Ayala falou com exclusividade à Sputnik Brasil, direto do Pará, onde participou nesta sexta-feira, 26, do velório coletivo dos 10 trabalhadores rurais mortos pela polícia na última quarta-feira, durante reintegração de posse da Fazenda Santa Helena, no município de Pau D´Arco, no sudeste do estado. A repercussão da chacina — testemunhas afirmam que a polícia chegou disparando indiscriminadamente — levou o governo a enviar uma força-tarefa composta pela Procuradoria dos Direitos do Cidadão e do Conselho Nacional dos Direitos Humanos, além da Defensoria Pública. A Secretaria de Segurança, por sua vez, informa que apreendeu no local armamentos pesados.
Esse novo episódio de violência só perde para outro célebre no Pará, o Massacre de Eldorado dos Carajás, em 17 de abril de 1996, quando 19 trabalhadores foram assassinados. Ayala Ferreira diz, no entanto, que a escalada de violência antecede Carajás, que deixou também 79 pessoas mutiladas.
"Em 30 anos de luta pela terra no Pará, especialmente no sul e sudeste do estado, tivemos mais de 600 trabalhadores e trabalhadoras assassinados. O que aconteceu em 1996 e o que aconteceu no último dia 24 têm muitos aspectos que compõem o mesmo enredo: eram trabalhadores que estavam resistindo numa área grilada, terras públicas, e houve ação da Polícia Militar, mais uma vez como ocorreu em 1996, Polícia Civil, empresas privadas de segurança, que hoje é a nova roupagem do antigo jagunço que estava a serviço do latifúndio, que foram, sem nenhum tipo de preparo, fazer uma ordem de despejo. Na nossa leitura, uma ordem de assassinar e destruir um acampamento", diz a integrante do MST, lembrando que só nos últimos dois meses já são contabilizados no 18 assassinatos em áreas rurais do Pará.
Dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) revelam que em 2016 foram registrados 61 assassinatos em conflitos rurais, o maior número desde 2003. Só este ano, o total de mortes no campo chega a 36.
"Esse aumento da violência no campo tem a ver com o momento atual de retirada de direitos e de ter se recolocado no cenário nacional posicionamentos extremamente violentos e reacionários pelo latifúndio e pelas empresas que estão a serviço do capital e pelo próprio comportamento do governo, seja o federal, ou o legislativo. Há um consenso, uma escalada muito favorável que fortalece esse processo de violência contra os trabalhadores que pensam diferente. Se o Estado não atentar que deve pensar em mecanismo que recoloquem valores e princípios como os da democracia, o direito de questionar e protestar, isso só deverá se aprofundar", prevê Ayala.
Segundo a ativista, existem hoje mais de 100 trabalhadores na região que estão sendo protegidos pelo MST e pela CPT após receberem ameaças de morte.
"Se o Estado não agir para coibir esse tipo de comportamento, é muito provável que eles possam alcançar a lista com esses mais de 100 nomes. Tem que ser uma ação do Estado não só para preservar direitos, como também de punição daqueles que representam o latifúndio e outros interesses privados na região", conclui Ayala.