Criado em 2011, a partir do desmembramento do território do Sudão, o novo país vivenciou uma guerra civil que tem como saldo trágico, até aqui, dezenas de milhares de mortos, além de 2,2 milhões de pessoas obrigadas pelo conflito a deixar as regiões em que viviam.
Segundo o professor de Relações Internacionais da Universidade Federal Fluminense, Jonuel Gonçalves, especialista em políticas da África e do Oriente Médio, a crise no Sudão do Sul se instalou a partir das divergências entre o Presidente Salva Kiir e o seu ex-Vice Presidente Riek Machar.
O acordo para o fim da guerra civil foi assinado na Etiópia, país que, segundo o Professor Gonçalves, trabalhou intensamente pela pacificação do Sudão do Sul. Mesmo assim, afirma o especialista, o acordo deve ser visto com todas as reservas e cautelas, pois, anteriormente, as facções em choque no Sudão do Sul haviam assinado sete compromissos de cessar-fogo, todos prontamente violados e desrespeitados.
O Professor Gonçalves explica que essa guerra civil de quase dois anos no Sudão do Sul “é continuação, com intervalo, de uma guerra que é a mais longa da África, entre o sul e o norte do Sudão. ‘Norte’ em termos alargados, porque era bem mais que o norte. No fundo, o que se apresentava como linha de fratura é que o sul é de maioria cristã, com fortes grupos animistas, e o norte é de maioria muçulmana. Já na época da descolonização havia sido proposta a criação de dois países, mas se acreditou que a liderança em Cartum, a capital do Sudão, permitiria um regime de conciliação religiosa”.
No entanto, Jonuel Gonçalves ressalta que a divergência religiosa foi antes da independência do Sudão do Sul:
“Foi esta divergência que foi apontada como fator principal para a separação dentro do Sudão”, diz o especialista. “A maior parte do território era islâmico, e depois, no sul, a maioria era ou cristã ou de religiões africanas. Após a independência, em 2011, surgiram problemas entre o presidente e o vice-presidente. E as divergências foram apresentadas como consequência de diferenças étnicas. De fato é uma desculpa. A diferença foi a vontade dos dois de exercer a Presidência, e cada um tentou mobilizar dentro de sua etnia aquela coisa perigosíssima que é o apelo às entidades, que acaba por provocar uma fratura e um clima de fanatismo.”
O Professor Jonuel Gonçalves acrescenta:
“A guerra provocou dois milhões de deslocados internos no próprio sul do Sudão. Não sabemos quantas são as vítimas mortais e os feridos, mas se calcula que sejam mais de 100 mil, e o país está completamente desarticulado. O país mais novo do mundo se desarticulou todo com essa guerra. Esta divergência entre o presidente e o vice-presidente levou à divisão das Forças Armadas. É uma guerra civil do tipo quase clássico, em que uma parte tomou o controle de um pedaço do território e a outra parte de outra, e os dois tentando tomar os campos de petróleo. Logicamente que tudo isso é um coquetel muito explosivo.”