Exportações obscuras
No momento do colapso da URSS, a Ucrânia era uma das repúblicas ex-soviéticas mais militarizadas. Aqui estavam localizadas três regiões militares, a Frota do Mar Negro, dois exércitos do ar e um exército independente de defesa antiaérea, assinala o autor.
No total, além da independência, a Ucrânia recebeu em 1991 cerca de 2,4 milhões de toneladas de munições, projéteis, bombas, mísseis e cartuchos soviéticos. Para comparar: em 1943, em plena guerra, o consumo total de munições de todos os tipos pelo Exército Vermelho somou 3 milhões de toneladas.
Entretanto, ressalta Saranov, as autoridades ucranianas viam essa riqueza recebida como, primeiramente, uma mercadoria para exportação que disfrutava de uma demanda sólida nos mercados.
"Na década de 90 e nos anos 2000, as vendas de munições ucranianas para o exterior adquiriram um caráter maciço", explica o especialista russo em assuntos militares, Viktor Murakhovsky.
"Vale ainda destacar que para exportação seguiam as munições mais novas, que ainda não estavam fora dos prazos de garantia e de serviço. De acordo com todos os padrões, elas correspondiam às exigências modernas", adiantou.
No entanto, não há dados precisos sobre os números das vendas ucranianas, pois além das exportações oficiais do Estado era ativamente usado o mercado negro.
Um dos maiores escândalos neste sentido se deu em 2008, quando veio à tona que o navio mercantil ucraniano Faina, tomado por piratas somalis, estava transportando armamentos e munições contrabandeados para o Sudão.
Contudo, apesar dos lucros inéditos que a Ucrânia obteve das vendas da herança bélica soviética, o país não se apressava a modernizá-la. De acordo com as avaliações de especialistas ucranianos, entre 150 e 200 mil toneladas de munições se perderam na sequência de incêndios nos maiores armazéns de armas nacionais.
Munições fora de prazo
Porém, escreve o colunista, a "fome de munições" no exército ucraniano foi um resultado não só das exportações de armas semilegais e da desordem nos arsenais.
Já passaram quase 25 anos desde o colapso da URSS, mas a Ucrânia nunca chegou a organizar a produção de suas próprias munições, exceto alguns exemplares de sistemas de alta precisão. Por isso, aos militares ucranianos apenas resta contar com a herança soviética que, pelo visto, já está fora de prazo.
"O prazo de serviço para os projéteis não guiados é por volta de 20 anos, enquanto o de mísseis não guiados é de 15 e das munições guiadas é de 10 anos. Todavia, estes prazos se aplicam somente se as munições forem guardadas em espaços fechados, onde se mantém um determinado nível de temperaturas", pormenoriza Viktor Murakhovsky.
"No que se trata dos armazéns ucranianos, as munições ficam empilhadas debaixo de céu aberto, o que reduz significativamente seu prazo de serviço", adianta.
O autor assinala: neste caso, não é de estranhar que a mídia ucraniana esteja constantemente falando que o exército ucraniano é obrigado a lutar em Donbass usando armas fora de prazo de serviço, o que diminui consideravelmente suas capacidades de combate e muitas vezes leva a perdas humanas adicionais.
"Tudo isso indica que tais incidentes continuarão a ocorrer. O comando do exército ucraniano, tal como a guerra em Donbass nos mostrou, não se destaca por uma atitude escrupulosa perante as vidas e saúde dos seus combatentes. Bem como perante as vidas de dezenas de milhares de pessoas que são obrigadas a morar na proximidade de arsenais explosivos", resume Saranov.