Para autoridades sul-coreanas, a atual conjectura permite até fomentar a ideia de que é o melhor momento para que os governos de Coreia do Norte e EUA se sentem à mesa para conversar e negociar uma saída para o impasse em torno do programa nuclear norte-coreano.
"Agora é o melhor momento, já que os EUA abrem a sua porta para conversas. Os EUA podem fechar a porta para sempre. É importante para o Norte parar as provocações e sair para conversar", afirmou um oficial sul-coreano na última quarta-feira, citado pela agência local Yonhap.
Tal ponto de vista que relaciona os Jogos a uma potencial abertura para, por exemplo, uma conversa direta entre o presidente dos EUA, Donald Trump, e o líder da Coreia do Norte, Kim Jong-um – algo inimaginável, assim como parecia até alguns meses atrás a ideia de uma reaproximação entre Seul e Pyongyang – possui outros entusiastas.
Um deles é o ex-secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon. De acordo com ele, a presença norte-coreana nas Olimpíadas de Inverno de PyeongChang abre uma janela de oportunidade para a retomada de negociações prolongadas que visem discutir a desnuclearização do país.
"Na verdade, há uma pequena janela aberta […]. [A questão é] como expandir esta janela para levar a conversas reais e significativas. Concordo [com alguns diplomatas nos EUA e na Coreia do Sul] que este é o melhor momento para conversas com o Norte", ponderou Ban em um seminário de imprensa na Coreia do Sul.
Ainda segundo o ex-secretário-geral da ONU, "sem conversas [com esta janela em PyeongChang], a crise do ano passado será repetida". "As conversas devem ser iniciadas. A pequena janela pode estar aberta de acordo com a forma como fizermos isso".
Linha tênue
Os encontros entre altas autoridades das duas Coreias – os primeiros em mais de dois anos – ajudaram a diminuir as tensões dos dois lados da fronteira, mas os temas giraram principalmente quanto aos preparativos para a participação norte-coreana dos Jogos de Inverno.
Todavia, é ainda incerta qual será a atitude de Pyongyang tão logo questões relativas ao seu programa de mísseis balísticos e nuclear se tornar pauta no diálogo com Seul. É nesta seara que Washington está mais interessada, e oficialmente a administração Trump vê com uma boa dose de ceticismo a possibilidade de Kim colaborar.
Dentro do governo do presidente sul-coreano Moon Jae-in, a mensagem recebida da Casa Branca é que os EUA estão sim prontos para dialogar com a Coreia do Norte – como o secretário de Estado do país, Rex Tillerson, já declarou no passado: "sem pré-condições".
"Embora a sua retórica tenha sido forte, Tillerson indicou que as negociações poderiam ser possíveis se o Norte parar as provocações por algum tempo, e Trump também se juntou a isso. Nunca houve qualquer momento antes em que [autoridades dos EUA] disseram isso", informou a fonte sul-coreana ouvida pela Yonhap.
Em um gesto de boa vontade, Seul até mesmo já indicou que não se opõe a ficar de fora do processo em torno da discussão nuclear, caso Washington e Pyongyang queiram lidar diretamente com o assunto. Assim como os EUA, a Coreia do Sul considera a desnuclearização da Coreia do Norte e o congelamento de seus programas militares como o objetivo final.
Toda a teoria deve ser colocada à prova logo após o fim dos Jogos na Coreia do Sul. É quando espera-se que um encontro entre militares dos dois países possa ser viabilizado. Isto, claro, se não existir o que Ban chamou de "erro de cálculo", que poderia vir tanto pelo discurso de Seul e Washington, ou por alguma provocação de Pyongyang.
"Olhando para o passado, o Norte frequentemente avançou com um comportamento de observações provocativas após grandes eventos", relembrou o ex-secretário-geral da ONU. "Você deve estar ciente de que o Norte geralmente usou gestos de paz sempre que estava preso em uma situação difícil no passado".
Se essa for a estratégia de Kim para justificar a sua recente boa vontade em conversar com os vizinhos do Sul, Ban sugere uma alternativa que deve estar sobre a mesa de negociações.
"A Coreia do Sul precisa ser preparada e pronta para pressionar (para que) a Coreia do Norte considere que não há alternativa que não seja se sentar para negociar", enfatizou Ban. A sorte está lançada na península.