Os confrontos no Mato Grosso do Sul tiveram início devido a indefinições sobre a titularidade das terras na região. Uma das áreas indígenas em conflito é Nhanderu Mangaratu, que teve o processo de homologação iniciado pelo Executivo, em 2005, mas em seguida foi suspenso por liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) a favor dos fazendeiros.
Segundo o Conselho Nacional de Justiça, a questão entre índios e fazendeiros se agravou a partir de agosto deste ano, quando índios ocuparam uma fazenda e fizeram moradores reféns. Após a intervenção do Departamento de Operações da Fronteira (DOF), do governo estadual, os prisioneiros foram libertados. Porém, desde então, outras propriedades rurais foram ocupadas por indígenas.
A líder da tribo, Valdelice Veron, que teve o pai, o cacique Marcos Veron, assassinado nos confrontos, denuncia que a tribo vive em clima de terrorismo e genocídio, e diz que ela mesma está jurada de morte.
“São mais de 300 lideranças indígenas executadas no estado de Mato Grosso do Sul. Eu mesma estou marcada. Nós fomos expulsos, a partir de 1920, em decorrência da exploração de erva mate, e o governo brasileiro nos jogou em oito reservas. Nós Guarani-Kaiowá nunca aceitamos esse modo de confinamento. Hoje convivemos com assassinatos comandados pelos latifundiários em nome dessa história de produção (agropecuária)”.
Valdelice informou que o mesmo problema vem acontecendo em áreas dos índios da tribo Terena.
O Ministério Público Federal (MPF) já tinha determinado a instauração de um inquérito policial na região para investigar a série de ataques contra os índios Kaiowá. A suspeita é a de que fazendeiros do estado mobilizaram milícias armadas para atacar a tribo.
O Ministério da Justiça também vem buscando negociar soluções com indígenas, fazendeiros e o governo estadual para acabar com o conflito, mas até agora não obteve sucesso.
O presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), João Pedro da Costa, analisa como incoerente o fato de o estado do Mato Grosso do Sul ter uma economia crescente, com base na produção de grãos, e, ao mesmo tempo, ainda abrigar cerca de 50 mil índios e povos tradicionais sem-terra.
Durante a audiência na Comissão de Direitos Humanos, João Pedro da Costa anunciou que vão ser retomados os grupos de trabalho que eram responsáveis por estudos técnicos de demarcações de terras indígenas. De acordo com ele, os grupos paralisaram as atividades justamente por conta de intimidações de jagunços, que é o nome que se dá aos indivíduos que prestam trabalho paramilitar como seguranças, normalmente para fazendeiros.
“Estamos cuidando da retomada de seis Grupos de Trabalho, e vamos voltar para o Mato Grosso do Sul para concluirmos os trabalhos pendentes acerca das terras prioritárias".
A Cidade de Dourados, no Mato Grosso Sul, acaba de sediar a etapa regional da Conferência Nacional de Políticas Indígenas, com o objetivo de elaborar propostas para subsidiar o Governo Federal na implementação de políticas públicas voltadas aos povos indígenas. A etapa final da conferência está prevista para dezembro, quando cerca de 2 mil indígenas são esperados em Brasília.
No início da semana, índios, quilombolas e ribeirinhos fizeram na Câmara uma vigília para denunciar violações de direitos dos povos tradicionais, inclusive os direitos previstos na proposta dos deputados (PEC 215/00) que submete as demarcações de terras indígenas ao Congresso.
Os deputados ligados à causa indígena avaliam que a mobilização da bancada ruralista em defesa da Pec 215 e a interferência do Judiciário têm impedido novas demarcações.
A assessora jurídica da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Alda de Carvalho, que esteve presente na audiência da Comissão de Direitos Humanos, pediu mais negociação, a fim de que também seja reconhecido o direito de propriedade dos fazendeiros, assegurado na Constituição.