Embora o Brasil, na avaliação de vários cientistas, ainda não tenha atingido o pico do número de casos da COVID-19, empresários de todo o país, estimulados por posicionamentos do presidente Jair Bolsonaro, pressionam autoridades estaduais e municipais pela reabertura das atividades econômicas.
Ao contrário de outros países, no Brasil, por se tratar de uma república federativa, fica a cargo de governadores e prefeitos a decisão de impor, flexibilizar ou suspender as medidas restritivas sugeridas por especialistas para conter o avanço do novo coronavírus.
Tais medidas, consideradas essenciais pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para enfrentar a pandemia, têm sido alvo de inúmeras críticas por parte de Bolsonaro e seus apoiadores. Eles alegam que, apesar de seu interesse sanitário, as mesmas podem causar sérios impactos à economia do país, que já não vinha bem antes da atual crise e, de acordo com os prognósticos, tem tudo para ser uma das mais afetadas.
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Nos últimos dias, entidades civis e advogados apresentaram queixas à Justiça em Minas Gerais questionando a decisão de várias prefeituras de flexibilizar o isolamento e reabrir o comércio, em um momento no qual o estado, assim como todas as outras unidades da federação, apresenta tendência de piora nos casos de contaminação e mortes provocadas pela COVID-19.
O impasse mineiro é um exemplo da falta de coordenação que vem se instalando no país nos últimos meses em diferentes níveis de governo, o que, segundo alguns analistas, além de poder agravar a situação sanitária, poderia também aprofundar os impactos econômicos da crise.
Essa ausência de coordenação fica ainda mais evidente no nível federal, onde, em vez de buscarem um consenso sobre as ações a serem tomadas, como tomá-las e até quando, o presidente entra em constante choque com governadores, gerando instabilidade para empresários, investidores e população como um todo.
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"Em um momento de crise tão grave como a que enfrentamos, que não é só uma crise sanitária, é uma crise econômica, de agravamento das questões de distribuição de renda e crises políticas, as diretivas têm que ser claras e as coordenações e ações são imprescindíveis", afirma em entrevista à Sputnik Brasil Maria Beatriz de Albuquerque David, professora da Faculdade de Economia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Todos os países, segundo a economista, estão fazendo "políticas de saúde, socioeconômicas e políticas fiscais ativas para enfrentar a crise", enquanto o Brasil "é o grande ponto fora da curva", que, além de não ter um grande plano nacional, ainda se vê afetado por uma crise política que "se agrava a cada dia".
"A exemplo de outras repúblicas federativas, como Alemanha e Estados Unidos, [o Brasil] tem suas responsabilidades divididas entre cada ente federativo. Mas cabe ao governo federal implementar principalmente as políticas macroeconômicas. Mesmo ações tomadas pelo Congresso Nacional no Brasil para enfrentar a crise são, muitas vezes, obstaculizadas pelo poder executivo."
Albuquerque destaca que, por conta do esfriamento das atividades econômicas em todo o mundo devido ao coronavírus, a maioria das economias terá quedas, provavelmente, superiores a 5% e, com o Brasil, não deve ser diferente. E essa falta de coordenação associada à crise política gera riscos e inseguranças adicionais ao país, como demonstrado pela grande fuga de capitais.
A previsão, de acordo com a especialista, é a de que, se quase tudo permanecer como está, mas houver mais agravamento sanitário e político, o dólar poderá chegar a R$ 8, aprofundando, ao mesmo tempo, as desigualdades sociais no país.
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"Pensar em uma retomada econômica agora ainda é muito cedo. Então, as perspectivas não são boas e tem que se passar muito mais a uma questão de diálogo do que à questão do enfrentamento, como se vem fazendo entre os diversos entes federativos. E cabe aí, ao governo central, sem dúvida, uma posição de liderança, o que não está acontecendo", afirma a economista, acrescentando que essa retomada da economia pode levar ainda mais tempo do que o necessário se o governo não se esforçar para cessar a instabilidade política.