Há uma semana, as autoridades alemãs comunicaram que foi confiscado na Tailândia um carregamento de 200.000 máscaras para a polícia de Berlim, tendo acusado os EUA de se apropriar do material em meio à pandemia.
"Nos momentos mais difíceis, os verdadeiros líderes vêm à tona", disse o especialista argentino Alejandro Laurnagaray à Sputnik Mundo, argumentando que a pandemia da COVID-19 vai mudar a geopolítica de acordo com a forma como os governos se comportam face à crise.
Enquanto os Estados Unidos estão perdendo peso, líderes como os da "Rússia, China e mesmo Cuba" estão consolidando-se, diz.
Em uma entrevista publicada na sexta-feira (10) pela revista Der Spiegel, o ministro alemão das Relações Exteriores, Heiko Maas, criticou a resposta "demasiado lenta" dos EUA à crise da COVID-19, afirmando esperar que Washington reconsidere suas relações internacionais.
"Vamos ver até que ponto as ações do governo dos EUA irão conduzir a discussões no país sobre se o modelo 'América primeiro' realmente funciona", acrescentou o diplomata.
Polos opostos
"O que os EUA estão fazendo com o Irã, a Venezuela e Cuba, bloqueando a chegada de ajuda de outros países, já não só açambarcando tudo para si próprios, impede que outros países tenham acesso, nem sequer a doações, como aconteceu com Cuba", comentou Laurnagaray.
Dias depois de declarar o líder da Venezuela como chefe de um cartel de droga, Trump enviou navios, helicópteros e tropas para o mar do Caribe para supostamente conter o narcotráfico.
"Este é um exemplo do que esta pandemia nos vai deixar, porque vai gerar e demonstrar uma mudança moral, de princípios e de liderança", disse o especialista argentino.
"É uma tendência que irá aprofundar a liderança que a China, Cuba e Rússia estão tendo. É uma demonstração de verdadeira cooperação, solidariedade e coordenação internacional", acrescentou.
Estes últimos valores "prevalecerão sobre uma atitude egoísta, isolacionista e até militarista em meio à pandemia, como temos visto os Estados Unidos [fazendo], mobilizando tropas e ameaçando outros países", expressou.
"É uma vergonha o que o governo de Trump está fazendo com a Venezuela, a continuar a intimidar mesmo em momentos de catástrofe mundial. É também uma tentativa de desviar as atenções do total descontrole a nível interno daquilo a que estamos assistindo com a pandemia. Será o país que vai ter mais mortes", afirmou.
Ajuda apesar das sanções
Laurnagaray destacou o caso de Cuba, que, marginalizada e isolada da comunidade internacional pelo bloqueio dos EUA, se tornou em porta-bandeira de solidariedade enviando brigadas médicas para todo o mundo em plena pandemia.
"A exportação de solidariedade de Cuba tem sido muito visível para toda a comunidade internacional. Um país com décadas de sanções e impedimentos, a medicina e seus médicos têm um papel de liderança a nível internacional com esta e outras pandemias que podem não ter tido visibilidade", salientou o analista.
O especialista observou que situações como a da União Europeia "se abrindo à ajuda chinesa e russa, que também enviaram ajuda para a Itália", apesar das sanções, "são exemplos que permanecerão e marcarão o caminho para novas lideranças".
Sanções norte-americanas à Venezuela
Os Estados Unidos bloquearam até 22 de julho qualquer venda ou transferência da dívida, detida pelos portadores de obrigações norte-americanas da companhia petrolífera estatal venezuelana PDVSA, para impedir o governo do presidente Nicolás Maduro de assumir essas obrigações, de acordo com um documento publicado pelo Departamento do Tesouro norte-americano.
"Entre 24 de outubro de 2019 e 22 de julho de 2020 [data em que entra em vigor a autorização da Licença Geral 5C], não há nenhuma autorização em vigor de licenças contra a alínea 1 (a) (iii) da Ordem Executiva 13835 [de sanções contra a Venezuela] aplicáveis aos titulares das obrigações PDVSA 2020 de 8,5%", diz um documento associado.
"Como resultado, durante esse período, são proibidas transações relacionadas com a venda ou transferência de ações da Citgo [refinaria, distribuidora e revendedora de petróleo dos EUA] em ligação com as obrigações de 8,5% PDVSA 2020, a menos que especificamente autorizadas pelo Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros [OFAC, na sigla em inglês]", continua o texto.
Anteriormente, o governo dos EUA emitiu uma ordem, em 24 de outubro, para bloquear até 22 de janeiro uma penhora de credores da filial norte-americana da PDVSA, a Citgo, cujas ações foram utilizadas como garantia para a emissão de obrigações.
Papel de Guaidó
O líder da oposição e autoproclamado presidente interino da Venezuela, Juan Guaidó, assumiu o controlo da Citgo no início de 2019, depois de o governo dos Estados Unidos o reconhecer como o líder legítimo do país.
Depois de Guaidó ter assumido o controlo da Citgo, as obrigações entraram em incumprimento quando era devido um pagamento US$ 913 milhões (R$ 4,66 bilhões), e tanto ele como seus aliados entraram com uma ação judicial nos Estados Unidos solicitando a anulação das obrigações.
A ordem de sexta-feira (10) impede efetivamente os credores da PDVSA de apreenderem ações da empresa-mãe da Citgo até 22 de julho.