A 23 de Maio tinha 15 mil metros quadrados de paredes pintadas com grafite e era considerada a maior galeria a céu aberto da América Latina. Em contrapartida, Dória anunciou que a avenida terá oito espaços para grafiteiros e que não mais serão toleradas pichações em outros locais. Em 2015, um projeto de lei na Câmara dos Deputados abrandou a punição para quem pichar edifícios e monumentos urbanos. Em lugar de prisão, a pena passou a ser a prestação de serviços comunitários pelo máximo de cinco meses.
Para entender essa cruzada defendida pelo prefeito de São Paulo, a Sputnik Brasil conversou com Binho Ribeiro, um dos mais consagrados nomes na arte de rua no Brasil e no exterior, com trabalhos espalhados em cidades como Los Angeles, Paris, Pequim, Amsterdã, entre outros. Binho — criador e curador da Bienal de Grafite que acontece em São Paulo, a de 2017 está programada para o final do ano — diz que a questão vai muito além de apagar pichações ou determinar espaços para essas manifestações na cidade.
"O tema é bastante difícil e você tem sempre opiniões diferenciadas. Na minha opinião, com 30 anos de experiência envolvidos na arte urbana, o que acontece é a proposta. A pessoa que faz uma pichação tem uma proposta contra a sociedade, o sistema. A proposta é espalhar a marca dela. Já quando você fala com alguém que se propõe a fazer arte, um mural, seja ele legal ou ilegal, o artista tem outra proposta e cada um tem a sua. Não é simplesmente a estética do belo, feio, legal ou ilegal, mas o que a pessoa quer, e o poder público pode até definir o que serve para cidade e o que não serve", diz o artista.
Segundo Binho, no caso da 23 de Maio, o que se percebe é uma falta de diálogo e de respeito em cima de artistas e de uma arte tão reconhecida mundo afora.
"O que está acontecendo aqui tem uma repercussão internacional enorme, porque demonstra que o prefeito não teve o mínimo de educação ou de humildade para convocar esses artistas e entender os processos pelos quais a arte urbana habita a cidade."
O artista considera normal em qualquer nova administração obras serem apagadas e a cidade restaurada.
"O que não é comum é o desrespeito com o trabalho que executamos há tanto tempo e com o volume de jovens que influenciamos e trabalhamos tanto pra trazê-los ao universo da arte. Aí tudo isso vai abaixo quando esses jovens começam a desenvolver ódio pelo sistema público, pela prefeitura. Esse preconceito que a sociedade estimula traz danos muito grandes. É muito difícil falar para um jovem hoje que ele pode pegar o caminho da arte e construir a cidade", diz Binho.
O grafiteiro lembra que em Nova York há centenas de projetos nas periferias que atendem a esses artistas emergentes.
"Quando você cria esses projetos e abre espaço para outros grandes projetos, tudo se encaixa melhor. Esse ponto nós perdemos quando a educação artística nas escolas é tratada como terapia ocupacional. Ali é o momento certo de você fazer as pessoas e as crianças entenderem o amor pela cidade, de fazer com que elas desabafem e demonstrem que elas têm a arte como uma grande terapia. Aí você pode ter tanto uma legião de pessoas muito boas e interessadas no resgate da cidade quanto pode ter uma legião de destruidores da cidade", reflete Binho.