Após quase dois anos de impasse sem precedentes, numerosas crises e três eleições, Israel finalmente tem um governo. A Sputnik International enumera os vários desafios que o novo governo de unidade nacional israelense vai enfrentar.
Assinado em 20 de abril entre o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e seu antigo rival, Benny Gantz, o acordo estipula a divisão do poder entre os dois, com Netanyahu ocupando inicialmente o cargo de premiê e Gantz ocupando seu lugar um ano e meio depois.
Para Gantz, isso foi uma conquista pessoal. "Evitamos um quarto turno eleitoral", escreveu ele no Twitter. "Vamos salvar a democracia em Israel. Vamos combater o coronavírus e cuidar de todos os cidadãos".
Mas é muito cedo para comemorar. Uma vez removidos os principais obstáculos, ambos precisarão de superar uma série de desafios para que o governo funcione, o primeiro dos quais é a divisão dos cargos ministeriais.
Agradar a aliados
O governo de unidade deverá ter mais de 30 ministros e isso significa que o Likud de Netanyahu, que até agora controlava a maioria dos cargos ministeriais de Israel, precisará de compartilhar não só entre si e seus aliados do bloco liderado por Netanyahu, mas também com a coligação Azul e Branca de Gantz, que pelo acordo ocuparia 16 ministérios.
Embora o Likud vá liderar importantes pastas como o Ministério das Relações Exteriores (durante metade do período), educação, transporte e proteção ambiental, outros cargos prestigiados como a defesa, assuntos estratégicos, justiça e integração, ficarão nas mãos de Gantz.
Netanyahu estava ciente da insatisfação que esta situação poderia causar e estava preparado para isso. Determinado a manter sua equipe satisfeita e, o mais importante, intacta, ele convenceu Gantz a deixar o Likud controlar posições diplomáticas chave, assim como importantes comitês do Knesset, o parlamento israelense.
Gantz foi rápido em concordar com a solução. Assim, será um membro do Likud a liderar a missão nas Nações Unidas e será o partido de Netanyahu a assumir a liderança nos comitês financeiro, de integração e de economia do Knesset.
Economia: principal preocupação
Contudo, estes estão longe de ser os únicos desafios do novo governo. Após a divisão de cargos, a coalizão precisará de alcançar resultados em diversas frentes, principalmente na esfera da saúde e da economia.
A pandemia do novo coronavírus, que irrompeu em Israel em final de fevereiro e já ceifou mais de 180 vidas, representa um sério desafio econômico. Logo após o surto do vírus, o Estado judaico anunciou uma série de medidas rigorosas para conter a propagação do SARS-CoV-2.
Estas incluíram não só a adoção de quarentenas, mas também o encerramento de instituições governamentais, bem como cerca de 70% das 500 mil pequenas e médias empresas de Israel.
Como resultado, o desemprego disparou, atingindo 25 por cento em menos de dois meses. Este último número é o mais alto desde a criação do Estado de Israel, em 1948.
Foi por essa razão que Netanyahu, que venceu as últimas eleições mas que não logrou formar governo, pediu a Gantz que deixasse suas diferenças de lado e estabelecesse um governo de unidade nacional para o bem de todos os israelenses.
Agora, uma vez concluído o acordo, a pergunta que se põe é se eles serão capazes de cumpri-lo.
Segurança nacional
Ambos também terão de se mostrar alinhados no problema da segurança nacional. Durante as últimas três campanhas eleitorais, a coligação de Gantz acusou Netanyahu de incapacidade de lidar com o Hamas, grupo islâmico que controla a Faixa de Gaza, prometendo melhorar a segurança de Israel e restaurar sua capacidade de dissuasão.
Agora, com o Hamas preocupado com seus próprios desafios do novo coronavírus, a situação em Gaza tem sido excepcionalmente tranquila, mas especialistas israelenses já advertiram que não vai durar muito tempo, sobretudo se a situação em Gaza ficar fora de controle e Tel Aviv não fornecer ao enclave a assistência médica necessária.
Gantz, indigitado como ministro da Defesa, precisará de lidar com esta questão que desafia Israel desde 2001 e também terá que lidar com uma possível troca de prisioneiros com o Hamas, que supostamente manteria detidos dois cidadãos de Israel, bem como os corpos de dois soldados israelenses mortos em 2014.
Contudo, malgrado as múltiplas rodadas de negociações, o envolvimento de mediadores egípcios e a pressão internacional, o processo não avançou sequer um centímetro, em parte devido ao impasse político em Israel. Agora, com um governo de unidade em funções, a opinião pública israelense colocará a resolução deste problema no topo de sua agenda.
'Acordo do Século'
Outro ponto a dominar a agenda será o plano de paz "Acordo do Século" do presidente dos EUA, Donald Trump. Lançado no final de janeiro, a iniciativa previa grandes trocas de terras e a extensão da soberania de Israel sobre o Vale do Jordão, que constitui cerca de 30% da Cisjordânia, passo esse que enfureceu os palestinos e que pode levar a uma série de repercussões econômicas terríveis, incluindo sanções internacionais e boicote aos produtos israelenses.
Seja como for, a dupla agora coligada está determinada a seguir em frente com o plano, cujo início está previsto para 1º de julho, não só porque foi uma promessa eleitoral de ambos, mas também porque, se não o fizerem, isso poderia afetar as relações com os EUA.
Para além dessas razões, a prevista extensão da soberania, reconhecendo os colonatos como parte do Estado judaico e construindo dessa forma pontes entre os círculos de esquerda e de direita de Israel, convém a ambos líderes políticos.