“Isso não significa, ao contrário do que muitos entendem, que será obrigatório o aborto. Defendemos poder a mulher decidir sobre a permanência ou não da gestação. No caso do zika vírus e da polêmica sobre se legaliza ou não o aborto, ele não traz nenhuma novidade sobre o tema. Se defendemos que o aborto seja legalizado, numa situação como essa, a mulher vai ter o direito de permanecer ou não com a gravidez.”
Clair lembra que o Instituto de Bioética Anis já encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedido para legalização também do aborto em casos de microcefalia. Em 2008, o Anis encaminhou ao STF solicitação para que fosse concedido o direito ao aborto a mulheres grávidas de feto com anencefalia, má formação do cérebro. Quatro anos depois, o Supremo concedeu a autorização. Com isso, o Brasil passou a permitir a interrupção da gravidez em três casos: estupro, gravidez de risco para a mãe e má formação cerebral.
“Nós mulheres enfrentamos outro problema. Quando a gente opta por fazer um aborto, mesmo nesses três permissivos legais, existe repressão no serviço de saúde, humilhação e violência na hora de fazer o aborto, descaso, abandono e ainda burocracia que muitas vezes quando se consegue liberar (o procedimento) já está fora do período possível de fazer. Isso é resultante de uma sociedade muito opressiva, fundamentalista e insuflada por toda essa fúria dos religiosos e conservadores contra o corpo da mulher, contra a possibilidade de as mulheres decidirem sobre sua reprodução e sua vida.”
Por tudo isso, segundo Clair Castilho, “as mulheres muitas vezes procuram os abortos clandestinos, que são inseguros e as levam à morte. Na verdade, quem sofre com isso tudo, na grande maioria dos casos, são as mulheres pobres, negras, das periferias urbanas, pessoas que pertencem aos oprimidos desta sociedade. As mulheres de classes sociais mais favorecidas não têm problemas, porque pagam a aborteiros clandestinos em clínicas muito boas, com médicos de qualidade, ou simplesmente vão para o exterior”, finaliza a secretária executiva da Rede Nacional Feminista de Saúde, de Direitos Sexuais e de Reprodução.
A questão de tempo, contudo, é crucial, segundo especialistas, uma vez que ainda não há prazo definido para que se consiga uma vacina contra o zika.
Enquanto isso, a polêmica sobre a melhor forma de combater o Aedes Aegypti, mosquito transmissor da doença, esquentou com a denúncia apresentada pela organização argentina Physicians in Crop-Sprayed Towns (PCST), segundo a qual o larvicida pyriproxifen, fabricado pela Sumitomo Chemical, companhia associada à Monsanto, e introduzido no Brasil no final de 2004, poderia ser a verdadeira causa do zika vírus. Segundo o relatório, as regiões onde o larvicida foi aplicado são as que contabilizam o maior número de casos confirmados.
O Ministério da Saúde, contudo, desmente as informações e anuncia que a empresa recebeu certificação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para comercializar o produto.
Procurada pela Sputnik Brasil, a Sumitomo Chemical não respondeu ao pedido de entrevista até o fechamento desta matéria.