Anunciado em Cuba, país que vem servindo de sede para as negociações entre o Governo do Presidente Juan Manuel Santos e as FARC, o acordo prevê a criação de tribunais especiais para julgar ex-combatentes das FARC. No entanto, segundo Diogo Dario, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o acordo ainda poderá ser submetido à votação popular antes de adquirir validade efetiva.
“Algumas coisas estão mais claras, outras precisarão ser especificadas mais tarde”, comenta Diogo Dario.
“O que ficou claro com o acordo liberado ontem é que haverá a criação de um tribunal especial, uma jurisdição especial. Mas tanto a jurisdição convencional, o Direito ordinário colombiano, quanto esta jurisdição especial correrão paralelamente, o que significa que se houver confissão de um crime, dentro desse processo de desmobilização da guerrilha, se terá acesso a essas penalidades e reparações especiais, com uma pena menor, e, como parte desta pena, a obrigação do pagamento de um conjunto de reparações. Se não houver a confissão do crime e no processo de investigação esse crime for descoberto, a punição será aplicada de acordo com o Direito colombiano ordinário, e as penas podem ser altíssimas. A lógica do funcionamento é completamente distinta.”
Quanto às reparações, Diogo Dario explica que serão de dois tipos e devem se assemelhar muito às reparações que já estão sendo aplicadas às desmobilizações dos paramilitares, que ocorre na Colômbia desde 2003.
“Há reparações de caráter simbólico, com cerimônias coletivas, onde as pessoas pedem perdão, fazem prestação de serviços comunitários, construção de monumentos em homenagem às vítimas do conflito. E existem as reparações financeiras. As FARC já anunciaram que vão aceitar indenizar – o que é algo importante, porque não se tinha certeza de como eles se posicionariam sobre esse elemento – e o Governo também vai ter que indenizar eventualmente as vítimas, porque os militares também estarão sujeitos a esta jurisdição especial. O que é uma das preocupações do Governo, porque, ao contrário do processo de desmobilização dos paramilitares, este processo com as FARC, por ele ser muito maior e por incluir muito mais elementos, será muito caro. Esta é uma preocupação da sociedade colombiana e algo que está sendo discutido muito seriamente atualmente.”
O especialista em políticas latino-americanas da UFRJ explica ainda que “este é só um acordo de um conjunto de cinco pontos que está sendo trabalhado desde 2002”.
“Temos ainda um último ponto pendente. Colocando todos esses elementos, o Governo, que está neste momento olhando para a economia e vendo um país que cresceu muito nesses últimos cinco anos começar a desacelerar, começa a ficar preocupado. Como ele vai sustentar todo esse processo e financiar essa parte? O Presidente Santos, tanto no ano anterior, 2014, quando ele estava concorrendo à reeleição, quanto em 2015, fez uma série de viagens internacionais para consultar fundações e países a respeito da possibilidade de conseguir financiamento. Como é um processo de grande visibilidade, muitos países estão dispostos a apoiar, mas em forma de empréstimo. Há poucas doações. Um dos perigos nesse processo de reparação e no processo de financiamento da paz como um todo é o receio de que o Governo se endivide mais do que vai conseguir sustentar no momento em que a economia colombiana começa a se desacelerar ligeiramente.”
“Elas ganharam muito dinheiro, nos últimos 10 anos, com exploração da mineração, principalmente na área do norte, perto da região que é mais rica em petróleo. A questão é que as FARC se comprometeram a fazer essas reparações, mas ninguém sabe exatamente de quanto serão, pois isso só vai ficar claro quando as sentenças começarem a ser liberadas pelo tribunal. E como as FARC farão agora que não têm mais aquelas fontes, já que estão na legalidade?”