Panorama internacional

Brasil está 'significativamente exposto' às sanções ocidentais, alerta economista

Com a miríade de sanções contra a Rússia, ficou evidente para o mundo que os Estados Unidos e a Europa não hesitarão em usar seu poder econômico como arma. Agora que as sanções não estão mais contidas a países de menor economia, chegou a hora de o Brasil se preocupar? Um política externa independente pode nos tornar alvo dessas medidas?
Sputnik
Sanções econômicas e comerciais não são nenhuma novidade no mundo político, sendo realizadas há séculos entre nações, como no bloqueio continental napoleônico. Mas desde que a ordem econômica mundial foi estabelecida, primeiro pelos Acordos de Bretton Woods e depois pelo fim do padrão-ouro e pela aceleração dos fluxos de capital neoliberal, nenhum país obteve tanto controle e pôde usar uma moeda como arma como os Estados Unidos fazem com o dólar.
Ainda assim, com o fim da Guerra Fria, os EUA mantiveram e realizaram sanções ora localizadas, como no caso de comércio com a China, ora quase totais a países com economias menos expressivas, como a Venezuela e o Irã.
Sanções não deveriam ser medidas levianas, aponta Luiza Peruffo, PhD pela Universidade de Cambridge e professora no Departamento de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). "Não é para um país sair colocando sanções financeiras em outro."
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"Se os Estados Unidos ou uma coalizão ocidental de países simplesmente vão e colocam sanções em outro, isso gera mais incentivos para a criação de um sistema alternativo", explicou. "A dominância de um único sistema existe porque é como se fosse um 'bem' público internacional."

"A China hoje em dia já fala muito sobre o fato de que não se pode confiar no sistema liderado pelos Estados Unidos porque eles cada vez mais colocam sanções nos países", afirmou Peruffo, "mas isso também é uma maneira de legitimar a criação de um sistema alternativo pela China".
Para a economista, contudo, é difícil imaginar que o Brasil venha a sofrer sanções como as experimentadas por outros países. "Eu diria que é improvável que aconteça alguma coisa nesses moldes. Não vejo isso acontecendo."
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Até pouco tempo, era impensável que um país do tamanho da Rússia fosse excluído do sistema financeiro internacional. Mas isso não só ocorreu como ligou o sinal de alerta para outros países que não planejam estar constantemente ao lado dos Estados Unidos, como a Arábia Saudita, que hoje avalia se entra ou não no BRICS, grupo de países que forma uma alternativa ao modelo ocidental.
Para o professor de economia da Universidade Federal do Ceará (UFC) Fábio Sobral, a busca do Brasil por uma política externa independente pode nos colocar em posição contrária aos grupos ocidentais, como o G7 e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).

"Cada vez mais haverá maior divergência entre o BRICS e a OTAN, essencialmente, no Norte da África, na Ásia Ocidental ou no Oriente Médio", afirmou.

Uma hora, sublinha o economista, "o Brasil vai ter que tomar uma posição diferente dos Estados Unidos".
Nesse sentido, diferentemente da Rússia e da China, que já estão acostumados com uma atitude mais combativa dos EUA, o Brasil está "significativamente exposto" à tomada de sanções por parte do mundo ocidental, acredita Sobral.
O Relatório de Gestão das Reservas Internacionais de 2023, elaborado pelo Banco Central, demonstra a nossa dependência da moeda norte-americana. Das reservas brasileiras, seja em dinheiro ou em título, 80,42% são cotadas em dólar estadunidense, enquanto 5,37% são em renminbi, 4,74% em euro, 3,15% em libra esterlina, 2,52% em ouro e 1,86% em iene, com o restante ocupado pelo dólar canadense e dólar australiano.

"Há um percentual muito grande de títulos do tesouro americano, e isso é um risco", avalia o especialista.

Por um lado, esses ativos rendem juros, fazendo com que valorizem com o passar do tempo, e possuem grande liquidez, ou seja, rapidamente são encontrados compradores para o papel. Mas, por outro, em caso de sanções, eles podem ser congelados e terem sua transacionalidade negada.
"Grande parte do sistema financeiro de ativos passa por Londres ou por Nova York", afirma Igor Lucena, economista e doutor em relações internacionais. Por conta disso, o Brasil, como "qualquer outra nação do mundo, também está suscetível a receber sanções".
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O que o Brasil pode fazer?

Para Lucena, infelizmente, a maneira como estamos é o estado das coisas. "Hoje não há alternativa clara e correta que não coloque em risco a solidez financeira do país", afirmou.

"É um dos grandes cinco poderes dos EUA, sua capacidade de emitir uma moeda internacionalmente conhecida e internacionalmente liquidada."

Segundo o economista, "aumentar a exposição em euros" também não seria uma solução, uma vez que as sanções ocidentais são tomadas em conjunto pelos EUA e pela Europa. "Você não conseguiria afirmar esse risco", afirma.
Para Sobral, no entanto, o caminho trilhado pela Rússia e pela China, especialmente, pode servir de exemplo para o Brasil. Os países passaram de "US$ 4 trilhões [R$ 20 trilhões] para US$ 1 trilhão [R$ 5 trilhões]" em títulos da dívida norte-americana. Em seu lugar, ambos têm aumentado a participação do ouro como reserva de valor, embora, segundo Lucena, contabilmente, este tenha uma liquidez incerta.
Ainda assim, o mineral precioso hoje compõe uma pequena parte da carteira do Banco Central, e outros minerais, como o lítio — que deve ter uma valorização mais rápida do que o dólar —, deveriam estar mais representados no portfólio do Banco Central, segundo Sobral.

"Pode até se manter um portfólio que tenha títulos americanos, mas o ideal é manter uma outra parte da reserva em moeda sonante e em minerais preciosos, principalmente o ouro."

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