Após muita discussão e acordos, o relatório do senador Roberto Requião só foi aprovado após ele alterar os artigos mais polêmicos. O artigo 1º, que dizia que a divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas, necessariamente razoável e fundamentada, não configura, por si só, abuso de autoridade.
Atendendo a pedidos, Requião então suprimiu a expressão "necessariamente razoável e fundamentada", sob alegação de que é algo subjetivo e que abriria brecha para a criminalização da interpretação da Lei.
Para o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), a expressão ato "razoável e fundamentado", como estava no relatório, colocava em risco todo o projeto.
"A manutenção do crime de hermenêutica, de interpretação torna projeto inviável. É absolutamente subjetivo estabelecer o que seria considerado uma divergência razoável. Da forma como o projeto está, um agente da Justiça poderá ser condenado exclusivamente por suas decisões."
Somente após várias críticas e apelos, o senador Roberto Requião concordou em mudar o seu parecer para que não houvesse mais dúvidas sobre a autonomia de julgamento de magistrados. "O termo "necessariamente razoável" foi introduzido por uma sugestão do senador Anastasia, e o "fundamentado" foi uma sugestão do procurador Rodrigo Janot. Eu manteria, mas o projeto não é o projeto do senador Roberto Requião, tem que ser o projeto do Senado da República. No fundo, o princípio da razoabilidade faz parte da interpretação do Direito brasileiro, ele não será afastado. E a fundamentação é uma exigência do próprio Direito. Só havia uma reiteração aqui."
Outro artigo que gerava muita polêmica e o senador Requião decidiu mudar foi o artigo 3º, que possibilitava que qualquer pessoa entrasse diretamente com uma ação penal contra juízes e promotores. Requião aceitou a sugestão do procurador Geral da República, Rodrigo Janot e decidiu que só caberá ação penal privada se o Ministério Público não propuser ação pública no prazo legal de seis meses. Caso o MP não entre com a ação, a pessoa poderá entrar com a ação contra juízes ou promotores.
Durante a sessão na Comissão de Constituição e Justiça, o senador Renan Calheiros ressaltou que todo o processo de discussão da proposta foi marcada por muita pressão, criticando que o debate da proposta num tom negativo foi incentivado pela mídia.
"Essa lei de abuso de autoridade, foi ela por exemplo que favoreceu Carandiru, vazamentos sigilosos, baculejos injustificados nas periferias, escutas ilegais. E deixando claro que que ninguém de bom senso nesse país quer punir juiz por interpretação equivocada da lei, por crime de hermenêutica."
O projeto de abuso de autoridade conta com mais de 30 ações que podem ser criminalizadas. Entre elas estão, práticas com decretar a condução coercitiva de testemunha ou investigado sem prévia intimação ao juízo; fotografar ou filmar preso sem seu consentimento ou com o intuito de expô-lo a vexame; colocar algemas no detido quando não houver resistência à prisão e pedir vista de processo para atrasar o julgamento. O projeto prevê também a famosa carteirada, sendo crime se utilizar do cargo ou função pública ou invocar a condição de agente público para se eximir de obrigação legal ou para obter vantagem ou privilégio indevido.
Quanto as punições. Em caso de condenação por crime de abuso de autoridade a proposta prevê o pagamento de indenização, além de ser inabilitado para o exercício do cargo por um a cinco anos e perda do cargo, em caso de haver reincidência.
Após aprovação na CCJ, o texto segue para o Plenário em regime de urgência e pode ser votado ainda nessa quarta-feira(26).
O senador Requião ainda incluiu na proposta um prazo para entrada em vigor, de quatro meses depois da sanção. Depois da aprovação no Senado, ela segue para a Câmara dos Deputados.