Entre as previsões citadas pelos autores do documento destacam-se situações como a fragmentação da Rússia, o colapso da União Europeia, o fortalecimento da Turquia, o declínio da China e da Alemanha, a ascensão da Polônia, Hungria e Romênia, e a hegemonia política e econômica cada vez maior dos Estados Unidos.
Para Fabiano Mielniczuk, o primeiro ponto que chamou atenção e com o qual não concorda no relatório foi como a China foi rebaixada a mero coadjuvante dentro da política internacional, alegando um esgotamento do modelo de desenvolvimento econômico naquele país baseado em trabalho intensivo, em mão-de-obra mal remunerada e em produtos de baixa qualidade. Porém, o especialista em relações internacionais registra que a China está investindo muito em tecnologia justamente para modificar os padrões antigos de desenvolvimento econômico.
“A China está investindo muito num salto tecnológico, pois ela quer abandonar a dependência que a economia dela tem dessa produção de setores de trabalho intensivo para setores de capital intensivo, ou seja, setores de alta tecnologia e desenvolvimento de produtos que agreguem valor por meio da inovação tecnológica e que possam fazer com que a China tenha um salto qualitativo em termos de desenvolvimento econômico. E isso o relatório negligencia.”
Ainda sobre um possível enfraquecimento da China, Japão e outros países do leste da Ásia até 2025, o especialista em relações internacionais explica que a tendência mundial é a de perceber a transição do centro econômico do planeta saindo da Europa e dos Estados Unidos e indo para a Ásia, porém o relatório vai na contramão disso.
“O que me chamou mais a atenção do grau de alarmismo e de ficção da análise da Stratfor foi a fragmentação representar um perigo para o mundo por conta do arsenal nuclear russo, que pode ser utilizado por grupos terroristas ou líderes regionais que surjam do processo de ruptura em relação as países ocidentais.”
Fabiano Mielniczuk revela que quando se faz a análise da Rússia, a indicação que se faz em termos de políticas a serem adotadas pelos EUA e pelos países ocidentais é a de que os ocidentais vão aceitar o lançamento de mísseis nucleares não controlados, ou eles vão fazer uma intervenção militar antes que isso aconteça. O relatório aponta, no entanto, que não há formas de conceber uma intervenção militar contra a Rússia. A solução seria transformar a Rússia e os países da região em regimes aliados aos ocidentais, em prosperidade econômica vinculada ao capitalismo ocidental, diminuindo o perigo de uma ameaça nuclear russa em mãos de terroristas.
“Me parece que eles criaram um monstro que não existe, um fantasma para legitimar as ações que já são tomadas desde os anos de 1990 e 2000, pelos governos ocidentais como, o avanço da OTAN, a harmonização da Rússia, a entrada do presidente Putin. A análise no meu ponto de vista é bem diferente. O governo Putin conseguiu organizar e recentralizar o Estado russo depois do período de Yeltsin, que de fato foi um período de fragmentação, e contou com o apoio da população para fazer esse processo.”
O especialista critica também o ponto do estudo sobre a fragmentação da União Europeia por causa de uma crise econômica, a fraqueza da Alemanha derivada dessa fragmentação, e a ascensão da Polônia, Hungria e Romênia como países líderes na Europa, inclusive como líderes numa possível aliança europeia contra a Rússia.
“Primeiro tem que ter muita imaginação para acreditar que a Alemanha vai deixar de ser uma potência econômica na Europa, isso é um aspecto pra mim que parece ser bastante complicado de sustentar. Segundo, mesmo que haja isso, nem a Alemanha e nem a França têm interesse em permitir que a Polônia surja como uma liderança, e crie um antagonismo com a Rússia, porque os franceses e os alemães não querem complicações com a Rússia.”
Em relação à colocação da Hungria como um aliado dos Estados Unidos e do Ocidente numa aliança contra a Rússia, e da Turquia, que também é vista pela Stratfor como um aliado e como um país que vai começar a se envolver nos conflitos com o apoio do Ocidente para isolar a Rússia diplomaticamente, e também militarmente no controle do Mar Negro, Fabiano Mielniczuk avalia os dois países como complexos, em que a história política recente deles mostra uma tendência contrária a de se aliarem aos EUA e a Europa contra a Rússia.
“A Hungria tem atualmente se aproximado cada vez mais da Rússia e criticado o capitalismo ocidental. Já a Turquia tem pretendido uma posição de líder regional, não para reforçar uma estratégia ocidental, mas para se opor as estratégias ocidentais, e o relatório parece desconhecer isso.”