Desafios do 'supercapitalismo robótico' para Rússia e América Latina

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O mundo está à beira de entrar na era do "supercapitalismo robótico", que trará consigo mudanças globais e cujos primeiros efeitos já se fazem sentir, afirmou o colunista Aleksandr Zotin.

Na década de 2000 estava muito na moda o conceito de "decoupling" ou crescimento impetuoso dos países não ocidentais e a deslocação do centro da atividade econômica da Europa e EUA para outras regiões do mundo. Entretanto, nos meados dos anos 2010, terminou o assim chamado "superciclo" baseado nas matérias-primas, tendo a rentabilidade do modelo asiático caído bruscamente junto com as moedas de muitos países, incluindo a da Rússia.

"Os países em desenvolvimento deixaram de se desenvolver. A locomotiva do crescimento, a indústria, foi automatizada e retornou à sua origem, os países desenvolvidos. E quase não há outros motores", escreveu Zotin no seu artigo para o jornal Kommersant

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Mas por que o crescimento estagnou? Os problemas surgiram antes da chegada da atual onda tecnológica de robotização, disse o analista.

Desindustrialização prematura

"Agora os países pobres estão atravessando algo que não se encaixa no modelo clássico: começaram a desindustrializar-se sem conseguir atingir altas rendas per capita. Os países se tornam pós-industriais com baixo nível de desenvolvimento, ou o processo de industrialização primária para: o fluxo de mão de obra do setor agrário à indústria é muito lento ou vai diretamente para a esfera dos serviços, ou estes processos se combinam", Explicou Zotin.

O economista turco Dani Rodrik define esse fenômeno como "desindustrialização prematura", que ocorre quando o peso da produção industrial na economia dos países não ocidentais, ou seja, a força de trabalho ocupada neste setor, cai abaixo de 20% e abaixo de 6.000 dólares de PIB per capita (R$ 19.000).

Segundo Rodrick, a produção industrial tem algumas caraterísticas específicas que a convertem no principal motor do desenvolvimento económico. 

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Primeiro, a produção industrial é um setor tecnicamente dinâmico e se destaca por sua produtividade, independentemente de fatores externos como a situação política ou o ambiente de negócios. Por exemplo, uma fábrica de carros terá nos EUA aproximadamente a mesma produtividade que no Zimbábue.

Em segundo lugar, a produção industrial absorve tradicionalmente uma parte significativa da força de trabalho não qualificada, ao contrário de outros setores de alto rendimento, como o setor financeiro ou o setor de mineração. A indústria pode absorver mão de obra, mesmo que o resto da economia continue sendo tecnologicamente primitivo, declarou Zotin.

O especialista enumerou várias razões para explicar a desindustrialização prematura. Primeiro, a mudança tecnológica. A robotização e automação levam a uma redução na demanda por mão de obra na indústria. As empresas multinacionais estão substituindo cada vez mais o trabalho manual por robôs e estão começando a transferir sua produção para os países ricos, mais perto do consumidor final. Este processo também é conhecido como "reshoring".

Em segundo lugar, a globalização do comércio e a abertura dos mercados mundiais significam que as indústrias em muitos países não podem competir com as importações baratas provenientes da China.

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Em terceiro lugar, segundo Rodrik, a indústria começou a exigir mão de obra altamente qualificada. A mão de obra barata em países pobres é necessária para o capital, mas os investidores frequentemente sobrestimam a atratividade da subcontratação da fabricação em países não ocidentais e estão cada vez mais inclinados a criar empresas robotizadas próximo dos mercados em seus países de origem. 

 "Para os países em desenvolvimento, os processos inter-relacionados entre si – a robotização, o ‘reshoring’ e desglobalização — implicam a impossibilidade de criar novos empregos na indústria e a falta de esperança perante qualquer desenvolvimento econômico", afirmou o cientista russo.

Segundo ele, isso é algo relevante para a Ásia, a América Latina e quase toda a África, onde, por exemplo, o crescimento econômico per capita em 2016-2017 foi negativo.

Algo semelhante ameaça a Rússia, mas para este país os problemas são eclipsados pelo envelhecimento da população, razão pela qual a necessidade de criar novos empregos não é tão urgente.

A tragédia da Índia

Zotin põe a Índia como exemplo de vítima da desindustrialização prematura. Em 2017 o país perdeu milhões de postos de trabalho. Na Índia, onde a indústria é responsável por apenas 15% do PIB, 10 milhões de pessoas são expulsas anualmente do mercado laboral. No período entre 2011 e 2015 foram criados apenas sete milhões de postos de trabalho. 

Perante esta situação, os jovens não podem aspirar a um trabalho digno e seu destino parece ser o de se tornar vendedores, condutores de riquixá ou varredores. Uma alternativa é emigrar, mas os países receptores têm cada mais dificuldade para absorver estes fluxos migratórios. Como resultado, o desespero se instala em muitas dessas pessoas. Várias teorias sociológicas modernas vinculam as recentes revoluções com o crescente número de jovens desempregados, exemplo recente disso é a chamada "Primavera Árabe".

O crescimento forte do PIB da Índia na última década não mudou a estrutura da sua economia nacional e não levou à criação dos postos de trabalho na indústria. Dois terços do aumento do PIB foram registrados no setor financeiro e no sector imobiliário. Como resultado, os frutos do crescimento económico foram obtidos quase exclusivamente pelas elites. 

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Com a introdução da automatização, os robôs e a aprendizagem automática levarão a novas reduções do emprego. De acordo com as estimativas da McKinsey Global, na Índia 52% das vagas de trabalho atuais podem vir a ser automatizadas. No Vietnã e Bangladesh esta cifra pode atingir 86% e 88% respetivamente, avisa a Organização Internacional do Trabalho.

Entretanto, segundo Zotin, para o Ocidente o supercapitalismo robótico também trará problemas em forma de aumento das desigualdades sociais e desaparecimento da classe média.

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