Mujica irá apresentar nos próximos dias, no complexo memorial e turístico "Andrichgrad", na República da Sérvia, Mujica irá apresentar o livro "Memorias del Calabozo", em que descreve sua biografia através da história dos "Tupamaros" — radicais de esquerda que roubavam bancos e davam dinheiro aos pobres
Ao falar com exclusividade à agência Sputnik, o ex-presidente do Uruguai iniciou a entrevista enviando uma mensagem à Rússia:
“Meu país sempre teve uma boa relação política e econômica com a Rússia. Nós gostaríamos que a Rússia tivesse contatos mais sérios com o sul da América Latina.”
Agência Sputnik: E porque agora as relações não estão tão boas? Qual é o problema?
José Mujica: Nós agora estamos muito dependentes do comércio com a China, mas nós percebemos que precisamos cooperar com outros países. E aqui colocamos a Rússia em primeiro lugar.
AS: Como podemos alcançar isso?
JM: Apenas com esforços diplomáticos muito sérios. Ao longo da história nós comercializamos ativamente com a Rússia, fornecemos muitos produtos, principalmente alimentos.
JM: Não. Após a dissolução da União Soviética nós continuamos o comércio. Na verdade a questão é que a Rússia é um país distante. Ela teria que lançar atenção sobre o Atlântico. Se a Europa fechar, a América Latina pode se abrir.
AS: Falando da Europa, você poderia comentar sobre o ‘Brexit’, a decisão do povo britânico de sair da União Europeia?
JM: Eu acho que após o ‘Brexit, se ele tiver resultados concretos, nós vamos observar um enfraquecimento da União Europeia, embora eu duvido que o Brexit realmente aconteça. Nos países europeus, está crescendo o ultranacionalismo. Eu não sou contra o nacionalismo per se, eu acho que é um sentimento natural, mas quando o nacionalismo se torna agressivo, ele cria um perigo para o mundo inteiro. Disso não sai nada de bom. São possíveis conflitos. Nós temos uma experiência muito ruim com isso, e eu não gostaria de reforçar os sentimentos ultranacionalistas na Europa. Isso, novamente, é perigoso para o mundo inteiro.
Não tenho dúvidas de que a política europeia com a Rússia tem sido desajeitada, tem sido pouco inteligente.
AS: Qual a sua opinião sobre a atual relação entre a Europa e a Rússia?
JM: Não tenho dúvidas de que a política europeia com a Rússia tem sido desajeitada, tem sido pouco inteligente. Porque mesmo De Gaulle viu a Europa em seus sonhos até aos Urais. Tinham que ter entendido as dimensões da Rússia lhe dão status de ponte para todo o resto do mundo. A Europa não deve iniciar um conflito com a Rússia, porque ao fazê-lo, obriga a defender-se. E o maior dano é feito não só na Rússia, mas também na Europa. Esta é uma grande perda para a União Europeia, e, portanto, esses conflitos são inúteis. Não tenho a certeza que para atrás de tal política da UE não existe uma mão invisível dos Estados Unidos. Isto é claro, se a Europa se enfraquecer, os Estados Unidos irão se reforçar, e isso é ruim. O principal objetivo dos Estados Unidos é reduzir o prestígio internacional da China.
AS: Finalmente, gostaríamos de saber, o que você faz agora? Há uma lenda de que é o político mais pobre do mundo.
JM: Isto são lendas. Eu sou um republicano até a morte. As repúblicas apareceram para dizer não para os reis. Não a aqueles que acreditam que há diferença no sangue. Em uma república, a decisão tem de ter a maioria. Eu tento viver como a maioria do meu povo e não a minoria privilegiada. Eu não tenho culpa se outros tomam caminhos tortos e querem usar a política para viver fantasiosamente, como os ricos. Para mim, a política não é uma profissão, é uma paixão. Eu não entrei na política para ganhar dinheiro, eu coloquei na política toda a minha vida. Então se equivocam se dizem que sou pobre eu sou pobre. Eu não sou pobre, eu vivo com o essencial.