"O segundo erro ocorreu quando a presidente anunciou o ajuste fiscal e traiu o eleitorado que a elegeu em 2014, ao qual prometemos manter as despesas. Dessa forma, começamos a perder credibilidade. O ano de 2015 foi muito semelhante ao de 1999, quando Fernando Henrique Cardoso [do PSDB] tinha uma popularidade de 8% e o país quebrou três vezes", disse Lula ao jornal espanhol El Mundo.
Mais tarde, o Instituto Lula negou que o petista tivesse usado o termo "traiu" na entrevista. O jornal espanhol acabou alterando o trecho, informando não que Dilma traiu os eleitores, mas sim que estes se sentiram traídos.
Ao longo da conversa, o ex-presidente relembrou ainda que FHC, naquela oportunidade, teve a ajuda para governar do então presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer (PMDB). Já a situação para Dilma foi muito distinta e, após vários embates, levou ao processo de impeachment que Lula classificou como "ilegítimo".
"Nós tivemos Eduardo Cunha que foi encarregado de rejeitar todas as reformas propostas por Dilma. Foi ele quem produziu um impeachment ilegítimo. Nós tivemos o inimigo em casa", comentou o ex-presidente.
Contudo, Lula admitiu que o governo petista cometeu erros e falhas. O maior deles, na visão do ex-presidente, envolveu o empresariado.
"Sim, é claro que nós falhamos. Nosso maior erro foi exagerar as políticas de exoneração de grandes empresas. O Estado parou de arrecadar para devolver aos empresários e, em 2014, veio mais dinheiro do que entrou. Entre 2011 e 2014, R$ 428 bilhões foram renunciados e quando Dilma tentou acabar com este auxílio, o Senado não o permitiu", comentou.
Se dizendo alguém que não se arrepende, Lula destacou ter pensado sim em sair candidato à Presidência em 2014, mas que preferiu respeitar o direito de Dilma de se candidatar à reeleição – ainda que, segundo o petista, a própria presidente tenha pensado a respeito na época.
"Não me arrependo porque, em primeiro lugar, sou leal à democracia e à Dilma Rousseff. Ela era a mandatária e tinha o direito de ser reeleita. Mas eu pensei nisso muitas vezes e eu sei que Dilma também. O que acontece é que eu não sou o tipo de pessoa que se arrepende, temos que esperar e quero ser presidente novamente para mostrar ao mundo que o Brasil pode trabalhar", destacou.
Lula ainda criticou as políticas do governo Temer, afirmando que, se for candidato nas eleições presidenciais de 2018 e acabar eleito, ele pretende convocar um referendo para revogar "muitas das medidas aprovadas" pela gestão peemedebista.
"O Brasil deve ser governado novamente com a maioria em mente e não poucos […]. É criminoso ter uma lei que limite a possibilidade de investimento do Estado por 20 anos. No Brasil, coisas básicas como saneamento, tratamento de água, habitação ainda faltam. Temos um potencial investimento em infraestrutura que pode resolver grande parte da geração de emprego e recuperar a economia. O Brasil não depende dos EUA ou da China, mas em suas próprias decisões. Quando os pobres retornam ao orçamento do Estado, o país crescerá novamente e recuperará a confiança internacional. O capital é covarde e só virá quando você sabe que pode ganhar", ponderou o petista.
Ainda sobre 2018, o ex-presidente afirmou que "há milhares de Lulas" para o caso dele não poder ser candidato. Na mesma entrevista, ele ainda criticou o papel da mídia nas manifestações de 2013 no Brasil, a "falta de provas" que marca o seu caso na Operação Lava Jato, e destacou que o ex-ministro Antônio Palocci o implicou em supostos episódios de corrupção em busca do "benefício da lei".
Alteração
O jornal El Mundo editou a entrevista com o ex-presidente Lula e alterou a frase em que o petista afirmava que Dilma havia traído seus eleitores. Na nova versão, Lula afirma que o povo "se sentiu traído".
Lula publicou o áudio deste trecho da entrevista em seu Facebook: