Uma das prioridades da nova diplomacia brasileira é estreitar laços com os grandes players do comércio global, o que inclui Estados Unidos, União Europeia, China, Japão e o Tratado do Transpacífico. Segundo vários especialistas em comércio exterior, um dos empecilhos para o alcance dessas novas metas é a própria constituição do Mercosul. A Resolução 32, por exemplo, especifica que é preciso aprovação dos quatro membros plenos para que um dos sócios possa negociar acordos com outros países de forma isolada.
Paraguai e Uruguai são dois dos sócios que apoiam a negociação em separado, mas a Argentina tem sido um empecilho até agora às pretensões brasileiras. Com a chegada à presidência de Maurício Macri — sucedendo a presidente Cristina Kirchner e pondo fim a 15 anos do kirchnerismo — e a composição do novo governo interino no Brasil, há quem aposte que essa resistência possa diminuir ou ser até removida. De concreto até agora, porém, o Mercosul, como bloco, só fechou até hoje acordos comerciais com o Egito, Palestina e Israel. Novos estão na mira, entre eles com o Canadá, Japão, Coreia do Sul e o EFTA, sigla que reúne Suíça, Noruega, Islândia e Lichtenstein.
Dentro do próprio governo brasileiro, contudo, a possibilidade de o Brasil negociar em separado do Mercosul preocupa alguns setores. No Ministério do Desenvolvimento, técnicos temem que a iniciativa solo brasileira possa levar outros membros do bloco a fazer o mesmo. A Argentina, por exemplo, poderia propor acordos diretos com a China, o que seria uma grave ameaça ao agronegócio brasileiro. Uma das entidades que já revelou suas críticas à negociação isolada é a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que teme pela perda à Tarifa Externa Comum (TEC) a quem o Mercosul tem direito. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) também é outra instituição que se mostra cautelosa com a hipótese.
Com relação específica à União Europeia, as negociações de um acordo comercial se arrastam desde 1998 e praticamente não avançaram em nada desde o fracasso da Rodada de Doha em 2008. A assinatura de um acordo entre os dois blocos criaria uma área de livre comércio de 760 milhões de consumidores. Embora as trocas comerciais entre UE e Mercosul tenham alcançado € 88 bilhões no ano passado, o Mercosul ainda é o sexto maior mercado para os europeus. Com o comércio global ainda se recuperando dos impactos sofridos com a crise de 2008, o comércio entre os dois blocos encolheu 1,6% em 2015, registrando o quarto ano consecutivo de retração.
Um dos maiores entraves ao acordo tem sido justamente o forte protecionismo agrícola de alguns países europeus, como França, Irlanda e Polônia. Hoje, cerca de metade das importações da UE do Mercosul é composta de produtos agrícolas. A preocupação dos produtores é tamanha que em abril eles pediram à Comisão Europeia um estudo sobre o que aconteceria em seus mercados com a abertura aos produtos sul americanos. Essa preocupação voltou a surgir no mês passado, quando foi feita mais uma tentativa de se chegar a um acordo. A proposta dos europeus, de excluir etanol e carne em um primeiro momento, desagradou aos integrantes do Mercosul, o interrompeu de novo as negociações.