A reportagem da Sputnik Brasil percorreu os três pavilhões do Riocentro, na Barra da Tijuca, que abrigam mais de 450 marcas de armamentos nacionais e internacionais e conversou com representantes de algumas das mais famosas fabricantes mundiais. Em comum, o otimismo quanto ao avanço das vendas de armas em solo brasileiro.
"O estande estava cheio até agora pouco. Estamos muito animados com o mercado brasileiro, pretendemos participar mais ainda dos processos licitatórios aqui no Brasil", afirmou à Sputnik Brasil o gerente do Centro de Produtos de Defesa da Walther, Peter Dallhammer.
O alemão foi um dos poucos que se dispôs a conceder entrevista abertamente, destacando que a Walther tem o seu foco no mercado corporativo de forças de segurança, ansiando fornecer pistolas para as polícias do país em um futuro próximo. Ele advertiu, porém, que as exportações da empresa dependem da aprovação do governo da Alemanha.
Distante do estande dos alemães a movimentação estava mais acirrada, em um corredor que acabou apelidado de "Faixa de Gaza". Foi assim que um representante da austríaca Glock ironizou o fato de que poucos metros separavam o ponto de exibição das famosas armas da companhia daqueles da brasileira Taurus Armas e da Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC).
"Esperamos por mais Justiça no mercado brasileiro", declarou o funcionário da Glock, que pediu para não ser identificado – oficialmente, apenas o presidente Franco Giaffone poderia falar pela empresa, mas ele não foi localizado. O mesmo representante da Glock elogiou o movimento do governo Bolsonaro acerca da flexibilização da posse de armas no Brasil, porém criticou a velocidade dessa e outras eventuais mudanças.
Se a arma de entrada da Glock no Brasil não pode ser adquirida por menos de R$ 6.450, com um pouco menos – cerca de R$ 5.900 – seria possível adquirir uma pistola da norte-americana Smith & Wesson. A Sputnik Brasil conversou com dois representantes da empresa, um brasileiro e outro estrangeiro, no estande da companhia na LAAD 2019.
Informalmente, ambos destacaram que estão otimistas sobre uma possível flexibilização do porte de armas no Brasil – o que permitiria o trânsito de qualquer cidadão com arma de fogo fora do seu comércio ou domicílio, portando uma arma nas ruas –, uma demanda defendida abertamente pela Frente de Segurança da Câmara dos Deputados, conhecida como Bancada da Bala.
"Esperamos não só uma facilidade para a importação, mas também do fim desta distinção por calibre, algo que só existe no Brasil […]. Aqui até um revólver calibre 22 é considerado uma arma de guerra" sentenciou um dos funcionários da Smith & Wesson em conversa com a Sputnik Brasil. Oficialmente, a companhia não fala sobre os seus planos para o Brasil.
A rediscussão em torno do Estatuto do Desarmamento de 2003 se aqueceu nos últimos dois anos, com pressões de alguns setores não só contra a normativa legislativa, mas também contra leis e normas militares que restringem as importações de revólveres e pistolas, assim como a instalação de fábricas em solo brasileiro.
A soberania da indústria nacional é o principal argumento dos defensores do monopólio que hoje ainda privilegia a Taurus. Contudo, a empresa vem passando por uma restruturação por conta de dívidas e falhas que causaram acidentes com policiais em várias partes do Brasil. Um dos grandes defensores da entrada de estrangeiras no país é o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente Jair Bolsonaro.
Questionados pela Sputnik Brasil sobre se tinham conhecimento dos problemas com armas fabricadas pela Taurus, os representantes das três empresas estrangeiras responderam afirmativamente. Nenhum deles também admitiu qualquer lobby articulado junto à Bancada da Bala ou a algum político brasileiro em prol do fim do monopólio da empresa nacional.
A reportagem esteve no estande da Taurus e tentou ouvir um representante da companhia. O funcionário indicado, porém, disse que não poderia falar sobre novidades e planos da empresa na LAAD. "O conselho determinou que não falemos nada. Tivemos alguns problemas recentemente com a imprensa…", ponderou.
Antes de concluir, o mesmo representante revelou que apenas o presidente da Taurus e vice-presidente Comercial e de Relações Institucionais da CBC, Salesio Nuhs, tinha autorização para falar. Entretanto, a agenda do executivo estaria lotada e, assim, ele não poderia conversar com a Sputnik Brasil.
Em novembro do ano passado, Nuhs desafiou as estrangeiras que querem uma fatia do mercado brasileiros de armas leves. "A concorrência não nos assusta em nada. Nós já vivenciamos isso diariamente nos Estados Unidos", disse ele, em entrevista publicada no site oficial da CBC.
O controle de fabricação, comércio e importação de armas foi concedido ao Exército Brasileiro em 1934, durante o governo do presidente Getúlio Vargas. Desde então, os militares brasileiros sempre reforçaram que era preciso proteger a indústria nacional, a fim de permitir a evolução do padrão técnico e das tecnologias aqui produzidas.
Para a importação, a legislação ainda pede autorizações aos ministérios da Defesa e de Relações Exteriores. Contudo, além do filho de Bolsonaro, outros integrantes do governo, como o líder do governo no Senado, Major Olímpio (PSL-SP), e o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, já deram opiniões favoráveis ao fim do monopólio da Taurus.