A pesquisa, publicada na revista Science, também abre as portas para empresas internacionais e polícias brasileiras identificarem fazendas que violam regras contra o desmatamento na Amazônia, como explicou o coautor do estudo, Raoni Rajao, especialista em gestão ambiental na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
"O Brasil tem os meios para desenvolver um grande sistema de monitoramento liderado pelo governo, capaz de limpar as cadeias de suprimentos do desmatamento", afirmou Rajao à Reuters. "Antes os meios técnicos não existiam, agora desenvolvemos esses meios".
Pesquisas anteriores haviam rastreado as vendas apenas para os municípios onde ocorreu o desmatamento ilegal. Mais monitoramento é especialmente importante, diz o estudo, uma vez que o país procura alimentar o mundo.
O Brasil, que agora produz um volume semelhante de soja aos Estados Unidos, está prestes a se tornar o maior exportador mundial de soja até 2029, de acordo com um relatório divulgado quinta-feira (16) pela OCDE e pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação.
Em seu estudo, Rajao e outros pesquisadores analisaram o desmatamento na Amazônia brasileira e na savana do Cerrado desde 2008, data de corte para a atual lei florestal, antes da qual os agricultores que atendiam a certas condições recebiam anistia para o corte anterior de árvores.
A equipe da pesquisa também descobriu que 17% das exportações brasileiras de carne bovina para a UE estão ligadas ao desmatamento. No entanto, existem apenas algumas "maçãs podres" nas cadeias de fornecimento de soja e carne bovina, com apenas 2% das fazendas causando 62% do desmatamento ilegal na área coberta.
O estudo não nomeou as empresas ou fazendas envolvidas no desmatamento.
A pesquisa considerou apenas as exportações brasileiras para a UE, que captaram 16% das exportações brasileiras de soja e farelo de soja em 2019. Rajao disse que os pesquisadores se concentraram na UE em parte porque um recente acordo comercial da UE com o Mercosul, uma vez ratificado, aumentaria o comércio agrícola bidirecional.
Rajao explicou que pesquisas futuras podem examinar as exportações para a China, que é o maior comprador de soja e carne bovina do Brasil, responsável por 64% das vendas de soja e farelo.
"Essa descoberta ocorre em um momento crítico em que o governo brasileiro está sendo pressionado a reverter sua posição notoriamente anti-ambiental que está alimentando o desmatamento na Amazônia", destacou à Reuters Philip Fearnside, ecologista do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, não envolvido na nova pesquisa.
Números recordes de destruição na era Bolsonaro
O desmatamento aumentou na Amazônia brasileira desde que o presidente Jair Bolsonaro assumiu o cargo em 2019 e enfraqueceu a fiscalização ambiental, ao exigir mais agricultura comercial e mineração em áreas florestais.
O desmatamento na Amazônia atingiu uma alta de 11 anos em 2019, destruindo uma área do tamanho do Líbano, de acordo com dados do governo. O desmatamento aumentou 25% nos primeiros seis meses de 2020, em comparação com um ano atrás, mostram dados preliminares.
A pesquisa também pode levar a um exame mais minucioso das empresas e indústrias que compram importações contaminadas pelo desmatamento, destacou Neus Escobar, engenheiro agrícola da Universidade de Bonn, na Alemanha, que não participou do estudo.
"Eles dão uma boa contribuição adicionando essa camada adicional de transparência", disse Escobar à Reuters.
Escobar foi coautor de outro estudo publicado em maio, sugerindo que as exportações brasileiras de soja para a UE eram mais propensas do que as remessas para a China a serem ligadas ao desmatamento. Isso ocorre em parte porque o desmatamento é mais intenso no norte do Brasil, mais próximo da Europa.