"Tende a reforçar um processo discriminatório contra esses cidadãos que podem ingressar no país, seja para estudar, como turista ou, inclusive, trabalhar. Temos muitos brasileiros que vão para a Argentina para cursar, por exemplo, medicina, considerando que lá o acesso à universidade é universal. Essa também é uma política que incidiu primeiro sobre brasileiros e no longo prazo pode significar uma securitização dessa agenda migratória", pontua.
"Essa política de selecionar quem pode ou quem não pode entrar no país, sob o argumento de que só vamos permitir migrantes que de fato contribuam para o desenvolvimento argentino. Só que isso acontece de forma discriminatória, não existem critérios. Vimos também lá nos Estados Unidos, [durante o governo] Trump, um discurso muito forte contra os migrantes, principalmente aqueles que vinham do México ou da América Central", compara.
Qual a relação de Brasil e Argentina?
"E tratando de relações bilaterais, tem o acordo firmado entre Brasil e Argentina, que facilita a emissão de autorização de residência para a Argentina no território brasileiro e vice-versa. Então, obviamente, pode gerar um isolamento da Argentina no nível regional. O país ainda é um dos principais destinos de migração intrarregional, ou seja, de países sul-americanos", conclui.
País pode adotar a mesma postura com estrangeiros argentinos?
"Não me parece, portanto, uma medida que vai facilitar a vida do presidente Milei […]. A medida coloca em xeque toda uma série de iniciativas voltadas à livre circulação de pessoas no Mercosul. É difícil verificar se contraria essas normativas porque, ao que parece, as ações de restrição de entrada são baseadas em suposta documentação irregular (e a documentação é exigida no âmbito das regras do Mercosul). Contudo, resta a interpretação de que o recrudescimento de normas e exigências não parece ser um passo rumo à facilitação da integração", afirma.
O que é o 'falso turismo' apontado pelo governo Milei?
Impacto negativo sobre o turismo popular
"De todo modo, esse raciocínio se aplica tanto aos argentinos que vêm para o Brasil quanto aos brasileiros que vão para a Argentina. O rico é sempre menos afetado por essas medidas, e mais distanciado do povo em geral, já que transita por circuitos turísticos limitados, com muitos serviços agregados, não costuma ser afetado ou mesmo se importar com medidas impopulares impostas sobretudo contra os mais pobres", resume.
"Do ponto de vista político, ela comunica com uma Argentina voltada para si, menos latinoamericanizada, e que tende a enxergar seus vizinhos mais como problema do que como solução. Parece cada vez mais claro, como visto na recente visita de Milei aos EUA, que o novo presidente da Argentina vai apostar grande parte de suas fichas em uma relação privilegiada com os ianques, em particular se Trump for reeleito. No passado, como no governo Menem, essa estratégia não rendeu os frutos esperados", finaliza.