A expectativa de Portugal tem justificativa: a Moody's é a única agência que ainda mantém o país no patamar de "lixo" para investimentos. Portugal tem nota Ba1, o mais alto dentro do grau especulativo, e deve alcançar o Baa3, a primeira nota dentro de grau de investimento, na próxima revisão.
O que isso significa? Que Portugal pode voltar a ser considerado um país confiável para investimento depois de permanecer sete anos dentro da classificação especulativa, de "lixo" financeiro, uma posição que afeta a economia e tem impacto negativo sobre a vida da população.
"Esta classificação significa que o investimento não é seguro no seu retorno, ou seja, que tem um fator de risco elevado. Isto faz com que haja menos confiança na economia, o que pode gerar menos investimento, ou investimento mais predador dos recursos internos. No caso português significou uma degradação das condições socioeconômicas, que, lentamente, estão a se recuperar", explica a pesquisadora do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE — Instituto Universitário de Lisboa, Cátia Miriam Costa.
Recuperação com sacrifício
A recuperação econômica portuguesa foi elogiada por Evan Wohlmann, vice-presidente e analista sênior da Moody's, em fevereiro. Para especialistas, é o reconhecimento de um processo que envolveu disciplina.
O caminho português para a recuperação econômica começa com "o cumprimento daquilo que foram as metas estabelecidas com a Troika", analisa João Duque, economista e presidente do Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa.
Brasileiro, em Portugal desde 2007, o gestor de alojamentos locais Felipe Barbosa sentiu na pele o impacto da austeridade. "O valor da prestação da casa subiu, houve aumento da carga horária de trabalho, expectativa de demissão até mesmo para os cargos públicos. O clima geral era péssimo. Muita gente voltando para o Brasil e os portugueses todos indo para outros países da União Europeia", conta Felipe.
O aperto resultou. "Desde este período que se fez um caminho de recuperação e isso foi sistemático: cortes nas despesas públicas, aumento dos impostos de forma muito determinada. Nós fomos dando passos no sentido de nos aproximarmos da situação atual", explica o economista João Duque.
A pedra no caminho
A dívida pública é um ponto delicado e que, para a agência Moody's, ainda merece preocupação. Portugal fechou o ano passado devendo 242 bilhões de euros, valor que representa 126% do PIB nacional, e comemorou: foi o menor percentual desde 2012, com redução recorde de 4% em relação a 2016.
Bem na fita
A subida do patamar também vai causar boa impressão internacional. "Esta classificação significa que Portugal de alguma forma conseguiu debelar a crise e equilibrar as contas públicas, portanto é uma prova de que existe um reforço para ir ao encontro dos parâmetros propostos internacionalmente seja pela União Europeia, seja pelo FMI. Nesse sentido existe uma valorização da imagem portuguesa perante os outros governos europeus", esclarece a pesquisadora Cátia Miriam Costa.
O governo não esconde o otimismo, alimentado pelos elogios que tem recebido. "Portugal é o exemplo de um país onde a crise originou uma boa resposta, incluindo em reformas estruturais, e colocou o país em uma posição de aproveitar a forte recuperação econômica na Europa e ter um bom crescimento econômico", declarou o diretor do departamento europeu do FMI, Poul Thomsen, durante coletiva de imprensa dos Encontros da Primavera, em Washington, na sexta-feira (20). Três dias atrás, o Fundo Monetário Internacional já tinha divulgado boas previsões para Portugal em 2018: mais crescimento econômico e menos desemprego do que o próprio governo prevê.
E o retorno?
"As salas de aula estão sucateadas, o transporte público está caríssimo. O cenário que eles pintam atualmente não condiz com a realidade, é só ouvir o que a população tem a dizer em detalhes. Tá difícil para morar, para se deslocar, se tratar, comer. Trata-se de coisas básicas", completa Felipe.
A especialista em relações internacionais explica que Portugal vai ganhar a partir do momento em que começar a atrair mais investimentos. Segundo Cátia Miriam Costa, com a nova classificação da Moody's, haverá "mais probabilidade de se investir em setores com retorno mais lento ou que impliquem atividades produtivas, existe a possibilidade de ser mais exigente com a direção do investimento e condições propostas e é também uma oportunidade para a valorização do trabalho".