquanto os eleitores se preparam para o segundo turno das eleições presidenciais. Com um pleito entre um candidato de situação, representado por Sergio Massa, e o da extrema-direita e oposição, Javier Milei, o debate sobre o futuro do país vizinho ao Brasil está em alta.
SputnikDurante entrevista ao Mundioka, podcast da Sputnik Brasil, Flavia Loss de Araujo, professora de relações internacionais da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), compartilhou algumas perspectivas acerca das complexidades envolvidas.
O centro das atenções é a transferência de votos da candidata Patricia Bullrich, preferida pela direita tradicional argentina e que não avançou para o segundo turno.
23 de outubro 2023, 10:21
Flavia Loss observa que essa transferência não é automática, mesmo que haja uma falta de entusiasmo com relação a Milei, que adota uma postura ultraliberal.
Ela reforça que há mais possibilidade de os argentinos que votaram em Patricia Bullrich votarem em Massa.
''Para os argentinos, é muito mais arriscado perder algo que eles já conhecem, que são os direitos, a aposentadoria, tudo aquilo que o Estado fornece, do que apostar numa candidatura como a do Milei, que o mote é que se exploda tudo. Ou seja, vamos mudar tudo e vamos diminuir ou até eliminar grande parte do Estado. Isso é muito novo, é uma proposta que talvez os eleitores e eleitoras da Argentina não estejam dispostos a pagar para ver'', frisa a especialista.
A professora destaca que o
eleitorado de direita tradicional da Argentina está em uma encruzilhada.
A candidata eliminada, de acordo com o macrismo, representava uma direita mais tradicional e conservadora, enquanto Milei propõe uma mudança radical, que poderia não ser bem recebida por esse eleitorado.
"Para eles [argentinos], talvez o Milei seja muito radical. A gente não sabe para onde esse eleitorado pode se inclinar. Muita gente está apostando que vai para o Milei, por ele ser de uma ultradireita ou extrema-direita, mas eu não apostaria nisso não, porque os argentinos têm uma relação diferente com o mundo da política, das políticas públicas, dos direitos que eles já conquistaram, e isso independentemente de ser de esquerda ou direita", pontua a professora.
23 de outubro 2023, 20:33
A incerteza também paira sobre o eleitorado jovem, que é visto como um grande apoio a Milei. Não se sabe como esse grupo crucial votará no segundo turno. Isso torna difícil prever se o eleitorado de Patricia se inclinará para as propostas radicais de Milei.
Além disso, o cenário político argentino experimenta uma novidade com a ascensão da ultradireita, uma mudança significativa que pode influenciar a direção da nação.
"Massa apostou muito numa campanha que eles estão dizendo que é do medo, ou seja, o Milei é uma ameaça, uma interrogação. Não sabemos o que vem dessas propostas e nem se ele será capaz de colocá-las em prática uma vez no governo", conclui.
A direita argentina e o pragmatismo
Filipe Bueno, jornalista e analista internacional, lança luz sobre a dinâmica da direita argentina e a ascensão de Milei. Ele destaca a evolução da direita argentina, que parece estar se voltando para o pragmatismo político, e observa que essa nova direita não hesitará em articular-se com o governo caso a situação vença. Isso reflete uma mudança em relação à direita tradicional, representada por Patricia Bullrich, que obteve apenas 23% dos votos.
Quanto à extrema-direita representada por Milei, Filipe Bueno ressalta que é difícil determinar quantos votos dos 29% conquistados são da extrema-direita e quantos são de uma direita disposta a "quebrar tudo para reconstruir".
A diversidade do apoio a Milei torna o cenário ainda mais complexo, envolvendo até eleitores de esquerda que enxergam nele uma figura "caricata", como ocorreu em eleições presidenciais passadas no Brasil e em outros países.
22 de outubro 2023, 14:00
A comparação entre Milei e o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro também é abordada. Filipe Bueno observa que Bolsonaro era um político que, embora tivesse décadas de mandatos, era mais um parlamentar que nada fazia.
Além disso, Bolsonaro era um militar de formação, sem conhecimento político, econômico ou em outras áreas. Milei, por outro lado, é uma figura excêntrica e mais jovem na política, mas possui uma formação sólida.
''O Milei é, da mesma forma, excêntrico, e muito mais novo no cenário político, mas ele tem uma formação sólida'', pontua o analista.
Bueno pondera que é preciso observar os que votaram nos outros candidatos, e não apenas nos dois primeiros.
"Então a Patricia Bullrich vai dar uma declaração. Qual o peso dessa declaração? Qual o peso dessa declaração para parte do eleitorado dela, que a gente deve colocar na conta do setor produtivo, do setor exportador, do setor empresarial da Argentina, dos pequenos comerciantes, daqueles que estão na informalidade, daqueles mais pobres", observa.