O presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta terça-feira, 8, que o governo estuda medidas, por meio dos Ministérios da Economia e da Agricultura, para dar uma resposta à disparada nos preços de alimentos nos mercados, mas descartou qualquer tipo de tabelamento e reiterou que tem feito um apelo aos empresários do setor para que diminuam a margem de lucro.
Os representantes das redes de supermercados, por sua vez, atribuem o fenômeno à alta do dólar e à sazonalidade.
"A alta no preço desses produtos se deve a alguns fatores, como o aumento das exportações destes itens e sua matéria-prima e a diminuição das importações dessas mercadorias, motivadas pela mudança na taxa de câmbio que provocou a valorização do dólar frente ao real. A sazonalidade também tem impacto direto no valor dos produtos. Somando-se a isso também tem a política fiscal de incentivo às exportações, e o crescimento da demanda interna impulsionado pelo auxílio emergencial do governo federal", informou em nota à Sputnik Brasil a Associação de Supermercados do Estado do Rio de Janeiro (ASSERJ).
A economista Juliana Inhasz, coordenadora do Curso de Graduação em Economia do Insper, concorda com essa avaliação. Segundo ela, o aumento da demanda, em parte provocada pelo auxílio emergencial do governo, pressiona os preços para cima. Além disso, o aumento da taxa de câmbio "cria uma concorrência muito grande, do ponto de vista do produtor, entre o mercado doméstico e o mercado externo".
Para o produtor, quando os preços no mercado externo são altos, o que acontece com o real desvalorizado, é mais vantajoso exportar, do que buscar o mercado interno.
"Quando faz isso, vende e ganha mais lá fora, ele naturalmente diminui a oferta de produtos dentro da economia brasileira. Essa redução da oferta de produtos dentro da economia brasileira causa uma redução dessa disponibilidade para o consumidor local, e os preços sobem mais ainda", explicou a especialista à Sputnik Brasil.
Para ela, as recentes variações no preço do arroz e do óleo e derivados de soja seriam bons exemplos dessa dinâmica. Por serem base da alimentação, sofrem grande pressão da demanda e são objeto de competição entre o mercado interno e externo.
"A responsabilidade dos supermercados dentro dessa alta de preços é relativamente limitada [...] estão vendo o aumento da demanda, que naturalmente pressiona os preços, junto com o aumento do custo com qual eles recebem as mercadorias. Os supermercados são a peça que está no meio da negociação entre produtores e consumidores. Então é óbvio, se a demanda aumenta, o supermercado percebe que tem mais gente para comprar o produto. Ele vai sim, entender que é um momento de colocar o preço um pouco para cima, mas ele também já tem recebido a mercadoria mais cara. Então quando o presidente apela aos empresários do setor para que pensem na população e diminuam a margem de lucro, o presidente também mostra uma certa dificuldade de perceber que o empresário também sofreu na pandemia [...] e enxerga esse momento como oportunidade de colocar suas contas em dia", disse a entrevistada.
Para ela, o governo deveria promover estímulos econômicos e não colocar a pressão sobre um ou outro determinado setor. A economista reconheceu a existência de eventuais abusos por parte dos produtores e supermercados, e destacou que a população não deve pagar o preço. No entanto, em sua avaliação, os abusos são pontuais. A demanda, por outro lado, deve continuar alto nos próximos meses e o câmbio não deve mudar pelo menos até o final do ano.
"Se o governo gostaria de um resultado diferente, ele também precisa agir de maneira diferente. Enquanto o governo age da mesma forma, não adianta querer passar sinais de que o setor produtivo e que o varejo façam de uma maneira diferente. Não dá para computar sempre ao outro a responsabilidade desse momento, sendo que nós compartilhamos a responsabilidade", acrescentou a interlocutora da Sputnik Brasil.
Segundo Inhasz, o governo poderia adotar medidas como subsídios de curto prazo ao setor, ou oferecer estímulo aos produtores para optar pelo mercado brasileiro. Além disso, o caminho do investimento em produção certamente seria positivo para atuar sobre a demanda.
"O que não dá para gente é acreditar que um simples apelo do presidente vai fazer com que a situação seja resolvida", concluiu a economista.