Panorama internacional

Analista afirma que 'Schengen militar' da OTAN evoca memórias anti-Rússia da Alemanha nazista

O Ocidente defende a ideia de um movimento militar livre de procedimentos burocráticos e procura concluir um acordo sobre a criação de corredores militares em toda a Europa até julho, segundo o The Times. O que realmente está por trás da ideia?
Sputnik
O movimento de tropas e carga militar dentro da Europa é alegadamente complicado por numerosas restrições que impedem as forças da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) de se movimentarem rapidamente através do Velho Continente.
A liderança da OTAN está preocupada com as regras que limitam a troca e a movimentação de equipamento militar não só entre países europeus, mas também entre regiões — no caso da Alemanha —, alegando que a burocracia poderia se tornar um sério obstáculo em um eventual conflito com a Rússia. A aliança gostaria de ver "um espaço Schengen militar" na Europa, semelhante ao espaço Schengen político, que garante um movimento contínuo em toda a Europa.
"Não estou surpreso que a OTAN esteja criando um 'Schengen'", disse à Sputnik o professor Stevan Gajic, pesquisador associado do Instituto de Estudos Europeus de Belgrado.

"Gostaria de sublinhar que a última vez que tivemos um Schengen europeu desse tipo foi na Alemanha de Hitler, e esta ocupou a Europa durante a Segunda Guerra Mundial. E podemos falar de ocupação, uma vez que países como a Finlândia e a Suécia foram arrastados para a OTAN sem o consentimento de seu povo. Isso vale especialmente para os finlandeses, porque eles têm uma longa tradição de neutralidade. Os suecos também têm, mas, ao contrário dos suecos, o sentimento antirrusso na Finlândia praticamente não existia. E essa história de que eles foram 'vendidos' sem um referendo, sem que o seu povo tivesse realmente uma palavra democrática sobre o assunto, foi a sua adesão à OTAN", afirmou o pesquisador.

A questão de um espaço Schengen militar foi levantada pela OTAN em 2017, após a identificação de três tipos diferentes de barreiras na Europa: físicas, legais e regulamentares/administrativas.
Por barreiras físicas, compreende-se a infraestrutura de transportes existente na União Europeia. As barreiras legais se referem aos direitos soberanos dos Estados europeus de recusar o acesso aos seus respectivos territórios por parte das tropas da OTAN. Já as barreiras regulatórias foram definidas como o conjunto de regras que dificultam indiretamente o movimento da aliança, ou seja, diferentes limites de velocidade nacionais, controles policiais, a obrigação de declarar o que é embarcado, a proibição de usar estradas específicas, etc.
Contudo a ideia de uma zona de livre circulação não obteve muito apoio àquela altura. Agora a operação militar especial russa na Ucrânia foi usada pelo establishment da OTAN para reavivar a ideia, alimentando infundadamente uma alegada "ameaça da Rússia".
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No final de novembro, a OTAN alertou os seus membros de que a burocracia existente seria um problema no caso de um hipotético conflito com a Rússia, citando a operação militar especial em curso. "O tempo está acabando", afirmou o tenente-general Alexander Sollfrank, chefe do comando de apoio logístico da OTAN, à Reuters. "O que não fizermos em tempos de paz não estará pronto em caso de crise de guerra."
Segundo o The Times, a liderança da aliança está atualmente negociando a criação de corredores militares em toda a Europa, no âmbito do sistema "Schengen militar". Os resultados das conversas poderão ser anunciados antes da cúpula da OTAN em julho, em Washington.
"Penso que o ano em que estamos, 2024, é muito arriscado porque a OTAN sente uma ameaça existencial como organização burocrática", disse Gajic. "Se Trump vencer as eleições, poderá tirar os Estados Unidos da OTAN."
Durante seu mandato presidencial, Trump questionou repetidamente a lógica por trás da manutenção da aliança da era da Guerra Fria. Segundo Gajic, os líderes da OTAN fariam de tudo, incluindo todo tipo de provocação contra a Rússia, para impedir que Trump saísse da aliança em caso de vitória. O ex-presidente ultrapassou seus pares, emergindo como o republicano favorito na corrida eleitoral de 2024.
Entretanto, Moscou alertou repetidamente a OTAN contra o uso de retórica provocativa para justificar a criação de um espaço Schengen militar.

"A aliança sempre considerou o nosso país um suposto adversário imaginário. Agora considera abertamente o nosso país um adversário óbvio. Essa [declaração] nada mais é do que [uma tentativa de] atiçar tensões na Europa que teriam consequências", disse o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, a repórteres no dia 24 de novembro. Segundo ele, Moscou responderia adequadamente se uma proposta de um espaço Schengen militar se tornasse realidade.

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Gajic observou que não é a primeira vez que a Rússia é demonizada para justificar o militarismo do Velho Continente, citando a liderança nazista alemã e sua ideia racista de "hordas asiáticas" estarem alegadamente ameaçando a Europa. O termo era usado pelos propagandistas do Terceiro Reich para se referir à União Soviética, embora se autodenominasse defensora da Europa.

"Vemos a repetição do discurso sobre como 'a civilização europeia está ameaçada pelas hordas asiáticas'. Eles não usam a palavra 'asiática' hoje, mas estão falando sobre o 'Eurodefender' ou a 'resposta nórdica'. Quero dizer, toda essa formulação nórdica tem a ver com o neopaganismo que está intimamente ligado ao neonazismo da frente ucraniana. Basicamente, há muitas analogias que estão sendo feitas com a Alemanha de Hitler pelos países ocidentais, pela OTAN, especificamente", disse o acadêmico.

"Na prática, geopoliticamente falando, o que a OTAN está criando é uma repetição de uma zona onde a força militar pode circular livremente. E, claro, isso é muito perigoso devido às analogias históricas, que são bastante nítidas. Veremos o que isso trará. Mas penso que essa medida é uma escalada", sublinhou Gajic.
A OTAN iniciou neste mês os seus exercícios Steadfast Defender 2024 — os maiores em décadas, envolvendo aproximadamente 90 mil soldados de 31 membros e da Suécia. Os exercícios, que visam mostrar a capacidade de "mobilizar rapidamente forças da América do Norte e de outras partes da aliança para reforçar a defesa da Europa", continuarão até 31 de maio, e participarão desde o Extremo Norte até as Europas Central e Oriental. De acordo com Gajic, o momento das negociações sobre o espaço Schengen militar em meio ao desenrolar dos exercícios não é de forma alguma uma coincidência.
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