Nesta quarta-feira (15), o Ministério das Relações Exteriores anunciou que estava deixando o bloco, portanto não enviaria representantes para a cerimônia de posse da presidência mexicana da instituição, que aconteceu hoje.
O Itamaraty disse que "não existem as condições necessárias para seguir fazendo parte" da CELAC - Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos, "dada a conjuntura de crise que vive a região". O Brasil afirmou ainda que não deveria fazer parte de um bloco que abrange governos que considera ditatoriais, como Cuba e Venezuela.
O cientista político Tanguy Baghdadi, professor de Relações Internacionais da Universidade Veiga de Almeida, aponta o que considera uma hipocrisia no argumento.
"É uma contradição. Enquanto o Brasil fala de ditaduras na região, dialoga com a Arábia Saudita, que talvez seja uma das piores ditaduras do mundo. É um argumento que não para em pé", disse à Sputnik Brasil.
Segundo Baghdadi, a decisão brasileira, na realidade, reflete uma mudança importante na condução histórica da política externa do Itamaraty, que "sempre foi de continuidade", mas que agora passa "por uma ruptura com práticas anteriores".
'Não faz parte da tradição diplomática brasileira'
"É um argumento que tem um único fundamento, que é o ideológico. Se aproximar de um governo com o qual há concordâncias, e se afastar de Estados que têm uma discordância de você. Isso não faz parte da tradição diplomática brasileira, mas é o curso de ação que o governo brasileiro vem adotando, uma mudança importante", afirmou.
Em relação à saída da CELAC, que acontece após o Brasil ter deixado outra instância regional no ano passado, a UNASUL - União das Nações Sul-Americanas, o analista considera algo natural devido à atual conjuntura política no país e na região.
Criada em 2010, durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, a CELAC é o único fórum regional que reúne exclusivamente países de América do Sul e Caribe.
A UNASUL, por sua vez, foi estabelecida em 2008 por incentivo do então presidente venezuelano, Hugo Chávez.
Na opinião de Bagdhadi, a CELAC passava por um processo de "esvaziamento" e as duas organizações ficaram fortemente associadas a governos de esquerda.
'Instituições contaminadas por uma ideologia de esquerda'
"Quando você cria uma instituição internacional, o ideal, o que se espera, é que envolva Estados, não governos. Mas a nova onda de governos mais à direita acabou associando as organizações criadas anteriormente aos governos que os antecederam, de esquerda. Época em que você tinha o governo do PT no Brasil, os Kirchner na Argentina, a CELAC com participação de Cuba, presença forte do Chávez e do Evo Morales. Na visão atual, existe a ideia de que eram instituições contaminadas por uma ideologia de esquerda", refletiu.
O professor, por outro lado, critica o fato da CELAC nunca ter "engrenado" e não ter conseguido definir "claramente sua função".
"O que é uma pena. Ela poderia ter se consolidado como uma instituição para a América Latina conseguir dialogar mais entre si. Existe uma falha da própria América Latina em conseguir objetivos claros em suas instituições", disse Tanguy Baghdadi.