Em entrevista à Sputnik Mundo, no Pyongyang Café de Tarragona, na Espanha, Benós contou como é a vida do povo de um dos países mais herméticos do planeta.
Sputnik: Por que alguém deveria fazer turismo na Coreia do Norte?
S: Um turista pode andar lá sozinho?
ACdB: Não, não é possível. Para turistas existe uma normativa do Governo de que uma pessoa tem que andar acompanhada. Normalmente é acompanhada por dois guias que precisam se revezar, preencher as autorizações e estar com a pessoa 24 horas por dia. Inclusive ficam alojados no mesmo hotel onde se hospeda. Mas quando se trata de visitas não turísticas, quando uma pessoa tem a confiança do nosso Governo, não precisa de guias e pode se movimentar com tranquilidade, passear por onde quiser… mas para isso é preciso haver um nível de confiança que não se aplica a nível turístico porque é um sistema aberto e qualquer um pode ir como turista à Coreia.
S: E o que faz um turista na Coreia do Norte?
ACdB: A partir das 07h00 da manhã até às 20h00 o turista tem um roteiro bastante apertado todos os dias. Como regra, a maioria das pessoas quer aproveitar o tempo ao máximo. Visitará os monumentos da capital mais importantes, as estátuas de bronze, a colina Mansu [com os monumentos de bronze dos líderes do país], a Torre Juche, o maior arco de triunfo no mundo, provavelmente visitará o Palácio das Crianças, onde crianças farão uma apresentação da cultura tradicional, e quase certamente, em quase todos os roteiros, vai viajar 200 quilômetros para sul até a fronteira com a Coreia do Sul, para visitar Panmunjom, a zona desmilitarizada, e conhecer como é a divisão atual da Coreia fomentada pelos EUA. Esta visita é fascinante, num lugar de alta tensão, onde cara a cara estão marines norte-americanos e é uma visita obrigatória. Se uma pessoa tem um pouco mais de tempo, especialmente no verão, se preparam voos para o Baektu, o monte mais alto da Coreia, que é um vulcão em repouso com maravilhosos panoramas naturais.
S: O viajante, quando regressa, muda suas impressões sobre a Coreia do Norte?
ACdB: Sim, em 98-99% dos casos muda completamente. As pessoas costumam ir com medo ao país devido ao sensacionalismo de muitos meios de comunicação, à manipulação da mídia e de alguns governos… então quando veem com seus próprios olhos a realidade, veem que não há pessoas pedindo esmola nas ruas ou procurando no lixo, que ninguém vive em caixas automáticas, ficam surpreendidos de que no país todo o mundo tenha o necessário e as pessoas sejam felizes, é a primeira coisa que os impressiona. Há um caso recente, de Richi González Ávila, treinador de basquete espanhol, que esteve durante um certo tempo na Coreia do Norte e que deseja voltar, e uma das coisas que o surpreende é que certos países do primeiro mundo, os mais avançados, têm grande número de pessoas vivendo em condições miseráveis e sem teto, enquanto, na Coreia do Norte, as pessoas não vivem com grande luxo, mas têm o necessário para viver.
S: É permitido usar redes sociais durante a visita?
ACdB: Claro, para isso os turistas podem comprar cartões que possibilitam acesso à Internet para seus celulares. <…> Este tipo de conexões sai bastante caro, mas é possível.
S: O que agrada mais aos turistas?
ACdB: Normalmente, eles costumam realizar uma visita à zona desmilitarizada, porque o tema dos monumentos impressiona, mas afinal são construções. Contudo, visitar Panmunjom e ver a tragédia da divisão coreana, ver a Guerra Fria que tem continuado desde os anos 50, é muito impactante porque parece que não pode ser assim, que um país onde uma só nação, entre irmãos, está dividida e que há uma situação de guerra constante, de possibilidade de um conflito real porque, de fato, a guerra não terminou. Essa situação de tensão e ver cara a cara os soldados do Exército Popular frente aos marines norte-americanos, provavelmente, é o que mais impressiona todos os visitantes.
S: E do ponto de vista burocrático, que passos tem que fazer para viajar à Coreia do Norte?
ACdB: Basicamente, tem que solicitar isso com um mês de antecedência, está aberto a todas as nacionalidades, exceto a passaportes sul-coreanos e passaportes japoneses, os japoneses sim podem visitar a Coreia do Norte, mas através de outro canal, a Associação de Coreanos Residentes no Japão. Os coreanos do Sul não podem visitar o país porque estamos oficialmente em conflito, não há relações. Além disso, para um sul-coreano é completamente proibido visitar a Coreia do Norte por parte do seu próprio governo. Apesar disso, inclusive pessoas de países com os quais não temos relações diplomáticas, como Israel e EUA, podem visitar tranquilamente a Coreia simplesmente avisando com um mês de antecedência, apresentando o passaporte, duas fotos, um pequeno currículo que especifica a morada, e-mail e dados pessoais e indicando o que querem visitar para se ir preparando o roteiro e o programa de viagem. É um processo muito, muito simples, que praticamente todas as solicitações são aprovadas.
S: E quanto custa uma viagem turística à Coreia do Norte?
ACdB: Depende muito do número de pessoas que pretendem fazer a mesma viagem. Por exemplo, se uma pessoa faz uma viagem individual de uma semana, como vai pagar transporte, motorista, dois guias, tradutores, taxas turísticas… tem que pagar tudo (…) o custo poderá ser em torno de 2.800-3.000 euros, em hotéis de quatro estrelas, com tudo incluído. Além disso, há o voo de Air Koryo [companhia aérea oficial da Coreia do Norte] de Pequim a Pyongyang, que é um voo de 1h45 minutos e que custa 550 euros. O preço pode ser rebaixado até 1.300-1.400 euros dependendo do volume de turistas em um grupo. Por exemplo, a partir de 15 pessoas já são fretados ônibus e se dividem todas as despesas entre os visitantes.
S: O que os turistas na Coreia do Norte não podem fazer?
ACdB: Não podem andar sozinhos sem avisar o guia, se este não os autoriza e se eles não estiverem acompanhados, não podem sair do hotel – de qualquer maneira, também não há muito tempo livre, a agenda é muito intensa. Não podem tirar fotos de instalações militares e pessoal militar sem autorização. Isso não significa que se uma pessoa está em um parque e haja um militar com seu uniforme e a sua família não se possa tirar uma foto com eles ou inclusive pedir-lhes para tirar uma foto privada, mas geralmente, e sobretudo nos postos de controle militares, não é permitido tirar fotos. E também conservar o respeito em relação ao país, em relação aos nossos líderes e nosso governo e, basicamente, não levar elementos de propaganda em massa. O que significa isso? Há pessoas que creem ou que sejam iluminadas por Deus, ou que vêm [à Coreia do Norte] para tentar praticar proselitismo da sua própria religião e trazem mil bíblias ou mil panfletos para fazer propaganda… isso não é permitido. O turista pode trazer a literatura que queira, mas para seu uso pessoal durante a visita, e estas são basicamente as restrições que existem. Quanto ao resto, não tem nada de especial.
S: Quais são os souvenires prediletos dos turistas?
ACdB: Geralmente são os postais, com pôsteres de propaganda política que surpreendem muito as pessoas. Também há camisetas com a bandeira do país, alguns selos… e sobretudo insígnias com a bandeira nacional que costumam ser o produto favorito dos turistas.
S: E quais são os indicadores de turismo da Coreia do Norte?
ACdB: Atualmente temos cerca de 50.000 visitantes por ano na Coreia, dos quais uns 5.000, uns 10%, não são chineses. Ou seja, a maioria absoluta de visitantes são chineses, porque temos em conta o turismo que passa pela própria fronteira… é muito fácil visitar a Coria do Norte, eles podem fazer visitas de dois dias, mas estão restringidos a uma zona fronteiriça entre ambos os países. O resto, os visitantes ocidentais, pode fazer visitas de uma semana a dez dias, ou inclusive de um mês… costumam ser muito mais extensas. E destes 5.000 a maioria são europeus, seguidos de canadenses e australianos, e depois os norte-americanos.
S: Não tem nada a ver com Barcelona…
ACdB: Não, absolutamente nada, de qualquer maneira, nunca permitiríamos ao nosso governo que houvesse este turismo em massa que não permite aos próprios habitantes de Barcelona viverem na cidade.