Em 2013 foi aprovada no Uruguai a Lei de Regulação da Cannabis, que permite três mecanismos para obtenção da droga de forma legal: o cultivo doméstico, o cultivo cooperativo em clubes, e a venda de maconha em drogarias e farmácias por particulares, desde que controlada pelo Estado.
Para o advogado criminalista Marcelo de Carvalho, professor de Direito Penal da Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense, o Uruguai dá um passo adiante ao permitir a venda pública da Cannabis desde que acompanhada pelo Estado. Ele fala com exclusividade à Sputnik Brasil:
"A questão da legalização da maconha comporta uma série de programas, mas, em dizeres breves, eu sou favorável à legalização do comércio da maconha assim como é hoje [legalizado] o comércio de uma série de drogas, a principal delas, a bebida [alcoólica]."
O Professor Marcelo de Carvalho considera que a venda legalizada da maconha vai transformar uma questão de Segurança Pública em questão de Saúde Pública. "Tenho absoluta convicção de que ninguém, rigorosamente ninguém, deixa de comprar a maconha porque ela é tida como droga clandestina. E, se ela vier a ser legalizada no Brasil, aquele que não a consome por opção iria passar a consumir só porque ela é legalizada. Isso é falácia pura. A clandestinidade gera um mercado extremamente lucrativo e que, para se sustentar, tem que investir em aparatos de violência, que contribui muito para esta tragédia urbana que nós vivemos."
Diante da nova realidade vivida pelo Uruguai, a questão é: a legalização da maconha afetaria significativamente o tráfico, para mais ou para menos?
"Evidentemente que, havendo a legalização da maconha, afetaria o tráfico para menos, da mesma forma como não faria cessar o tráfico de drogas", diz Marcelo de Carvalho. "Existe hoje o tráfico de uma série de substâncias vendidas licitamente, mas que também têm seu mercado negro. Não tenho, absolutamente, a ilusão de achar que, legalizando a venda e o consumo de maconha, o tráfico iria cessar. Não iria. Mas, com certeza, sofreria um baque bastante grande. E aí, num exercício de futurologia, a gente poderia imaginar que o eixo da atividade criminosa para esse tipo de mercado, que se sustenta com a prática criminosa, iria mudar. A questão é como enfrentar esse impacto. O importante é deixar claro que os problemas de violência e criminalidade urbana brasileiros têm outros pontos que não só o tráfico de drogas. O tráfico de drogas deu, digamos assim, requinte à tragédia urbana que vivemos, em que morrem criminosos mas também morrem policiais e cidadãos de bem."
O advogado criminalista responde ainda à questão da dúvida se brasileiros que vivem na fronteira aberta do Estado do Rio Grande do Sul com o Uruguai poderiam se cadastrar para comprar maconha em cidades uruguaias. E se, ao voltar ao Brasil portando a droga, poderiam ser penalmente indiciados como criminosos e infratores. Marcelo de Carvalho responde:
"A legalização para compra da maconha é no Uruguai. Se os brasileiros vão até lá para comprar a droga, ao voltar para o Brasil eles poderiam estar incorrendo no crime de tráfico internacional de drogas. Então, não há essa possibilidade [entrada livre no Brasil com a droga eventualmente adquirida em farmácia do Uruguai]. Se houver a previsão legal para que estrangeiros comprem a droga no Uruguai, eles poderão fazê-lo. O que estes brasileiros não poderão fazer é entrar no Brasil com a droga cuja posse e transporte são considerados ilícitos. Se a maconha for comprada no Uruguai, com a devida autorização, ela terá de ser consumida naquele país. Caso a droga seja trazida para o Brasil, seus portadores poderão ser enquadrados no Artigo 33 da Lei 11.343 como importadores de drogas. Mesmo que aleguem ser para consumo próprio, estarão sujeitos a penas restritivas de direitos já que desde 2006 não há mais restrição de liberdade para quem porta pequena quantidade de drogas."