Em resposta, Cristina Kirchner disse que “é uma estratégia dura contra governos nacionais e líderes políticos da região, populares e democráticos”. Segundo a ex-presidente, Brasil e Argentina estão voltando “ao passado de pobreza e mediocridade para as maiorias e de benefícios para poucos”.
Na avaliação do coordenador nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), Paulo César Santos, a carta pode ter um caráter de desabafo, mas vai muito além disso, porque o momento político vivido hoje no Brasil se repete em outros lugares do mundo.
"A gente vivencia um momento de conflito internacional, da influência dos Estados Unidos após centenas de investidas militares no século passado. A estratégia nova seria também da dimensão do judiciário, e isso está muito forte no Brasil."
Santos lembra que houve o surgimento de vários governos de esquerda no Brasil, Venezuela, Chile, Argentina, México a partir dos anos 2000 que passaram por momentos difíceis, que ao mesmo tempo trouxeram mudanças significativas, mas que tiveram também contradições internas e que acabaram por fortalecer tanto a direita quanto iniciativas contrárias às ideias dessas políticas de esquerda.
"O impacto do que acontece no Brasil repercute muito forte nos outros países da América Latina. Se o governo interino se torna governo de fato, temos o acirramento de diversas situações representam um retrocesso pior do que a ditadura militar. Se a gente recorre aos dados, eles revelam o que significaram os governos do PT com todas as contradições em relação aos governos anteriores. Teve a introdução de uma parcela significativa da população em situações de melhoria de vida, na educação, na saúde, níveis de miséria. Você tem um processo de uma certa mudança para a população pobre, mas ao mesmo tempo um alinhamento das forças conservadoras, que criaram uma capacidade de organizarem o que elas querem sem recorrer necessariamente às forças armadas."
O coordenador da CPT não poupa críticas ao comportamento adotado pela mídia tradicional no país.
"No Brasil e na América Latina toda você tem um papel fundamental da mídia tradicional que está atrelada a esses poderes. A população em geral não está atenta ao risco que estamos submetidos. Você divide o problema em dois patamares: quem é a favor ou contra o impeachment, a favor ou contra o PT, e isso cria uma cortina de fumaça em cima da realidade. Você deturpa o entendimento do que realmente está acontecendo, e a mídia está conseguindo fazer isso. Você vê isso diariamente no noticiário da Globo, da Bandeirantes, do SBT. Há um acordo de que é necessário tirar do poder a presidente Dilma e todo esse processo do PT ao longo do tempo."
Santos também teme pelo fim do live debate na sociedade após a saída de Dilma e a posse do governo Temer.
"Lamentavelmente não vai haver mais contraditório, porque eles chegaram ao poder em tese quase absoluto. É um acirramento dos conflitos nas cidades e no campo, que já está sentido por força do agronegócio e da violência, e logo a cidade vai sentir muito por conta desse desmonte de questões que dizem respeito à Previdência Social e a tantos outros assuntos que estão em pauta e que vão criar uma situação caótica no país."