O especialista em economia Mário Russo, ex-editor do “Jornal do Commercio” do Rio de Janeiro, salientou o fato de a Presidenta Dilma ter dito que, no Brasil, Governo e sociedade não toleram a corrupção. Para o jornalista, este foi um claro recado de que a presidente, ao retornar a Brasília, tomará as medidas necessárias para afastar qualquer risco de descrédito ao país.
No cenário externo, Mário Russo apontou as preocupações do Brasil em acolher os refugiados sírios e o apoio do país a todas as iniciativas que resultem em negociações positivas para o restabelecimento da paz não só na Síria como em todos os países em que há conflitos.
Mário Russo: Ela comentou um pouco sobre tudo, mas eu dividiria em dois grandes blocos: o primeiro é a questão interna do Brasil, em que ela, além de enfatizar a rede de proteção social que ela teve no primeiro mandato e agora no segundo, ela enumerou todas as conquistas que vem amealhando com essa política do Governo. Deu um grande destaque também à questão ambiental, que vai ser debatida no próximo encontro em Paris [COP 21]. Este debate está dentro da chamada Agenda 2030, que reúne os objetivos de desenvolvimento sustentável – um conjunto de 17 metas da ONU para promover as ações da comunidade internacional até 2030. Ela mostrou o esforço que o Brasil tem na redução de 37% de emissão de gás de efeito estufa até 2025.
No plano externo ela abordou com certa ênfase a questão da crise humanitária, não só no Norte da África como no Oriente Médio, e o drama dos refugiados. Ela fez uma citação ao pai dela, que era búlgaro. Lembrou que ele foi, como tantos outros, acolhido com a família pelo Brasil, e disse que o Brasil, embora longe do cenário geográfico onde acontecem esses conflitos, está permanentemente de braços abertos para receber refugiados. Citou a questão dos refugiados do Haiti, que têm uma grande entrada principalmente pelo Norte do Brasil, e conclamou a comunidade internacional para ter uma ação conjunta mais efetiva nisso. Na parte internacional, deu sua espetadinha no Presidente Barack Obama, quando ela citou especificamente que o mundo sofre hoje com a sequência de intervenções que agravaram os conflitos e possibilitaram o surgimento do terrorismo onde não existia. Não chegou a ser algo dramático, uma denúncia forte, mas não deixou de ser uma espetada na política externa americana. E outra questão que é muito importante e vai ser tema de vários encontros paralelos é a eterna reformulação do Conselho de Segurança.
MR: Essa novela da mudança do Conselho de Segurança está se arrastando há quase duas décadas. Há 18 anos há esses apelos principalmente dos países emergentes, lembrando que o Conselho de Segurança é formado hoje por EUA, Reino Unido, França, Rússia e China. E os países do Terceiro Mundo, Brasil inclusive, vêm postulando uma vaga neste Conselho. A Índia também está pleiteando isso. Angela Merkel, por ocasião de uma fala recente na chegada à Assembleia-Geral, demonstrou a necessidade de se acelerar este processo, que está muito lento e que precisa ter uma nova configuração nesta geopolítica, introduzindo novos atores para definir questões que a cada ano que passa ficam mais pungentes, mais graves, e são focos de instabilidade internacional. Não só por causa da questão do Norte da África, especificamente do Oriente Médio, da Síria. Há uma resistência muito grande em ceder esses assentos a esses novos participantes. Vamos ver o que vai acontecer. A presidente vai ter alguns encontros com o primeiro-ministro do Reino Unido e com os presidentes da França, do Peru e da Colômbia, e uma agenda cheia de encontros para discutir este e outros assuntos.
Outro aspecto importante que ela abordou foi a defesa da representação do Estado Palestino na ONU. A Palestina tem hoje um posto de observadora. A Presidenta Dilma cobrou uma solução, senão definitiva, pelo menos uma solução negociada e não, segundo ela, uma mera repetição de administração de crise. Ela considera que é um assunto que merece toda a atenção não só pela questão geopolítica – o Oriente é um barril de pólvora em permanente ebulição. Tivemos a questão do Iraque, temos a questão da Síria, tivemos este longo debate sobre o projeto nuclear iraniano. E este foco, segundo a Presidenta Dilma, específico em relação a Israel-Palestina tem que ter uma resposta mais efetiva da comunidade internacional.