Os manifestantes, funcionários do INPI, denunciam que uma nota técnica lançada pelo Ministério da Economia na terça-feira (10) coloca em risco a excelência do instituto e ameaça introduzir interesses privados na concessão de patentes no Brasil. Por cerca de 20 minutos, os manifestantes fecharam a Avenida Rio Branco, uma das principais da região central da capital carioca, em forma de protesto.
Laudiceia Andrade, presidente eleita da Associação dos Funcionários do INPI explica que, na prática, a medida significa que o órgão se tornará privado.
"O papel do INPI, a atividade do INPI, é de Estado. A ABDI não é uma atividade de Estado, mas sim uma atividade de privada. O seja, o INPI deixaria de ser o órgão de excelência do Estado, de entidade pública para o setor privado. Essa é a ameaça", afirma Laudiceia em entrevista à Sputnik Brasil.
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Vinculado ao Ministério da Economia, o INPI foi criado em 1970, e é uma autarquia federal voltada a estimular a inovação e a competitividade a serviço do desenvolvimento tecnológico e econômico "por meio da proteção eficiente da propriedade industrial". O órgão sediado no Rio de Janeiro é responsável pelo registro de marcas, desenhos industriais, indicações geográficas, programas de computador e topografias de circuitos integrados, além de concessões de patentes e averbações de contratos de franquia e distintas modalidades de transferência de tecnologia.
A ideia do governo, conforme a nota técnica, é realizar uma fusão do INPI com a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), criando a Agência Brasileira de Desenvolvimento e Propriedade Industrial (ABDPI). A fusão levaria a INPI a tornar-se parte do formato de Serviço Social Autônomo, tal como a ANPI. Esse formato inclui por exemplo, o Sistema "S", e agrupa instituições privadas sem fim lucrativo. Portanto, o INPI sairia da esfera estatal e iria para a esfera privada.
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Essa situação, segundo Raul Bittencourt, diretor do Sindicato Intermunicipal dos Servidores Públicos Federais dos Municípios do Rio de Janeiro (SINDISEP), impõe alguns perigos.
"Os riscos são vários, primeiro para a sociedade. O INPI é uma entidade pública, então nós somos imparciais na nossa decisão. Se você transfere as decisões do INPI para uma entidade privada, os interesses privados - de grandes laboratórios, multinacionais - vão ser preponderantes nas decisões que o INPI toma", alerta Raul em entrevista à Sputnik Brasil.
O diretor do SINDISEP também afirma que interesses privados podem prejudicar o trabalho de concessão de patentes do órgão e a vida do cidadão comum. Entre os produtos que passam pelo crivo do INPI, por exemplo, estão os remédios genéricos.
"Interessa às multinacionais que nós digamos não [à patente]? Claro que não. Eles pressionam o INPI o tempo todo para que a gente conceda toda e qualquer patente, mesmo sem fundamento", conta Raul, que acrescenta que medicamentos podem subir de preço caso a proposta do governo prevaleça.
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"Se o INPI for para o 'sistema S', os diretores, os políticos, vão poder contratar livremente, porque não vão precisar fazer concurso público [...]. Na nossa opinião o objetivo [do governo] de transferir o INPI para o Serviço de Sistema Social é permitir que as multinacionais escolham os funcionários e que os políticos coloquem seus apadrinhados [nos cargos]", diz Bittencourt.
A nota do Ministério da Economia
A nota técnica nº 8623/2019 sugere que a mudança no INPI seja implementada através de uma Medida Provisória (MP), o que pode ser revertido pelo Congresso Nacional, mas entraria em vigor a partir da publicação. Além disso, outros ajustes seriam enviados ao Congresso por meio de um Projeto de Lei (PL).
O governo defende que a medida "permitirá maior eficiência na atuação/melhoria da capacidade operacional" através do "enxugamento da máquina pública federal" e consequente "inserção competitiva do Brasil nas cadeias globais de valor", segundo o documento.
O texto também aponta que a possível MP seja implementada a partir do início do primeiro dia do ano fiscal de 2020.
Associação de Juízes Federais do Brasil protesta contra medida
Na quarta-feira (11), a Associação de Juízes Federais do Brasil (AJUFE) lançou uma nota pública protestando contra a possível MP do governo.
A AJUFE afirma na nota que o INPI é uma autarquia federal superavitária "que presta relevante serviço como escritório de patentes de invenção e de registro de marcas e de desenho industrial no Brasil".
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A nota ainda exalta a excelência dos funcionários do órgão e justifica o "temor de precarização desses serviços" e aponta que a possível mudança para o setor privado "vai na contramão da experiência dos países desenvolvidos" e coloca em risco o cumprimento de acordos internacionais como o "Acordo sobre Aspectos de Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio".
Por fim, a associação ainda diz que a mudança é inconstitucional e trará insegurança jurídica para as atividades empresariais e também prejuízo ao desenvolvimento científico do país.