No episódio do Jabuticaba Sem Caroço, da Sputnik Brasil, desta sexta-feira (20), a espetacularização agressiva da política no país foi destacada nas entrevistas com os analistas Guilherme Simões Reis, professor da Escola de Ciência Política e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (CCJP/Unirio), e Paulo Henrique Cassimiro, professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP/UERJ).
Com o avanço da tecnologia e dos meios de difusão de notícias, as
campanhas eleitorais se tornaram um show midiático desregulado, em que
o que menos importa é a proposta do candidato, frisou Cassimiro.
Reis foi nessa mesma linha de raciocínio ao acrescentar que as
estratégias para debates, antes norteadas pela ciência política e pelos marqueteiros, já não funcionam mais.
Neste novo contexto, comentou Reis, a estratégia que tem funcionado para muitos é apresentar soluções simples de forma muito midiática, com imagens fortes. As redes sociais, por sua vez, tornaram-se o palco dessas ações, principalmente para alcançar o eleitorado mais jovem e despolitizado, que vem crescendo em números.
A mudança na política, segundo o professor da Unirio, foi iniciada nacionalmente pelo ex-presidente
Jair Bolsonaro (PL) e incrementada por Pablo Marçal (PRTB), em São Paulo, um candidato "completamente sem parâmetros".
Trechos editados de um debate para construir determinada narrativa chega de modo direto, não mediado a públicos específicos, ressaltou Cassimiro, criando bolhas informacionais que reforçam crenças e, até, inverdades.
Como exemplo, ele citou o caso ocorrido no debate em São Paulo, no último domingo (15), em que o
candidato a prefeito Pablo Marçal levou uma cadeirada do
adversário José Luiz Datena (PSDB). Logo após o incidente, Marçal divulgou vídeos usando máscara de oxigênio em uma ambulância.
O pesquisador reconheceu que a mídia tradicional também tenta produzir viés e manipular polêmicas, tendo casos emblemáticos, como o debate entre Fernando Collor e Luiz Inácio Lula da Silva em 1989. Entretanto, ponderou que, diferentemente de agora, essas ações são passíveis de responsabilização legal, institucional, como direito de resposta, multas, processos etc.
"Hoje, nada disso tem consequência nenhuma para ninguém. O mundo virou um conjunto isolado de bolhas que se alimentam de narrativas para reforçar sua visão de mundo".
Muito desse novo panorama, pontuou, vem da "descrença" crônica do eleitor brasileiro com a política e da demonização da política por parte de candidatos que se apresentam como solução milagrosa para os problemas da sociedade.
Reis mencionou a operação Lava Jato e seus desdobramentos como um dos fatores que fortaleceram o movimento da antipolítica, "uma visão da população de que política é roubo" e de votar em pessoas de fora da política.
Não é à toa, frisou Cassimiro, que a esquerda tem perdido espaço em muitos municípios.
"É fato que a direita tem franca e considerável vantagem para ganhar em boa parte das capitais do Brasil. Isso mostra que existe uma lógica nas eleições municipais, que pode não ser a mesma lógica nacional, mas que está funcionando bem para a direita, sim."
A falta de "criatividade política" e conservadorismo da esquerda, na opinião de Cassimiro, explica o motivo da esquerda estar perdendo a batalha geracional do eleitorado brasileiro, como revelam as pesquisas de opinião:
Já Reis destacou também a escassez de
novos protagonistas na ala da esquerda no cenário nacional. "Acho que existe uma carência de lideranças da esquerda para substituir Lula. Pessoalmente, não acredito que o [Fernando] Haddad esteja bem posicionado e seja um herdeiro natural do Lula. Acho que é um cenário complexo", comentou.