Chamada de "Interpol da América" pelo ministro da Justiça, Flávio Dino, a sua atuação será semelhante às de suas contrapartes internacional e europeia, a Europol, ou seja, não substituirá a soberania de cada país-membro, mas "permitirá uma ação coordenada entre os países, permitindo que os organismos investigativos possam atuar em conjunto", disse Marcio Christino, autor do livro "Laços de Sangue: a História Secreta do PCC", em declarações à Sputnik Brasil.
A Ameripol, no entanto, não inaugura a existência da cooperação entre órgãos policiais entre os países. Nos últimos anos, foram vistas operações conjuntas entre a polícia brasileira e outras autoridades policiais de países vizinhos,
em especial no Paraguai. No entanto, essas ações muitas vezes
precisaram superar entraves burocráticos e ficaram
dependentes de vontades políticas internas.
Dessa forma, o Tratado de Brasília — assinado por Argentina, Bolívia, Brasil, Haiti, República Dominicana, Colômbia, Honduras, Costa Rica, Panamá, Paraguai, Uruguai, Chile e Equador — inaugura um momento de maiores "relações interinstitucionais" entre os signatários, afirma Aiala Colares, professor do Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGG) da Universidade Estadual do Pará (UEPA).
A assinatura do tratado vem em um momento importante, em que a expansão de
facções criminosas brasileiras, como o
Primeiro Comando da Capital (PCC), de São Paulo, e o
Comando Vermelho (CV), do Rio de Janeiro, está em seu auge, não só para outros estados como para outros países vizinhos. "O PCC é o maior exemplo disso,
atuando na Venezuela, no Paraguai e
com braços na fronteira, sobretudo na Região Amazônica", afirma Colares.
A presença desses grupos na Região Amazônica, em especial na tríplice fronteira entre Peru, Colômbia e Brasil, não é à toa. O local é a maior rota de transporte de cocaína para dentro do país, e tanto o CV quanto o PCC fazem parcerias com facções regionais para atuar nesse mercado.
Segundo dados de 2017 do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC, na sigla em inglês),
70% da cocaína do mundo é produzida na Colômbia,
enquanto 20% é feita no Peru e apenas 10% vem da Bolívia.
Nesse contexto, explica Aiala, o Brasil não é um país produtor de droga, assim como seus vizinhos andinos, mas possui uma dupla funcionalidade dentro da rota internacional do tráfico, atuando tanto como "um grande corredor em direção à Europa e África" quanto sendo "o segundo principal mercado consumidor de cocaína [atrás apenas dos Estados Unidos] e o principal de skunk".
"É mercado e área de trânsito. Por isso que esses grupos faccionais do Brasil vêm disputando o controle dessas rotas importantes", destacou.
No entanto, ainda de acordo com Aiala, é importante que os países signatários se lembrem do que foi o Plano Colômbia — acordo bilateral firmado em 1999 entre os EUA e a Colômbia para o combate ao narcotráfico no país — e evitem repeti-lo. "Deve-se observar até que ponto esse modelo não reproduz uma lógica de violência que vai ser institucionalizada pelo Estado."