Uma das entidades mais atuantes nessas cobranças tem sido o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), entidade social sem fins lucrativos criada em 1989 e que se encontra presente em 17 estados, assessorando comunidades atingidas por falha dessas estruturas em todas as regiões do país.
Letícia Oliveira, coordenadora do MAB em Minas, e residente em Mariana desde o dia seguinte ao rompimento da barragem, conversou com a Sputnik e conta as ações que estão sendo realizadas, como a marcha que saiu de Regência (ES) em 30 de outubro e percorreu oito municípios no estado e em Minas Gerais até chegar a Mariana, onde realiza um encontro neste sábado para debater o acidente que atingiu as comunidades. Participam da marcha representantes das famílias e aldeias atingidas, setores da Igreja Católica, movimento de trabalhadores e estudantes.
"O MAB surgiu para dar apoio a centenas de comunidades que vêm sofrendo com as consequências da construção de barragens pelo Brasil desde a década de 70, em boa parte devido à formação de grandes reservatórios decorrentes da construção de hidrelétricas, principalmente nas regiões Sudeste, Nordeste e Norte. São cerca de 1 milhão de pessoas que vivem nos entornos desses empreendimentos e que podem ser diretamente atingidas em caso de acidente."
Letícia explica que há três tipos de barragens: a dos reservatórios das hidrelétricas, as de abastecimento e irrigação, principalmente no semiário nordestino, e as de refugo de minério, como é o caso da de Mariana. No caso específico do acidente em Minas, a coordenadora do MAB diz que a entidade está realizando diversos debates pelo país sobre as consequências e os impactos desses acidentes e reivindicando direitos das populações atingidas que normalmente costumam ser violados.
Indagada sobre as primeiras impressões que teve ao ver a devastação em Bento Rodrigues, o primeiro distrito em Minas a receber o impacto da tsunami de lama proveniente da barragem de Fundão, Letícia é concisa:
"Não sobrou nada. Em uma quadra, apenas as ruínas de algumas casas. Bento Rodrigues não tem água, luz, houve muito saque nos dias seguintes ao desastre. O município sumiu do mapa. Em Paracatu de Baixo, vizinho a Bento, só sobraram 30 casas."
Não só o MAB vem acompanhando os trabalhos de assistência. A advogada Raphaela Lopes, da ONG Justiça Global, também vem monitorando a situação dos atingidos pelo desastre ambiental, cobrando ações de empresas e do governo. Segundo Raphaela, a tragédia em Mariana é reflexo de um problema estrutural da mineração no Brasil e no mundo.
"A gente olha para o rompimento como o extremo das violações que a mineração causa todos os dias em vários territórios no Brasil e no mundo inteiro. Somos uma das organizações que fundou a Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale, ou seja acompanhamos há algum tempo as violações cometidas pela empresa."
Nos casos como o de Mariana e de mineração em geral, fica bem claro, segundo ela, o interesse do Estado nesses empreendimentos. Para Raphaela, o Estado muitas vezes investe recursos nesses empreendimentos de mineração, é um grande interessado no sucesso do empreendimento.
"Isso faz com que ele acabe sendo um pouco negligente em relação ao apoio às vitimas e à fiscalização. É algo que a gente vem apontando com preocupação no cenário da mineração como um todo."
Segundo a advogada da ONG Justiça Global, no caso de Mariana, se viu um esforço do Estado de deixar isso passar.
"A grande manifestação disso é o acordo entre a União, os governos de Minas Gerais e de Espírito Santo e as empresas Samarco, Vale e BHP. Um acordo imoral, pois foi elaborado sem participação dos atingidos, as empresas não assumem responsabilidade pelo acontecido, somente se comprometem a reparar os atingidos. A empresa faz o cadastro dos atingidos. A fundação, criada pelas empresas, decide quem é classificado como atingido e quem não. É como pedir ao lobo para cuidar do galinheiro."