A questão teve início em 1997, quando o criminalista Fernando Fernandes solicitou ao Tribunal Militar registros sonoros para um estudo. O pedido foi negado, sob o argumento de que as gravações não integram os processos e são de uso interno do tribunal.
Diante da sucessão de negativas, o advogado Fernando Fernandes recorreu ao Supremo Tribunal Federal além de obter o apoio do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.
Em 2006, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal liberou ao advogado o acesso a estes documentos por entender que a Constituição Federal só permite a restrição da publicidade dos atos processuais quando houver a necessidade de defesa da intimidade e da pessoa ou no interesse da sociedade e do Estado, o que não seria o caso dos autos.
Mas o Superior Tribunal Militar concedeu acesso restrito ao advogado, o que foi agora considerado pelo plenário do STF como descumprimento de decisão judicial.
Para o advogado Cláudio Pinho, Professor de Direito Constitucional da Fundação Dom Cabral, no Rio de Janeiro, e Secretário-Executivo da Comissão de Direito Constitucional da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Estado do Rio de Janeiro, a situação formada em torno desta questão exige uma explicação histórica, factual e jurídica:
"Desde 2011, quando foi promulgada a Lei de Acesso à Informação, de número 12.527, houve uma mudança significativa de paradigma. Por quê? Porque as informações são tratadas em dois níveis. Um nível é o da informação oficial e pública, e o outro nível é o da informação que, eventualmente, não é oficial e nem é pública. Em 1988, quando entrou em vigor a atual Constituição Federal, criou-se o instituto do Habeas Data (Tenha os Dados). Este instituto permite que a pessoa possa obter informações além daquelas normalmente fornecidas por meio de certidões. A grande verdade é que o instituto do Habeas Data não foi efetivamente utilizado e caiu em desuso. Houve necessidade então, juridicamente, de regulamentar a matéria, o que resultou na edição da Lei 12.527, a Lei de Acesso à Informação."
Ao anunciar a decisão do Plenário do STF, na sessão desta quinta-feira, a Ministra Cármen Lúcia, Presidente do Supremo Tribunal Federal, declarou:
"Tem-se como injustificável juridicamente a resistência que o Superior Tribunal Militar tentou opor ao cumprimento da decisão emanada deste Supremo Federal Tribunal que, taxativamente, afastou os obstáculos erigidos para impedir que fossem trazidos a lume a integralidade dos atos processuais ali praticados, seja na dimensão oral ou escrita, cujo conhecimento cidadãos brasileiros requereram para fins de pesquisa histórica e resguardo da memória nacional."
A ministra disse ainda que o STM deve permitir o acesso do reclamante aos documentos requeridos, mas fez ressalva para materiais "indispensáveis ao resguardo do interesse à defesa da intimidade" e aqueles cujo sigilo seja necessário para proteção da sociedade e do Estado, desde que motivado de forma explicita e pormenorizada.