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Ecos da ditadura: Advogados e sindicalistas entram na Justiça contra a Volkswagen

ENTREVISTA COM ROSA MARIA CARDOSO DA CUNHA 2 DE 24-09- 15
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Uma comissão de advogados e integrantes das mais importantes Centrais Sindicais do país entregou ao Ministério Público Federal, na terça-feira, 22, uma representação contra a Volkswagen do Brasil. Motivo: crimes praticados nos anos de chumbo.

Segundo a advogada Rosa Maria Cardoso da Cunha, membro desta comissão de advogados, a Volkswagen do Brasil é acusada de ter financiado a construção de instalações militares para a prática de torturas durante o regime militar, ter cedido veículos para as operações repressivas, ter contribuído para a detenção de várias pessoas e ter permitido até mesmo a utilização de suas dependências para interrogatórios dos detidos.

Em entrevista exclusiva concedida à Sputnik Brasil, a Dra. Rosa Maria Cardoso da Cunha explicou que o objetivo desta iniciativa não é obter uma reparação material para as vítimas ou para os seus familiares, porém decretar a responsabilidade jurídica civil da montadora perante estes fatos.

A Dra. Rosa Maria, que defendeu Dilma Rousseff quando de sua prisão pelo regime militar, foi integrante da extinta Comissão Nacional da Verdade e permanece na ainda vigente Comissão Estadual da Verdade no Rio de Janeiro.

A Comissão Nacional da Verdade funcionou no período de 16 de maio de 2012 a 16 de dezembro de 2014. Além da Dra. Rosa Maria, atuaram durante todo aquele período na Comissão o ex-Ministro da Justiça José Carlos Dias, além do jurista José Paulo Cavalcanti Filho, da psicanalista e jornalista Maria Rita Kehl e do diplomata Paulo Sérgio Pinheiro.

Os fatos envolvendo a Volkswagen do Brasil foram revelados na mesma semana em que o presidente mundial do Grupo Volkswagen, Martin Winterkorn, renunciou ao cargo. A renúncia foi anunciada na quarta-feira, 23, após a revelação do escândalo envolvendo as emissões de poluentes de veículos diesel da montadora. A Volkswagen está sendo acusada pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos de alterar testes dos seus propulsores.

A corporação alemã admitiu que cerca de 11 milhões de veículos no mundo contêm um dispositivo manipulador que permite que os veículos sejam aprovados em testes de emissão de poluentes. 

A seguir, a entrevista da advogada Rosa Maria Cardoso da Cunha à Sputnik, falando das acusações específicas que pesam contra a montadora alemã no Brasil. 

Sputnik: A Comissão Nacional da Verdade terminou seus trabalhos em 16 de dezembro de 2014, mas agora surge a informação de que a Comissão ou membros da Comissão teriam entrado com pedido junto ao Ministério Público Federal para que a montadora Volkswagen seja investigada.

Rosa Maria Cardoso da Cunha: Na verdade, não foram membros da Comissão. Ela se extinguiu, terminado seu mandato, mas ela se insere dentro de um curso do que nós chamamos de justiça de transição, de lutas por memória, verdade e justiça, na perspectiva do que foi a ditadura de 64, para que ela não se repita mais. Mesmo depois de extinta a Comissão Nacional, há outras Comissões da Verdade remanescentes e um grupo de trabalho formado pela Comissão, um grupo que investigou a repressão à vida contra trabalhadores e movimento sindical. Este grupo continuou trabalhando e investigando, mas a partir do legado da Comissão Nacional, das provas que haviam sido recolhidas em relação a um conjunto de empresas e muito especificamente em relação à Volkswagen, onde havia provas muito consistentes não só de colaboração, de ajuda aos órgãos repressivos, de financiamento, cessão de veículos para serem usados pelos organismos de repressão, inclusive num centro muito notório de tortura e extermínio, que foi a Operação Bandeirantes, depois DOI-CODI de São Paulo. E ela também fez espionagem de trabalhadores, entregou trabalhadores à polícia, permitiu e ensejou que na planta da fábrica trabalhadores fossem presos ilegalmente e fossem até torturados nas dependências da empresa. Nós, então, entregamos essa representação, que é uma petição ao Ministério Público pedindo que fosse instaurado um inquérito civil, porque a medida não é criminal. Uma questão é que esses fatos sejam apurados como crimes contra a humanidade, e outra questão é que sejam vistos como ilícitos civis articulados a estes crimes contra a humanidade, o que leva estes fatos a serem imprescritíveis e não anistiáveis. O que se quer não é uma indenização material das vítimas, mas uma reparação coletiva para os trabalhadores, uma reparação simbólica, um pedido de desculpas da Volkswagen, um reconhecimento de que agiu equivocadamente, de que se associou a uma ditadura, que empresas não podem ter este tipo de comportamento, para que isso fique bem marcado como uma conduta que não pode se repetir.

S: Os fatos imputados à Volkswagen seriam passíveis de punição mesmo com a Lei da Anistia?

RMCC: Sim. A Lei da Anistia se aplica à questão criminal. No âmbito civil esta lei não tem aplicabilidade.

S: A senhora e mais um grupo de advogados…

RMCC: Mais um grupo de advogados e representantes das 10 mais importantes Centrais Sindicais do país.

S: …estão em busca de uma responsabilização civil pelos atos ilícitos cometidos.

RMCC: E uma reparação social, simbólica.

S: E o que está sendo pedido?

RMCC: Isto ainda vai ser construído no curso do processo, numa negociação entre o Ministério Público e a empresa. Se ela não aceitar, pode-se entrar depois com uma ação. Mas, se ela aceitar, teria que se conversar como ela entende que pode se colocar diante da sociedade brasileira, dizendo que agiu mal e pretende ter uma postura diferente desde agora e para o futuro.

S: Qual seria o procedimento a ser instaurado neste início de tratativa, seria uma notificação judicial ou extrajudicial?

RMCC: O inquérito será instaurado. Há um pedido para a instauração. O Ministério Público instaura este inquérito e começa a chamar os representantes da empresa. Nós já temos provas. Pode ser que eles queiram ouvir novamente as vítimas no âmbito do Ministério Público, e há essas vítimas que aparecem prestando depoimentos que estão transcritos na nossa petição mas podem ser ouvidas outra vez, e chamados depois os representantes da empresa para ouvi-los e para deliberar com eles um encaminhamento para esta questão.

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