O estudo foi realizado pela Federação Acadêmica de Lisboa (FAL), através de questionários, com estudantes de cursos de licenciatura, mestrado e doutorado entre os 17 e os 30 anos. Entre os casos de violência física, 22% responderam que alguém já "acariciou, beijou ou se esfregou nas partes íntimas e genitais contra a minha vontade" e 14% foram coagidos a praticar atos sexuais.
"Sentíamos que havia problemas e muita incidência de abusos, então resolvemos averiguar para ver qual era mesmo a realidade. Entrei no ensino superior em 2014 e já naquela altura havia colegas a falar sobre esses problemas. Infelizmente pouco ou nada foi feito", diz à Sputnik Brasil a presidente da entidade, Sofia Escaria.
O estudo também mostra que 61% dos estudantes foram vítimas de assédio sexual pelo menos uma vez e 65% já ouviram comentários provocativos de natureza sexual. De acordo com Sofia Escaria, autoridades nacionais e municipais "ficaram muito alarmadas".
A Câmara Municipal de Lisboa, órgão equivalente às prefeituras brasileiras, solicitou os dados para "começar a lançar internamente e definir uma campanha de divulgação para a cidade toda sobre este tema e sobre o estudo. Vamos ter reuniões para definir medidas concretas a princípio na semana que vem", diz a presidente da FAL. A nível nacional, representantes da entidade participam de uma reunião nesta quinta-feira (12) com o secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, João Teixeira Sobrinho.
Estrangeiros vulneráveis
Portugal se mostra cada vez mais aberto à internacionalização acadêmica. Dados recentes do governo somam 50 mil alunos estrangeiros no ensino superior nacional atualmente. Só a Universidade de Lisboa, a maior do país, recebe todos os anos cerca de 6.900 estudantes internacionais, vindos de mais de 100 países. Neste cenário, o estudo da FAL levanta questionamentos.
O relatório mostra que 46% das vítimas são estudantes deslocados da sua área de residência. Não existe nenhuma distinção entre nacionalidades, mas as entidades estão atentas à vulnerabilidade de grupos estrangeiros. "Não é claro neste estudo, mas também é percepção nossa que essas situações acontecem muito com a comunidade imigrante na academia. Se pensarmos que muitos estudantes se encontram isolados de referência familiar, de comunidade, mesmo dentro da faculdade, isto aumenta o grau de vulnerabilidade dos mesmos e das mesmas. Temos que pensar nisto", diz à Sputnik Brasil Daniel Cotrim, assessor técnico da direção da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), que prestou assistência à FAL para realização do estudo.
De acordo com o técnico, as autoridades agora devem atuar para conscientizar e eliminar riscos. O estudo mostra que a maioria dos alunos se sente insegura em áreas próximas dos campi acadêmicos, como estacionamentos, e nos trajetos entre casa e faculdade. Entre as recomendações feitas no documento, estão ações simples.
"Os responsáveis pelos campi acadêmicos de Lisboa devem ter em atenção que o espaço público é perigoso. A primeira, e acho que é muito concretizável, é colocar postes de iluminação, alterar o próprio espaço físico em volta das universidades", explica Daniel Cotrim. "Por outro lado, também criar planos de contingência dentro das próprias universidades, para saberem lidar com as questões e saberem fazer as pontes com as associações de apoio às vítimas que estão nas comunidades. Esse caminho não tem sido feito. No âmbito das recomendações, estas são as mais concretizáveis."