As várias maneiras de "sair"
Existem diferentes razões que levaram ao voto no "sair". Aquelas que são mais vezes exacerbadas na comunicação social são o populismo, a xenofobia, o racismo, o atentado ao multiculturalismo representado pela União Europeia. Esses foram, realmente, os temas que tiveram mais espaço nos debates e na campanha eleitoral, bem como a manipulação de dados financeiros que colocavam o Reino Unido como um país que sairia a perder da sua integração na União Europeia.
É desta mescla de razões que o aviso à Europa se transforma em oportunidade para discutir a realidade da União Europeia e da sua ingerência constante na política e nas finanças dos Estados-membros, buscando uma nova realidade para a relação entre os povos europeus. Mas, há um pouco da imagem do que o poeta português, Alexandre O’Neill, escreveu um dia, "penso no que o medo vai ter e tenho medo, que é justamente o que o medo quer".
O discurso do medo, focado nas questões sociais, no racismo e na reação dos mercados, com novas ameaças de crise a atingir, como sempre, as classes sociais mais baixas, cria um nível de alarme que impede qualquer discussão.
Jogos de poder
Mas há mais. As políticas da União Europeia mantêm, como os próprios dados do Eurostat confirmam, um território europeu a diferentes velocidades. Mantemos realidades muito diferentes para cidadãos portugueses, búlgaros, croatas, franceses ou ingleses. A mobilidade de cidadãos no espaço europeu tem sido um poderoso instrumento de precarização laboral dos países mais ricos, porque conseguem ter mão-de-obra especializada através de poupanças na educação (são formados nos países mais pobres) e de baixas de salários (chegam dispostos a receber menos ou a trabalhar mais horas pelo mesmo preço). Enquanto essa realidade é profundamente favorável para as economias dos países mais desenvolvidos, deixam vítimas pelo caminho. Para os cidadãos ingleses, a baixa de condições de trabalho é uma realidade a que vêm assistindo ao longo dos tempos. A forma de votar neste referendo foi uma possibilidade de tentar castigar aqueles que deram origem a esta situação.
Mas os jogos de poder não ficam por aqui. A reação acelerada de Alemanha e França a exigir que o Governo do Reino Unido seguisse o resultado do referendo acionando o Artigo 50 do Tratado de Lisboa, deixa cair outro dado sobre toda esta história. A de que, afinal, há interesse dos restantes países poderosos na União de que o Reino Unido saia de cena. No mesmo dia de hoje, a Comissão Europeia volta a alimentar a ideia de que as sanções sobre Portugal e Espanha são possíveis. Em que ficamos, então? Será que o Brexit é mesmo o início do fim da União Europeia como a conhecemos ou apenas mais um episódio do aumento da espoliação dos mais pobres dentro de um quadro de integração europeia total?
Quem se foca apenas nas consequências poderá nunca vir a entender as causas.
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