Para ocupar o cargo de Prefeita, em 2012, 663 mulheres foram eleitas no Brasil, o equivalente a 11,9%. Em 2016, o índice caiu para 11,6%, apenas 639 mulheres serão prefeitas, nas 5.509 cidades onde a eleição já foi definida em primeiro turno.
Na disputa para vereadores, de acordo com os dados do TSE, o número de mulheres candidatas foi de 153.314 contra 310.062 do sexo masculino. Um dos destaque de feministas que saíram vitoriosas como vereadoras no Brasil, é a jovem, negra, cientista política, com especialização em Gênero e Igualdade pela Universidade Autônoma de Barcelona, Áurea Carolina, de 32 anos, do partido PSOL, que teve 17.420 votos, a candidata mais bem votada de Belo Horizonte, em Minas Gerais, em comparação nas últimas três eleições, levando o partido pela primeira vez à Câmara. Na capital mineira, dos 41 vereadores escolhidos, apenas três são mulheres.
Outros exemplos de mulheres que seguem a mesma ideologia de expandir a voz feminina na Política, e assim como Áurea Carolina também foram eleitas na votação de domingo (2), estão: Marielle Franco (PSOL-RJ), que é socióloga pela PUC, com mestrado em Administração Pública na UFF, mulheres negra, que nasceu e foi criada na favela da Maré, e ficou na quinta posição entre os 10 candidatos mais votados no Rio de Janeiro. Em Niterói, na região metropolitana do Rio, também foi eleita, Talíria Petrone (PSOL), que foi a vereadora mais votada da cidade. Em São Paulo, dos 55 vereadores eleitos, nove são mulheres, duas eleitas também apoiam as causas feministas: Sâmia Bonfim (PSOL) e Juliana Cardoso (PT).
Em entrevista exclusiva para a Sputnik, Áurea Carolina, aplaude a conquistas das eleitas e falou sobre a importância da entrada na Política das mulheres, especialmente negras, feministas e vindas da periferia brasileira.
"Nós nos apresentamos, porque é urgente ter pessoas como nós nos espaços de poder, para contemplar as nossas lutas, para que haja justiça social também. Não pode haver Democracia com a sub representação das mulheres, especialmente das mulheres negras. É questão também de trazer perspectiva das nossas experiências para o debate das políticas públicas. Nós que sabemos o que é violência machista, o que é o racismo. Precisamos estar lá para dizer dessas realidades."
A nova vereadora contou que sua iniciação política começou no início dos anos 2000, através da música, ao participar de um grupo de rap e um coletivo de ativistas da cultura hip hop, contribuindo para que ela conseguisse chegar até mais essa conquista em sua carreira de militante. "Essa vivência me levou a conhecer diversos movimentos sociais: os movimentos negros, juvenis, de mulheres, feministas e isso aliado a minha formação acadêmica foi fundamental para que hoje eu pudesse chegar a esse patamar de candidata a vereadora, com uma votação expressiva na cidade."
Ao lembrar de seu histórico de engajamento, no qual inclui uma passagem de cinco meses, em 2015, como subsecretária de Políticas para as Mulheres de Minas Gerais, Áurea ressalta a importância para quem exerce um cargo político, de ter um compromisso real com as lutas sociais. A vereadora lamentou a dificuldade que muitas mulheres líderes de movimentos sociais enfrentam dentro da política machista do país. "Eu tive uma passagem pela gestão governamental para discutir políticas públicas para as mulheres com uma perspectiva de gênero, de raça, orientação sexual, para que todas as áreas pudessem contemplar medidas para a inclusão das mulheres: saúde, educação, segurança pública, no entanto, eu não tive condição de desenvolver um trabalho no governo estadual e pedi exoneração e voltei para atuar nesse campo autônomo das lutas sociais. Muitas mulheres são lideranças de movimentos sociais, isso é um destaque no nosso país, mas elas não conseguem atravessar a barreira das instituições formais, esse é o passo que precisamos dar agora."
Ao falar sobre o resultado do PSOL nas eleições no país, Áurea Carolina acredita que o partido pode ser uma alternativa da esquerda ao PT, mas atenta que pelo fato do PSOL e o PT terem a mesma base história é preciso ter atenção para não cometer os mesmos erros realizados pelo Partido dos Trabalhadores, que resultaram na perda de campo político nas eleições de 2016. "O PSOL parte de uma construção história que vem das bases do PT, mas com uma proposta de radicalização da Democracia. É preciso observar quais foram as conquistas que vieram da emergência desse campo nos últimos anos, e também os erros, as negociatas, as concessões que foram feitas para não repeti-los, e o PSOL se propõe a fazer uma política muito aliada aos movimentos sociais, é por isso que eu me filiei a esse partido."
Áurea Carolina sabe que a caminhada pelo empoderamento das mulheres na política ainda tem uma longa jornada pela frente. Segundo a vereadora, as poucas mulheres que conseguiram se eleger no domingo (2), ainda não vão conseguir acabar com as estruturas viciadas do poder.
"O meu desejo é que essa participação da mulher aumente, mas os dados da eleição de domingo demostram que a presença das mulheres ainda é ínfima nos espaços de poder. Nós precisamos avançar muito. É preciso que haja mais mulher, pessoas negras, indígenas, LGBTs, que a população que é a maioria entre para valer nas instituições. Temos que discutir o machismo, que tem repercussão nessa realidade de pouca presença das mulheres na política formal. Tem um trabalho grande pela frente."
Como uma de suas primeiras propostas como vereadora eleita, Áurea Cristina fala de um projeto que deve dar o que falar em Belo Horizonte, que será de pegar parte do próprio salário de vereador, que na região é em torno de R$ 15 mil e direcionar para projetos sociais. "Pretendemos construir um mandato coletivo, aberto, com a participação das lutas da cidade. E eu tenho uma proposta de reverter parte do meu salário para iniciativas sociais, e apresentar um projeto de lei se possível, vou estudar como pode ser feito isso dentro da Câmara, para a redução de salários de vereadores. Hoje um vereador em Belo Horizonte recebe um salário em torno de R$ 15 mil, o que na minha opinão é uma afronta a maioria da população, que trabalha muito e recebe baixos salários. A política não pode ser uma profissão para enriquecer. A Política tem que ser uma profissão de cidadania, um trabalho comprometido com todos. Esse é um dos pontos que eu vou abordar logo no início do mandato."