Após o peronista Alberto Fernández vencer as prévias das eleições presidenciais, Jair Bolsonaro (PSL) afirmou que "se essa esquerdalha voltar aqui na Argentina", o Rio Grande do Sul poderia enfrentar uma fuga de argentinos nos moldes da crise de refugiados venezuelanos que vivem em Roraima.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, foi na mesma linha e disse que o Brasil pode deixar o Mercosul em caso de vitória da oposição ao presidente Mauricio Macri.
"O Mercosul, claro, é um veículo de inserção do Brasil no comércio internacional. Mas, se a [Cristina] Kirchner quiser entrar e fechar a economia deles? Se quiser fechar a gente sai do Mercosul. Se ela quiser ficar aberta? Beleza, continuamos. O Brasil é uma economia continental", disse Guedes.
Kirchner foi presidente da Argentina de 2007 e 2015 e é a vice na chapa de Fernández.
"Os presidentes têm preferenciais eleitorais, todos nós temos, gostaríamos que A ou B fosse eleito. Mas não é da tradição diplomática que você assuma posições que, de certa maneira, possam fazer parecer que você está intervindo na política interna de outro", analisa o ex-embaixador Azambuja em entrevista à Sputnik Brasil.
Além de representar a diplomacia brasileira em Buenos Aires de 1992 a 1997, Azambuja também foi embaixador na França e secretário-geral do Itamaraty. Ele diz que a fala de Bolsonaro é um "resíduo da campanha eleitoral" e que ela não é "habitual ou desejável".
"A Argentina não vai fechar a economia porque não é um país insensato a esse ponto. A ideia de fazer esse tipo de linguagem não é útil", diz o ex-embaixador. "Nada é mais poderoso que o impacto da realidade. O presidente da Argentina e do Brasil estão condenados a se entender."
Fernández afirmou que o Mercosul é "central" para a Argentina e que o Brasíl é o "principal parceiro" de Buenos Aires.
A doutorando em relações internacionais Bárbara Neves também ressalta que a postura brasileira de criticar um possível "fechamento" da economia argentina é inconsistente porque ela já está integrada na região e a sinergia com os vizinhos é necessária para superar a crise que enfrenta.
"Não há um entendimento do governo brasileiro do que significa o cenário regional e as relações existentes entre Brasil e Argentina desde os anos 1980 com o então presidente José Sarney, é uma relação consolidada há muito tempo", diz Neves.
Ela também pontua que uma possível saída do Mercosul não seria um processo simples e que vai "além das atribuições de Bolsonaro e Guedes" ao envolver setores econômicos que se beneficiam do bloco econômico.
O Brasil exportou US$ 8,91 bilhões para os países do Mercosul de janeiro a julho deste ano, no mesmo período as importações ficaram em US$ 7,58 bilhões. Os dados são do Ministério da Economia.