Em 11 de março, o voo 993 da companhia aérea LAN efetuou uma viagem às Malvinas a partir da cidade argentina de Río Gallegos. A bordo seguiam homens silenciosos. É muito fácil detectar entre os passageiros aqueles que já lá estiveram, mas em condições muito diferentes. Nos rostos dos outros, ou seja, dos turistas, não se pode observar o mesmo — eles não têm memórias capazes de alterar seus traços faciais. Aqui estão sentados os soldados que regressam ao campo de batalha para participar de outro combate em busca de paz.
Quando Armando tinha 20 anos de idade, ele participou do conflito armado nas Malvinas e serviu no 6º regimento de infantaria do povoado Mercedes, na província de Buenos Aeres.
Porém, desta vez ele não veio só, mas acompanhado pelo filho Martín (36) que reconhece: para seus pais as Malvinas são algo de "muito doloroso".
"Eu tenho muito orgulho do meu pai. Não é fácil sobreviver a tudo que passou. Agora eu tenho uma consciência melhor daquilo que ele teve que viver. A guerra acabou, mas sua vida não. Sempre houve obstáculos", explicou.
A caminho de um dos lugares onde combateu, Armando afirma nunca ter imaginado que ele, como soldado, participasse da "última grande batalha entre cavalheiros".
"Foi a última guerra entre países. Hoje em dia, os países lutam contra terroristas. É aquilo que nos torna diferentes dos outros militares contemporâneos", afirmou. "Eu não estou zangado nem com os militares argentinos, nem com os britânicos. Se eu desisti em algum momento, foi uma decisão minha. Nunca quis perder este sentimento de pertença", adiantou.
Planejava-se que Armando fosse desmobilizado do exército argentino por lesões que adquiriu na sequência de queimaduras pelo frio e lesões dos ouvidos devido ao ruído de explosões.
"Mas foi isso que me disse o médico que me tratava no hospital já depois das Malvinas: ‘Você já cumpriu seu dever. Não vale um soldado como você continuar sofrendo. Creia que já cumpriu sua missão", contou.
O entrevistado também relembrou um episódio comovente que aconteceu durante o voo de Río Gallegos. Os veteranos de ambos os lados, esquecendo sua nacionalidade, se abraçaram uns aos outros e choraram.
"Eles viveram os mesmos horrores da guerra que nós. No conflito houve um vencedor, mas na verdade todos perderam. Sofremos pelas mesmas razões. O resultado de tudo isso é que um conflito armado em qualquer parte do mundo não traz nada [de bom]", disse.
A guerra, que se iniciou com o desembarque dos argentinos em 2 de abril de 1982, terminou em 14 de junho com sua capitulação. Foram 649 os argentinos e 225 os britânicos que morreram no conflito, segundo afirma o governo do Reino Unido. As ilhas têm estado ocupadas pelo Reino Unido desde 1833, e ao longo de todo este período a Argentina tem exigido o cumprimento dos seus direitos de soberania sobre o respectivo território.
À medida que eles se aproximavam do lugar que Armando queria mostrar para seu filho, o ex-soldado se tornava cada vez mais disposto a falar. Ele contou sobre a guerra e como ela é para um jovem de 20 anos. De repente, ele levantou as mãos e disse que aquele era o lugar. O lugar onde deveria ter morrido.
"Aquele avião lançou uma bomba e projétil de metralha contra nós. Eu não vi isso. De repente, tudo parou: o ruído, o vento, tudo. Silêncio absoluto. Eu perguntei a um soldado: ‘Você tá entendendo que se passa algo estranho? Não há ruído, deve acontecer algo ruim", partilhou ele, se recordando dos dias tenebrosos da guerra.
De repente, se ouviu um estrondo e eles foram projetados vários metros. Ao voltar a si, ensurdecidos, eles olharam para trás e viram que os estilhaços como que lavraram a terra pelo meio dos cadáveres. "O projétil nos evitou. Esta deveria ser a nossa sepultura", contou.