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Brasil ganha com investimento em infraestrutura na América do Sul? Conheça o Rotas para a Integração

Com investimento de cerca de R$ 50 bilhões, o projeto de integração entre os países da América do Sul pretende dinamizar o escoamento de produtos, ao passo que aumenta a produtividade e diminui o gargalo do tempo logístico.
Sputnik
Durante a Cúpula do Mercosul, realizada na última semana, o governo brasileiro apresentou a iniciativa Rotas para a Integração, com 124 projetos que ampliam a conexão entre os países do continente e envolvem obras de hidrovias, rodovias, infovias, ferrovias, portos, aeroportos e linhas de transmissão de energia elétrica.

Novo Programa de Aceleração do Crescimento

De acordo com Simone Tebet, ministra do Planejamento, a maior parte das obras estão incluídas no Novo Programa de Aceleração e Crescimento (PAC). Entretanto, dez projetos, divididos em cinco eixos, foram apresentados como prioritários:
Ilha das Guianas: vai interligar o Norte do Brasil com a Guiana, a Guiana Francesa, o Suriname e a Venezuela;
Manta-Manaus: vai promover e facilitar conexões entre a região Norte do Brasil com a Colômbia, o Equador e o Peru;
Quadrante Rondon: vai interligar os estados do Acre, do Mato Grosso e de Rondônia com a Bolívia e o Peru;
Capricórnio: a proposta inclui dinamizar a logística entre os estados do Mato Grosso do Sul, do Paraná e de Santa Catarina com a Argentina, o Chile e o Paraguai;
Porto Alegre-Coquimbo: vai interligar o Rio Grande do Sul à Argentina, ao Chile e ao Uruguai.
As novas Rotas para a Integração estão sendo tocadas a partir do Consenso de Brasília, assinado por 12 presidentes dos países da América do Sul em maio deste ano.
Segundo Robson Cardoch Valdez, pesquisador do Núcleo de Estudos Latino-Americanos (NEL) da Universidade de Brasília (UnB), o programa remonta a Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA), criada pelo governo de Fernando Henrique Cardoso e pelo Conselho de Infraestrutura e Planejamento (Cosiplan), apresentada no segundo mandato de Lula.
Apesar dos homônimos que antecederam o projeto Rotas para a Integração não terem avançado — no sentido de tirar os estudos desenvolvidos do papel —, Valdez acredita que, com recursos carreados para as demandas específicas e apoio político para que essa agenda perdure enquanto política de Estado, o plano pode ser concluído.

"Para que todos esses projetos possam ser concretizados, vai precisar de um comprometimento do governo federal, do empresariado, no sentido de apoiar a alocação de recursos para esses projetos no orçamento da União", comenta.

Os recursos que serão destinados ao programa já estão definidos sob a seguinte divisão, de acordo com o governo federal: R$ 17 bilhões do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), R$ 15 bilhões do Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF), R$ 15 bilhões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômicos e Social (BNDES) e R$ 3 bilhões do Fundo Financeiro para Desenvolvimento da Bacia do Prata (Fonplata). Os recursos do BNDES, esclareceu Tebet, contemplarão apenas obras de prefeituras e governos estaduais dentro do Brasil.
Valdez ressalta que uma característica comum entre os bancos de fomento da região é estarem conectados com a agenda do desenvolvimento sustentável, o que pressupõe um impacto positivo na área socioambiental.

Investimento em integração da América do Sul

Em relação aos benefícios que o Rotas pode gerar ao continente, Tebet contou, durante a Cúpula do Mercosul, a respeito de um processo de transação para ilustrar as vantagens do programa. Em 2022, Rondônia comprou US$ 2,7 milhões (R$ 13,5 milhões) de azeitonas do Peru.
Por conta da ausência de um canal que interliga as partes, a mercadoria teve de passar pelo canal do Panamá, chegar ao Brasil pelo Porto de Santos e percorrer quase todo o país pelas estradas, multiplicando por cinco a distância de 2 mil quilômetros entre o estado e as áreas produtoras no país vizinho.
Além dos ganhos logísticos regionais, Valdez aponta que as Rotas para a Integração podem incrementar a balança comercial do Brasil com o bloco asiático.
"O crescimento das exportações será muito benéfico para que a vulnerabilidade externa da balança de pagamentos do Brasil seja cada vez mais reduzida, haja vista que teremos a entrada de um fluxo maior de dólares nas reservas do Brasil."
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O desenvolvimento das regiões impactadas pelas obras de infraestrutura também são pontos que, para o pesquisador, merecem ser destacados. "A partir da hidrovia do Mercosul com a dragagem da lagoa Mirim, teremos ali a primeira hidrovia que vai ajudar a escoar ou receber a produção do Brasil para o Uruguai, do Uruguai para o Brasil, dinamizando uma região muito sensível do ponto de vista econômico, que é essa região do Uruguai."
Na medida em que a região passa a ter maior dinamismo econômico e logístico, Valdez aponta que esses locais passam a ter potencial para se tornar um polo cada vez mais atrativo de investimentos estrangeiros. "Isso fará com que esses investimentos venham para a região, com que as empresas desses países possam investir aqui e auferir seus lucros e remeter o lucro desses investimentos de volta para os seus países de origem, ou seja, os países desenvolvidos também poderão se beneficiar dessa infraestrutura."

"Os produtos brasileiros manufaturados são produtos com maior valor agregado na América do Sul e na América Latina em geral, e a infraestrutura logística é uma agenda positiva tanto para o pessoal do setor econômico-industrial, quanto para o setor produtivo do agronegócio brasileiro", conclui o pesquisador.

Quais os principais obstáculos de integração na América do Sul?

Na contramão dos ganhos e benefícios que a América do Sul pode ter com os investimentos em infraestrutura para melhorar a logística no continente, Valdez cita a ortodoxia de governos neoliberais como o grande desafio para atingir os resultados esperados. "São governos com maior restrição ao investimento público", destaca.
Segundo o pesquisador, nesse cenário o investimento do setor privado acaba não sendo imediato, uma vez que o empresariado tem preferência "em alocar esses recursos em investimentos de curtíssimo prazo, como bolsa de valores".
É aí que o investimento público se torna ainda mais importante, porque "possui o capital paciente, aquele capital destinado a investir e a esperar que esse investimento tenha maturação adequada para que possa render os frutos", disse, ressaltando ser importante que esses fatores sejam explicados à sociedade.
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