Relações russo-americanas: crises e resets depois da Guerra Fria

© AFP 2023 / DON EMMERTEx-presidentes da Rússia e dos EUA, Boris Yeltsin e Bill Clinton, durante a entrevista coletiva em Nova York, EUA, 23 de outubro de 1995
Ex-presidentes da Rússia e dos EUA, Boris Yeltsin e Bill Clinton, durante a entrevista coletiva em Nova York, EUA, 23 de outubro de 1995 - Sputnik Brasil
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O fim da Guerra Fria não significou o fim das tensões nas relações russo-americanas, mas este período, que é considerado uma parte negra na história, determinou o caráter cíclico das relações bilaterais.

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Depois do fim da Guerra Fria o mundo estava eufórico em relação ao seu futuro. A comunidade internacional tinha esperanças de que o mundo não enfrentaria mais guerras com o desaparecimento de um dos dois centros do sistema antagonista. Entretanto, estas esperanças não se tornaram realidade. As tensões nas relações entre a Rússia, que substituiu a União Soviética, e os EUA começaram se agravando de novo. O novo período das relações herdou o caráter cíclico da Guerra Fria. As relações russo-americanas foram e são caraterizadas por crises que alternam com períodos de melhoria de relações. Hoje a mídia diz ininterruptamente que o governo de Trump iniciará uma nova etapa nas relações russo-americanas que será completamente diferente do período anterior. A Sputnik explica porque estas esperanças podem não se justificar parcialmente e revê os episódios mais marcantes nas relações bilaterais russo-americanas nos últimos 25 anos.

Da Guerra Fria à paz fria

No início dos anos de 1990, a Rússia ocupou o lugar da antiga URSS e começou desenvolvendo suas relações com os EUA. Em junho de 1992, o presidente russo Boris Yeltsin visitou Washington e se encontrou com o presidente dos EUA George H. W. Bush. As partes acordaram desenvolver as relações econômicas e a Rússia recebeu uma ajuda financeira de 4,5 bilhões de dólares. Em 1993, os dois presidentes assinaram o Tratado de Redução de Armas Nucleares (START II). Entretanto, já em 1994, Yeltsin disse que a Guerra Fria foi substituída pela "paz fria". As declarações assinadas pelas partes não foram realizadas na prática, a Rússia não aceitou as concepções norte-americanas sobre sua liderança no mundo e apresentou a concepção de um mundo multipolar. Além disso, a situação na Chechênia, onde a Rússia lutava contra terroristas, foi considerada pelos EUA como inaceitável porque, na opinião deles, eram os separatistas que tinham direito à autodeterminação. O que contribuiu para tensões entre Moscou e Washington foi a expansão da OTAN ao leste (a Aliança integrou a República Tcheca, Polônia e Hungria) e a campanha militar da Aliança na Iugoslávia em 1999. A Rússia, superando os problemas que surgiam após o colapso da União Soviética e se adaptando à nova realidade, começou entretanto se manifestando cada vez mais como país que pode realizar uma política independente.

Da luta contra terrorismo à crise na Ossétia do Sul

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O novo período de bom nível nas relações entre os dois países começou em 2001 depois dos atentados de 11 de setembro, quando a administração de George W. Bush criou uma coalizão contra o terrorismo. A Rússia se manifestou disponível para se juntar à coalizão e ajudar na luta internacional contra terrorismo. O primeiro sinal da crise iminente foi dado em 2002, quando os EUA se retiraram do Tratado de Redução de Sistemas de Defesa Antimíssil (DAM). A situação se agravou em 2003, quando os EUA e a Rússia não acordaram sobre a racionalidade da campanha militar americana no Iraque, que acabou com a queda do regime de Saddam Hussein. A Rússia estava contra a política de mudança de regimes inconvenientes. As atividades seguintes da OTAN no leste da Europa, a sua expansão para ficar mais perto da fronteira russa em 2004 e 2009 (países como a Bulgária, Eslováquia, Eslovênia, Estônia, Letônia, Lituânia, Romênia, e depois a Albânia e Croácia entraram na Aliança) e a independência do Kosovo em 2008, apoiada pelos EUA, contribuíram para a nova crise nas relações bilaterais. Ficou claro que a retirada do Tratado de DAM foi realizada com o objetivo de criar um sistema de defesa antimíssil na Europa. O ponto mais baixo nas relações surgiu em agosto de 2008, quando a Rússia respondeu à agressão da Geórgia na Ossétia do Sul com entrada das suas tropas no território do país e subsequentes ações para proteger os cidadãos russos.

Do 'reset' a um impasse na Síria

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A herança da política externa de Bush (situações difíceis no Afeganistão e Iraque) e as consequências da crise financeira exigiram que os EUA mudassem sua linha. O presidente norte-americano Barack Obama, em conjunto com o presidente russo Dmitry Medvedev, iniciaram uma reset nas relações norte-americanas, cujo resultado principal pode ser considerado o novo tratado na área de redução de armas nucleares assinado em 8 de abril de 2010 em Praga. A Rússia se manifestou pronta para se juntar à luta contra o terrorismo. O país permitiu mesmo às forças da coalizão de usarem seu espaço aéreo para deslocar cargas necessárias para o combate no Afeganistão e deu acesso à base na cidade de Ulyanovsk para transportar cargas não letais. Também se aproximaram as posições das partes em relação ao programa nuclear iraniano. Entretanto, os EUA não desistiram de continuar sua política de envolver países como Geórgia e Ucrânia na sua área de influência, o que supostamente levou a um golpe de Estado na Ucrânia em 2014, a confrontos em Donbass e à reunificação da Crimeia com a Rússia. É o ponto mais baixo nas relações no ciclo de 2010-2016. Além disso, os EUA e a Rússia se mostraram mutuamente hostis por causa da crise na Síria, onde Moscou apoia o governo do presidente Bashar Assad e Washington não o considera como legítimo, apoiando a oposição 'moderada' síria que, de acordo com a Rússia, inclui elementos terroristas. Os EUA, se justificando com a alegada interferência da Rússia nos assuntos internos da Ucrânia, introduziram um grande pacote de sanções contra pessoas, empresas e setores econômicos da Rússia e a última respondeu com as mesmas medidas. Algumas tentativas de reanimar o diálogo foram feitas na última etapa da crise na Síria, mas recentemente o mundo viu uma reviravolta na política norte-americana, porque de súbito os EUA se recusaram a cooperar com a Rússia e terminar esse caminho até uma resolução da crise.

Agora todos esperam que a nova administração norte-americana permita um novo reset nas relações bilaterais. Há que notar que é bastante provável que um novo reset tenha realmente lugar, mas depois de algum tempo os dois países enfrentarão mais tensões porque há divergências sistemáticas que não podem ser ultrapassadas apenas graças a algumas mudanças da linha política sob novos governos.

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