Agora, há especialistas defendendo a tese de que os EUA poderão querer tirar dividendos na guerra comercial que mantêm com a China, usando a epidemia em seu favor.
Apesar de todos os esforços empreendidos pelo governo chinês para conter e evitar a disseminação do vírus, as bolsas mundiais manifestam nervosismo, tendo o índice chinês Hang Seng caído 6%.
Há vozes que acusam alguma mídia de empolar a epidemia, fomentando uma histeria coletiva.
A influência do surto na economia mundial é perfeitamente compreensível dada a posição que a China ocupa no mercado, como grande produtor e consumidor de bens que é. A quarentena de cidades inteiras teria forçosa e igualmente efeito no comércio global.
O surto está sendo hiperbolizado?
O coronavírus 2019-nCoV não é a primeira epidemia a influenciar negativamente os mercados na última década.
Contudo, certa mídia parece agora estar exagerando, especialmente tendo em conta que o vírus não se mostrou até agora tão mortífero quanto o propalado.
Segundo afirmou Denis Rancourt, investigador da Associação das Liberdades Civis de Ontário (Canadá) e cientista social, todas as pandemias históricas de gripe resultaram em "um milhão de mortes ou mais".
O coronavírus causou até agora apenas algumas centenas de mortes, muito menos do que o frio comum nas grandes cidades ocidentais.
Provavelmente devido ao notório esforço governamental de contenção e de prestação de cuidados médicos, a taxa de mortalidade do vírus é de 1,5%, bem menor em comparação com a mortalidade do anterior surto de coronavírus no Oriente Médio em 2012, que atingiu uma taxa de 39% de falecimentos.
Tal como os anteriores surtos de vírus na China - a Síndrome Respiratória Aguda (SARS) em 2002 e a "gripe aviária" em 2013, o coronavírus tem recebido significativa cobertura midiática.
Quem beneficia e sofre mais com o coronavirus?
A "histeria" instalada começou a afetar a China economicamente. Várias empresas americanas, incluindo a Google, Starbucks e Apple, anunciaram recentemente que fechariam seus escritórios, fábricas e lojas na China para evitar a disseminação do vírus.
Numerosos países, entre os quais os EUA, Austrália e Rússia, adotaram severas limitações às ligações de transporte com a nação asiática, receando que os turistas chineses possam trazer o coronavírus com eles.
A epidemia está enfraquecendo economicamente o gigante asiático. Kevin Dowd, professor de finanças e economia da Durham University Business School no Reino Unido, acredita que alguns países poderiam usar a epidemia em seu favor, exercendo pressão sobre a China.
Dowd recorda que já foram impostas determinadas restrições à liberdade de circulação dos cidadãos chineses e que é apenas uma questão de tempo até que limitações semelhantes sejam implementadas relativamente às mercadorias importadas da China.
"Se você for um protecionista sem escrúpulos procurando pretextos para impor barreiras alfandegárias à China, então o coronavírus se encaixa nisso. Gostaria muito de pensar que os políticos não descerão tão baixo, mas quando se trata de comércio, a experiência passada nos diz que vale tudo", afirmou.
Além de afetar negativamente a situação econômica da China, o surto surge em um momento crucial para o país - logo após a assinatura da primeira fase do acordo comercial com os EUA e antes do início da segunda fase de negociações.
Pouco se sabe sobre o que nos trará esse segundo turno, mas o chefe do Tesouro americano, Steve Mnuchin, já declarou que a assinatura da segunda fase do acordo não implicará necessariamente a eliminação de todas as tarifas já impostas aos produtos chineses.
O professor Dowd acredita que é "inteiramente possível" que Washington tente usar a epidemia de coronavírus a seu favor e a fraqueza da China daí resultante, obtendo assim condições mais favoráveis para os EUA.
Já Denis Rancourt, por sua vez, é de opinião que, apesar de a China ser de fato considerada como o seu maior concorrente no plano econômico, é improvável que o acordo comercial venha a ser significativamente afetado pelo surto do vírus.
Contudo, o 2019-nCov pode ser usado como uma "oportunidade de campanha geopolítica" para isolar a China, acrescenta o pesquisador. Rancourt teme igualmente que manifestações internas nos EUA de racismo anti-chinês possam ser exploradas politicamente para apoiar políticas agressivas contra a China, incluindo políticas protecionistas.